segunda-feira, 28 de novembro de 2016

A Chegada


“A Chegada”- “The Arrival”, Estados Unidos 2016
Direção: Denis Villeneuve

“- Eu pensava que esse era o começo da história...”
Essa frase misteriosa é dita por Amy Adams com um bebê no colo. Vemos cenas dela com uma menina que cresce.
“- Eu me lembro de momentos no meio...”
A menina torna-se uma adolescente e há uma conversa com um médico.
“- E este foi o fim. Volta para mim...”, diz a mãe que chora, vendo a filha morta no leito do hospital.
Intrigados com esse prólogo, quase que esquecemos o começo do filme que parece não ter nada a ver com o que se segue.
E vemos uma professora, com ar distante, entrar numa sala de aula, sem perceber que há poucos alunos que parecem assustados. Algo está acontecendo. Na lousa aparecem imagens de TV anunciando que 12 objetos não-identificados estão em 12 regiões diferentes do planeta. São alienígenas.
Mas o que vieram fazer aqui na Terra?
Congestionamentos enormes. População em pânico.
Mas a Dra Louise Banks ( Amy Adams) não parece assustada mas deprimida. Ela é professora de linguística, famosa autora e perita em traduções. Logo entra em seu escritório um coronel do exército (Forest Whitaker) pedindo sua ajuda. Põe um gravador sobre a mesa e faz ela escutar uma tentativa secreta de comunicação com os alienígenas. A gravação tem ruídos que parecem sons de baleias.
“- Desculpe mas não posso fazer isso assim... Eu teria que estar com eles.”
E, em plena noite, ela é acordada e levada num helicóptero, com outras pessoas, para Montana, o lugar onde está uma das naves.
Faz parte da equipe o matemático Dr Ian Connelly (Jeremy Renner) que diz conhecer o trabalho de Louise e admirá-la. Formarão uma dupla.
Nas tendas armadas pelo exército eles ficam sabendo que vão entrar em contato com os extra-terrestres.
A fantástica nave é uma figura oblonga, muito alta, como um ovo alongado. Flutua a alguns metros do solo. A cada 18 horas, um orifício se abre e a equipe poderá ser içada por um elevador e entrar na nave.
E aí começa uma aventura de descoberta e auto-descoberta que Louise vai experimentar. Ela precisa decifrar a comunicação dos alienígenas para entender o que querem e não há nada que faça sentido, até ela começar a ter visões de cenas com uma criança, sua filha.
O quebra-cabeça é tanto no espaço interior de Louise quanto no espaço exterior onde estão as naves.
Denis Villeneuve adaptou para o seu filme um conto de Ted Chiang, “The Story of Your Life”, que faz uma reflexão sobre a memória, o tempo e o luto. E o roteiro de Eric Heisserer é uma fábula sobre a comunicação com o desconhecido como uma alternativa ao medo e reflete sobre o destino e o amor.
Amy Adams está extraordinária no papel dessa mulher jovem e inteligente que, destemida, vai ao encontro de emoções transbordantes. Merece muitos prêmios.
Numa visão pessoal, que fez sentido para mim, baseei minha hipótese em duas frases de Louise, que ela fala em dois momentos, depois de entrar em contato com os seres, na volta à tenda do exército:
“- Penso que tudo que vemos lá dentro refere-se a nós dois”, diz para o Dr Ian. E mais:
“- Agora eu compreendo porque meu marido me deixou...”, que ela fala para si mesma.
E as cenas que a levam a intuir a comunicação com os alienígenas, que só se dirigem a ela, são sempre com a filha criança.
Pensando nisso, acho que tudo é um sonho de Louise. Uma elaboração de seu luto, numa viagem por seus espaços interiores, na qual enfrenta seus fantasmas, o sofrimento e a crise existencial que ela está vivendo pelas perdas que sofreu.
Mas deixo ao espectador a oportunidade de ver e entender esse belo filme a seu modo. Vai valer a pena.






