sexta-feira, 9 de julho de 2010

"A fita branca", Michael Haneke (2009)

Mestre do cinema que explora o lado mais obscuro da alma humana, Michael Haneke em "A fita branca" (2009), quer pesquisar "as raízes do mal", conforme declarou em uma entrevista sobre o filme.
Acostumado a ser o centro de escândalos a cada obra sua, Haneke, que estudou filosofia e psicologia em Viena, mas adora o cinema e sempre quis ser diretor, diz: "As pessoas não gostam de encarar a realidade." E acrescenta que o seu cinema existe em função do cinema que temos hoje em dia. Em sua opinião, um cinema que "doura a pilula" para vender e fazer dinheiro.
Nascido em Munique na Baviera, esse alemão de 67 anos alcançou sucesso internacional com "A professora de piano" (2001). Nesse filme, Isabelle Huppert protagonizava cenas de sado-masoquismo, para o horror de alguns.
Com "Caché" (2005), Haneke ganhou o prêmio de melhor diretor em Cannes. E agora, muitos prêmios depois, em 2009, "A fita branca" levou a Palma de Ouro como o melhor filme do prestigiado festival francês.
Rodado em magnífico preto e branco, quadros suntuosos da natureza do norte da Alemanha revezam-se com cenas em matizes de cinza, envolvendo as várias famílias que vão protagonizar pequenos e grandes dramas.
Estamos em 1913 quando o professor da aldeia começa a contar, retrospectivamente, com a voz de um velho, aquilo que presenciou entre as crianças e os adultos do lugar, até o eclodir da Primeira Guerra Mundial.
Atos maldosos atingem o médico da aldeia, uma camponesa, o filho do barão e o menino retardado. Mas quem praticou essas crueldades? Ninguém viu, ninguém sabe...
O que vemos, quando se aprofunda o que acontece entre as pessoas, é a dura brutalidade que reina nas relações entre adultos e crianças, homens e mulheres da aldeia.
"Não agüento tanta inveja, mentiras e vinganças", desabafa a baronesa, uma das raras mulheres da aldeia que ousa pensar e sentir.
No centro de tudo isso parece existir uma ambigüidade fatal entre o que se ensina às crianças e como agem os adultos. Como educar para o bem e a moral quando o educador não pratica aquilo que prega?
Haneke diz sobre o filme: "Crianças são doutrinadas e se tornam juízes dos outros. Justamente daqueles que empurram sua ideologia 'goela a baixo' dessas crianças."
Inocentes se tornam assassinos.
Castigos injustos e desmedidos levam os torturados a se tornarem piores que os torturadores. A severidade desproporcional aos atos cometidos leva a vinganças perversas.
O diretor do filme, que diz não ser um educador mas um cineasta, adverte para o perigo das ideologias extremistas, tanto de direita quanto de esquerda. Sem esquecer dos fanatismos religiosos. Diz: "Por causa de uma idéia que lhe parece bela, você se torna um assassino."
"A fita branca", emblema de uma pureza inatingível, adorna o braço de um menino louro, de olhos azuis que, vinte anos depois, marchará à sombra das suásticas.
Mas Haneke adverte que seu filme não é só uma condenação ao nazismo.
As raízes do mal encontram-se fatalmente na natureza humana. E, por isso, "A fita branca" é uma advertência: alimentada no coração das crianças, a barbárie pode começar a destruição em todo e qualquer lugar desse mundo a qualquer momento.

4 comentários:

  1. "A fita branca" foi postado originariamente em 3 de novembro de 2009, às 14:00, no MPost.

    Recebeu os seguintes comentários:

    Sylvia Manzano, em 7 de março de 2010, às 22:00
    "E, por isso, ’A fita branca’’é uma advertência: alimentada no coração das crianças, a barbárie pode começar a destruição em todo e qualquer lugar desse mundo a qualquer momento."
    Lendo o que diz a Eleonora eu fico com medo, pois essa advertência tem sido ignorada atualmente, pelo que posso notar.
    A quantidade de pais e mães que vejo batendo em crianças ou ameaçando de bater é assustadora.
    A quantidade de pais e mães que dizem que apanhou, não ficou com nenhum trauma e bate nos filhos é mais assustadora ainda.
    A simples imagem de um adulto com seu tamanho e peso, batendo numa criança, com seu tamanho e peso, revela uma covardia enorme.
    É covarde o adulto que bate na criança e muitos batem, se não batem, ameaçam e o efeito devastador é o mesmo.
    Eu acreditava que isso deixaria de existir com o passar do tempo, com um novo século entrando, mas isso aumenta cada vez mais.
    A entrada de um novo século, sempre me faz lembrar do século passado, de tudo que aconteceu e foi culminar no nazismo.
    Embora tenhamos Lula no Brasil, outros bons presidentes na América Latina e Obama eleito nos Estados Unidos, o que é de ótimo augúrio, a truculência com que a criança é tratada atualmente, assusta, dá medo.
    João Pereira Coutinho escreveu hoje na FOHA sobre o filme e diz o seguinte:
    "Entre 1933 e 1945, o caminho trilhado pela Alemanha não estava inscrito nos pais dessa Alemanha. Estava inscrito na forma como a natureza humana se acomoda à "banalidade do mal": como segue ordens sem as questionar; como abdica da sua consciência última; como acredita na criação de um estado de perfeição rácico que implica, e justifica, e desculpa, todas as atrocidades.
    Na sua pedagogia vulgar, "A Fita Branca" reduz o nazismo a um problema de autoestima. Não conheço maior insulto: à inteligência dos presentes e à memória dos ausentes."
    Concordo quando diz que a natureza humana se acomoda à banalidade do mal, segue as ordens sem as questinar e abdica de sua consciência última, mas fico pensando: isso tudo não tem uma gênese?
    As crianças nascem apenas bebês ou já existe uma índole má, como ouço tanta gente dizendo?
    E o papel da educação?
    E a responsabilidade dos adultos com os filhos que colocam no mundo?
    E me pergunto para finalizar: aonde nos levará esse individualismo que vemos aumentar a cada dia atualmente?
    Aonde nos levará esse descaso que os adultos têm com as crianças roubando a infância delas inclusive, já que hoje, brincar até os 6 anos de idade não é mais aceito por ninguém?
    O que me resta é sonhar com um neo movimento hippie, com um renascimento, enfim, com o fim desses tempos tão banalizados que vivemos.


    Paulo Octavio Pereira de Almeida, em 24 de fevereiro de 2010 às 22:57
    Eu adorei este filme...dificil...lento....falado em alemão...preto & branco...sem trilha sonora...mas o diretor com seu estilo minimalista dá uma porrada na platéia com uma história da possível "gênese" do nazismo...uma versão pessoal e "rural" de um dos maiores maus que a humanidade já foi capaz de produzir. Hollywood sempre mais próxima do lado mais "entertainmet" das Guerras ( quantos filmes já foram produzidos sobre este assunto? ) não será capaz de premiar esta obra com o OSCAR...bom mas para quem já levou a Palma em Cannes, no big deal , right ?

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  2. "A fita branca" foi postado originariamente em 3 de novembro de 2009, às 14:00, no MPost e recebeu dois comentários.

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  3. Sylvia Manzano, em 7 de março de 2010, às 22:00

    "E, por isso, ’A fita branca’’é uma advertência: alimentada no coração das crianças, a barbárie pode começar a destruição em todo e qualquer lugar desse mundo a qualquer momento."
    Lendo o que diz a Eleonora eu fico com medo, pois essa advertência tem sido ignorada atualmente, pelo que posso notar.
    A quantidade de pais e mães que vejo batendo em crianças ou ameaçando de bater é assustadora.
    A quantidade de pais e mães que dizem que apanhou, não ficou com nenhum trauma e bate nos filhos é mais assustadora ainda.
    A simples imagem de um adulto com seu tamanho e peso, batendo numa criança, com seu tamanho e peso, revela uma covardia enorme.
    É covarde o adulto que bate na criança e muitos batem, se não batem, ameaçam e o efeito devastador é o mesmo.
    Eu acreditava que isso deixaria de existir com o passar do tempo, com um novo século entrando, mas isso aumenta cada vez mais.
    A entrada de um novo século, sempre me faz lembrar do século passado, de tudo que aconteceu e foi culminar no nazismo.
    Embora tenhamos Lula no Brasil, outros bons presidentes na América Latina e Obama eleito nos Estados Unidos, o que é de ótimo augúrio, a truculência com que a criança é tratada atualmente, assusta, dá medo.

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  4. Paulo Octavio Pereira de Almeida, em 24 de fevereiro de 2010 às 22:57

    Eu adorei este filme...dificil...lento....falado em alemão...preto & branco...sem trilha sonora...mas o diretor com seu estilo minimalista dá uma porrada na platéia com uma história da possível "gênese" do nazismo...uma versão pessoal e "rural" de um dos maiores maus que a humanidade já foi capaz de produzir. Hollywood sempre mais próxima do lado mais "entertainmet" das Guerras ( quantos filmes já foram produzidos sobre este assunto? ) não será capaz de premiar esta obra com o OSCAR...bom mas para quem já levou a Palma em Cannes, no big deal , right?

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