É Apenas o Fim do Mundo


“É Apenas o Fim do Mundo”- “Juste la Fin du Monde”, Canadá, França, 2016
Direção: Xavier Dolan

“Em algum lugar, já há algum tempo” é a frase que abre o sexto filme de Xavier Dolan, 27 anos, menino prodígio canadense. Parece aludir a algo que amadureceu nele, ao longo de seu curto e fascinante trajeto nas telas do cinema.
Aqui ele usa palavras de um outro talento precoce, adaptando a peça do escritor, diretor e ator teatral francês, Jean-Luc Lagarce, que aos 21 anos já tinha sua própria companhia de teatro e que escreveu 25 peças até sua morte em 1995, em consequência da AIDS. É o autor teatral contemporâneo mais representado atualmente na França.
No filme, Louis (Gaspard Ulliel) de 34 anos, é um bem sucedido escritor gay, que viaja num avião e o vemos tristonho. As mãos de uma criança que viaja atrás dele, cutucam e brincam de tapar seus olhos, com isso conseguindo um sorriso.
Mas compreendemos seu rosto ensombrecido pois ele mesmo diz em “off” que não vê a família há 12 anos e que agora volta para casa para contar que vai morrer. Adivinhamos nele uma esperança de consolo, de abrigo mas também medo, já que sabe das razões que o afastaram da família.
No taxi, ele observa pessoas pela janela. Desconhecidos. Logo ele vai ter que enfrentar os que conhece.
Entra na casa e lá está sua família: a mãe Martine (Natalie Baye, ótima), exagerada, unhas azuis, super “makeup”e “tailleur”de rosas vermelhas; Suzanne (Léa Seydoux), a irmã mais nova que ele mal viu crescer; Vincent Cassel que é Antoine, o irmão mais velho, bruto, complexado, invejoso e Catherine (Marion Cotillard, num papel difícil, excelente), a cunhada que Louis não conhece.
A recepção ao filho que volta à casa é de início calorosa e barulhenta. E depois, continua menos calorosa e mais briguenta. Louis é ora espectador, ora participante de poucas palavras. A câmara faz closes dos vários rostos e cada qual passa para a plateia o dito que esconde o não dito.
E como contar o que havia para contar?
O rosto grave de Louis parece transparecer a trágica notícia mas ninguém quer ouvir nada. Os closes mostram cada um com seus motivos. Querem falar, preencher o vazio evidente entre eles e Louis.
E, fazendo seu número teatral particular, tornar claro que estão bravos, que foram rejeitados, que ele os abandonou e não partilhou seu sucesso e que eles não o querem ali, 12 anos depois, tendo dele somente cartões postais impessoais, abertos, lidos pelos carteiros, guardados numa caixa debaixo da cama de Suzanne, a tatuadora rebelde da família.
Ninguém quer ouvir o que Louis tem a dizer. Com exceção talvez da cunhada tímida, confusa e balbuciante, com um rosto onde os olhos falam, revelando solidariedade. Mas ela não é da família.
E bem que a mãe tenta ser carinhosa e aproximar o filho dos irmãos...Mas o faz sem esperança de conseguir.
“É Apenas o Fim do Mundo” ganhou o Prêmio do Júri no Festival de Cannes 2016 e o prêmio do Júri Ecumênico.

Xavier Dolan, não é à toa o menino prodígio do cinema contemporâneo. Merece toda a admiração e os prêmios que já ganhou e que certamente vai ganhar ainda no futuro. 

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Pequeno Segredo


“Pequeno Segredo”- Brasil, Nova Zelândia  2016
Direção: David Schurmann

É difícil falar sobre um filme que foi tão discutido e que tanto dividiu opiniões. Eu vi o trailer antes da indicação para representar o Brasil no Oscar 2017 e a primeira impressão foi a que ficou.
“Pequeno Segredo” tem lindas imagens do mar, do rio Amazonas e belos pores do sol (fotografia do peruano Inti Brionis). Noites estreladas e o encanto de uma menina loura, dançando como a  borboleta que voa sobre o mar na primeira cena.
O clima é de um conto de fadas. A relação mãe e filha (Julia Lemmertz e Mariana Goulart) coloca as duas em estado de graça. As vozes são suaves e os rostos expressivos das atrizes inspiram amor e devoção. Só existem elas no mundo.
E isso, de tal maneira, que o resto dos personagens são secundários. O pai (Marcello Antony) é figura apagada. Os pais verdadeiros de Kat, a talentosa Maria Flor e o opaco Errol Shand, filho da bruxa neozelandesa, a avó Barbara (Fionnulla Flanagan,  a única que consegue se sobressair), mais os irmãos adotivos, são pessoas que entram e saem, sem qualquer composição mais aprofundada.
E o que é o foco central da história, a vida e a morte precoce da irmã adotiva, contada pelo diretor David Schurmann, 42 anos, está impregnado de idealização.
Aos menos ingênuos ressalta a vontade de emocionar, de usar a música para que a plateia chegue às lágrimas e até mesmo a escolha dos atores com o objetivo de enfeitar a cena com rostos e palavras de ternura. Tudo em exagero.
E não precisava nada disso porque a história de Kat é suficientemente triste e comovente para as pessoas se emocionarem com naturalidade, sem precisar ser empurradas por clichês melosos.
Não li o livro do mesmo nome do filme, escrito por Heloisa, a mãe adotiva de Kat, mas dizem que é “devastador”. O que aconteceu então? Algo ocorreu na adaptação para o roteiro, escrito principalmente por Marcos Bernstein (“Central do Brasil”) e pelo diretor, que diz que quis honrar a mãe e seu gesto de adotar a menina, com o filme “Pequeno Segredo”.
Mas se o filme ganhar o Oscar porque combina com “a cabeça dos velhinhos da Academia”, como disseram alguns para justificar a escolha pela comissão do Ministério da Cultura, será um insulto tanto para os votantes do Oscar quanto para David Schurmann, que teria feito um filme para agradar pessoas conservadoras.
E além de tudo, essa justificativa não passa de um grande equívoco porque, se pensarmos no último filme premiado como melhor estrangeiro, o húngaro “Filho de Saul”, ele é um dos mais cruéis retratos da natureza humana. Nada a ver com “velhinhos conservadores”.
É uma pena porque parece que, mais uma vez, o Brasil fica fora do Oscar. Mas não custa esperar pela primeira lista dos nove escolhidos que sai no começo de janeiro...



segunda-feira, 21 de novembro de 2016

As Confissões


“As Confissões”- “Le Confessioni”, Itália, 2015
Direção: Roberto Andò
Uma porta de vidro se abre e um cortejo de mulheres de véu, muçulmanas, aparece. Atrás delas, um monge de hábito claro e cabelos brancos. Estamos num aeroporto.
O monge chama nossa atenção. O que faz ele na lojinha? Compra um gravador.
Na saída, observa crianças que se distraem com um espetáculo de um mágico na calçada: levitação. Velhos truques que sempre funcionam.
Intrigante, o filme do siciliano Roberto Andò segue o carro que leva o monge. A câmara faz isso do alto. E esse ângulo será usado algumas vezes. Ora aludindo, talvez, à nossa pequenez, ora como que tentando um mergulho na cabeça de alguém, para descobrir seus pensamentos.
Um hotel magnífico, à beira mar, é o local onde vai ocorrer a reunião de representantes do G-8 com o presidente do FMI. Uma séria e contundente decisão deverá ser tomada e tudo indica que prejudicará os países mais pobres.
Ficamos sabendo disso através da famosa escritora de livros infantís, Claire (Connie Nielsen), que se apresenta ao monge Roberto Salus (Toni Servillo, excelente), que também é escritor. A eles se junta um músico de rock, meio esquecido. São convidados pessoais do próprio presidente do FMI. Dão a nota de humanidade à reunião daquelas pessoas frias.
E um acontecimento trágico vai mudar o rumo dos acontecimentos e colocar o monge em perigo. Pode ser que ele tenha ouvido, em confissão, segredos que, descobertos, colocariam o plano econômico em risco.
“As Confissões” é como se fosse um “Big Short - A Grande Aposta” metafísico. Faz também uma crítica ao sistema financeiro que se apoia em decisões tomadas sempre para o favorecimento do próprio sistema, sem nenhuma compaixão ou solidariedade com os que sofrem com essas decisões.
E pior ainda, mostra como esses representantes de países ricos, usam da crise, como a do desemprego, para tomar medidas severas, impostas ao povo como única saída para problemas criados pelo próprio sistema.
Mas é filosófico no sentido de lidar com uma crise de angústia do presidente do FMI (Daniel Auteil), que convida o monge porque sente a necessidade de ser escutado em confissão, na noite que precede à tomada da decisão que afetará um enorme número de pessoas.
Lambert Wilson aparece numa ponta e parece que ele tem a ver com a vida afetiva do presidente do FMI, homem frio e sereno mas que entra em crise existencial e solta seus demônios, trancafiados em seu peito não sabemos há quanto tempo.
“As Confissões” é um filme interessante, com cenários palacianos e atores bem escolhidos. A música de Nicola Piovani é forte e marcante.
Mas é Toni Servillo que é o centro das atenções. Grande ator, tem nos presenteado com interpretações inesquecíveis, com o próprio Andò que o dirigiu como os irmãos gêmeos em “Viva a Liberdade” de 2013 e com Paolo Sorrentino e dois filmes magníficos, “As Consequências do Amor”de 2004 e “A Grande Beleza”de 2013.

Vale vê-lo em “As Confissões”, como o monge que faz lembrar o Papa Francisco, que não esconde sua humanidade.


domingo, 13 de novembro de 2016

Elle


Elle”- Idem, França, Alemanha, 2016
Direção: Paul Verhoeven

A realidade não pode ser objetiva. É sempre subjetiva. Depende de tudo que somos nós. Mas, normalmente, sabemos o que é real e o que é imaginário.
Porém, em algumas pessoas, a fantasia extrapola a mente e se espalha pelos sentidos, fabricando alucinações.
Assim pensando, talvez possamos entender melhor a personagem da atriz extraordinária e sempre nova que é Isabelle Huppert em “Elle”, o novo filme do diretor holandês de 77 anos, Paul Verhoeven do famoso “Instinto Selvagem” de 1992.
Michèlle Leblanc é a personagem que vive sua história na tela. Presente e passado. E com ela, o que foi, será sempre o mesmo ou, pelo menos, o velho disfarçado de novo, fonte obsessiva de dor e prazer. Porque é lá, em seu passado que Michèlle ainda está e, por isso, quase todos os seus atos tem a ver com aquele pai que ela odeia. E ódio é sempre amor pelo avesso.
Aparentemente fria e sabendo o que quer da vida, ela comanda uma empresa que cria jogos, videogames violentos. Sua sócia Anna (Anne Consigny) é amiga antiga e o marido Robert (Christian Berkel), também trabalha lá e é mais íntimo de Michèlle do que se pensa.
O ex-marido Richard (Charles Berling) ainda é alvo de ciúmes de Michèlle, controladora e manipuladora. Assim ela é também na empresa que dirige. Temida e cobiçada, ela dirige os empregados, quase todos homens, com mão firme. Logo vão começar a surgir elementos explícitos de violência contra a patroa.
E um mundo cruel, de assassinatos, sangue e terror, está impresso numa foto antiga, que aparece na TV que fala de um assassino famoso. A “Ashgirl”, como a chamam, “Garota das Cinzas”. Ela nos olha em primeiro plano seminua, ensanguentada, na frente de uma fogueira, onde ardem objetos de uma casa. É a pequena Michèlle que também odeia a mãe.
Personalidade dividida, o que Michèlle aparenta ser, é muito diferente do que ela pode ser.
E quando a fantasia se mistura com a realidade, ela se masturba enquanto observa o vizinho atraente (Laurent Lafitte) com binóculos. E já não serão apenas alucinações ou fantasias que darão prazer a Michèlle pois agora há um parceiro real envolvido. Ela quer mais.
A primeira cena do filme, pela atitude do gato que a olha placidamente, é talvez a chave desse jogo que Paul Verhoeven administra na tela. De propósito, o diretor tenta nos envolver na trama de um estupro, que é dominação e prazer, levantando dúvidas no espectador. Gritos ou gemidos?
Michèlle é fruto de tudo que viu e vivenciou, com aquilo que nasceu com ela. E assim somos todos nós. Uns com mais sorte, outros marcados pelo sinal de Caim.
O suspense bem construído e original do holandês Paul Verhoeven é um filme intrigante e exemplar. Quem não tem algo de Michèlle em si mesmo?
Baseado no livro “Oh...”, 2012, de Phillippe Djian, “Elle” é o indicado da França para o Oscar 2017.
Vai dar o que falar.


sábado, 5 de novembro de 2016

A Luz entre Oceanos


“A Luz entre Oceanos”- “The Light between Oceans”, Reino Unido, Nova Zelândia, Estados Unidos, 2016
Direção: Derek Cianfrance
Foi amor à primeira vista. Ele, saído de Primeira Grande Guerra, estava triste e cansado. Vira tantos horrores que queria afastar-se do mundo dos homens. Tom Sherbourne (Michael Fassbender) conseguira o emprego de cuidador do farol da ilha de Janus. Ela, Isabel Graysmark (Alicia Vikander), era jovem, bonita, a única filha que restara aos pais dela, já que seus dois irmãos tinham morrido na mesma guerra que tanto abatera Tom. Mas ela era vivaz, calorosa e na primeira vez que ele a viu, ela estava com um vestido branco, alimentando as gaivotas no pier de onde ele deveria partir para a ilha.
A caminho do farol, um almoço na casa dos pais dela vai mudar completamente os planos de Tom quanto a querer voltar as costa ao mundo. Ela o enfeitiçou. Saíram para um piquenique e ficaram juntos até aquele inesquecível por do sol frente ao qual ela pedira para casar-se com ele, a única maneira de irem juntos para a ilha.
Em Janus, a derradeira inibição de Tom caiu por terra quando ele a tem em seus braços, tímida mas afetiva, seus corpos falando a língua do desejo de ambos. Era amor e paixão.
E quanto foram felizes passeando de mãos dadas pela praia, na colina atrás da casa aconchegante, subindo pela escadaria íngreme do farol onde se avistavam os dois oceanos que banhavam a ilha deles.
“- Janus é o nome do deus de duas faces”, conta ele para Isabel.
“Uma olha para o passado e a outra o ano que começa. Daí o nome Janeiro para o primeiro mês do ano.”
“- Essa face olha para o futuro?”
“- O futuro não existe, Isabel. Existem nossos desejos, aquilo que queremos que aconteça.”
E eles queriam ser felizes. Aquela ilha, seria o paraíso. Um tinha o outro. O amor deles era um projeto concretizado.
E Isabel ficou grávida. Apesar de não haver médico, nem hospital, ou qualquer outra pessoa na ilha, aquilo não os assustou. Mas, numa noite de tempestade aquele sonho morreu. E uma cruz marcou o lugar de um bebê que seria lembrado para sempre.
Triste, deprimida, Isabel parecia outra.Tom a consolava:
“- Quando você tiver cinco filhos correndo ao seu redor, isso vai se tornar um sonho esquecido.”
Mas foi a mesma coisa com o segundo filho. Ela não conseguia levar avante a gravidez. E outra cruz fez companhia à primeira.
Isabel afundou. Calada, deitada no capim seco, ela era a imgem da desolação. Tom, preocupado, não sabia o que fazer.
Foi quando aquele barquinho apareceu, ao sabor das ondas. Havia alguém a bordo. Os dois saem em disparada e encontram um homem morto e um bebê, de poucos meses, chorando.
A transformação foi imediata. Parecia que Isabel conhecia aquela menina da vida toda. Logo, ela estava alimentada, trocada e dormindo em seu colo. Isabel parecia flutuar de tanta felicidade. Lucy foi o presente que veio quando eles já não tinham mais esperanças de felicidade.
Foi difícil convencer Tom a ocultar a bebê e fazê-la passar por filha deles. Mas ele não teve forças para arrancar a felicidade dos braços dela.
E o epílogo mostra a cegueira da justiça frente aos sentimentos intensos que a perda de um filho faz surgir nos pais.
“A Luz entre Oceanos”é um filme belíssimo. Com cenas deslumbrantes da natureza, filmado na Nova Zelândia e Tasmânia, tem a música inspiradíssima de Alexandre Desplat.
O diretor americano Derek Cianfrance soube adaptar o romance bestseller da australiana M.I. Stedman que conta uma historia dramática e surpreendente.
O elenco brilha e a composição dos personagens é perfeita.O Tom de Fassbender mostra-se tão apaixonado pela Isabel de Alicia Vikander e com tanta força, que o personagem obscurece o ator, se não soubéssemos que são casados na vida real. Vikander é doce e amarga, feliz e trágica. Principalmente  profunda. Uma atriz jovem que conseguiu entender a complexidade de Isabel.
O resto do elenco acompanha o casal, destacando-se Rachel Weiz, bela e intensa.

Eu me emocionei até as lágrimas e não fui a única. Vá ver você também esse filme que arrasta nossas emoções ao sabor dos dramas dessa bela história.

A Luz entre Oceanos


“A Luz entre Oceanos”- “The Light between Oceans”, Reino Unido, Nova Zelândia, Estados Unidos, 2016
Direção: Derek Cianfrance
Foi amor à primeira vista. Ele, saído de Primeira Grande Guerra, estava triste e cansado. Vira tantos horrores que queria afastar-se do mundo dos homens. Tom Sherbourne (Michael Fassbender) conseguira o emprego de cuidador do farol da ilha de Janus. Ela, Isabel Graysmark (Alicia Vikander), era jovem, bonita, a única filha que restara aos pais dela, já que seus dois irmãos tinham morrido na mesma guerra que tanto abatera Tom. Mas ela era vivaz, calorosa e na primeira vez que ele a viu, ela estava com um vestido branco, alimentando as gaivotas no pier de onde ele deveria partir para a ilha.
A caminho do farol, um almoço na casa dos pais dela vai mudar completamente os planos de Tom quanto a querer voltar as costa ao mundo. Ela o enfeitiçou. Saíram para um piquenique e ficaram juntos até aquele inesquecível por do sol frente ao qual ela pedira para casar-se com ele, a única maneira de irem juntos para a ilha.
Em Janus, a derradeira inibição de Tom caiu por terra quando ele a tem em seus braços, tímida mas afetiva, seus corpos falando a língua do desejo de ambos. Era amor e paixão.
E quanto foram felizes passeando de mãos dadas pela praia, na colina atrás da casa aconchegante, subindo pela escadaria íngreme do farol onde se avistavam os dois oceanos que banhavam a ilha deles.
“- Janus é o nome do deus de duas faces”, conta ele para Isabel.
“Uma olha para o passado e a outra o ano que começa. Daí o nome Janeiro para o primeiro mês do ano.”
“- Essa face olha para o futuro?”
“- O futuro não existe, Isabel. Existem nossos desejos, aquilo que queremos que aconteça.”
E eles queriam ser felizes. Aquela ilha, seria o paraíso. Um tinha o outro. O amor deles era um projeto concretizado.
E Isabel ficou grávida. Apesar de não haver médico, nem hospital, ou qualquer outra pessoa na ilha, aquilo não os assustou. Mas, numa noite de tempestade aquele sonho morreu. E uma cruz marcou o lugar de um bebê que seria lembrado para sempre.
Triste, deprimida, Isabel parecia outra.Tom a consolava:
“- Quando você tiver cinco filhos correndo ao seu redor, isso vai se tornar um sonho esquecido.”
Mas foi a mesma coisa com o segundo filho. Ela não conseguia levar avante a gravidez. E outra cruz fez companhia à primeira.
Isabel afundou. Calada, deitada no capim seco, ela era a imgem da desolação. Tom, preocupado, não sabia o que fazer.
Foi quando aquele barquinho apareceu, ao sabor das ondas. Havia alguém a bordo. Os dois saem em disparada e encontram um homem morto e um bebê, de poucos meses, chorando.
A transformação foi imediata. Parecia que Isabel conhecia aquela menina da vida toda. Logo, ela estava alimentada, trocada e dormindo em seu colo. Isabel parecia flutuar de tanta felicidade. Lucy foi o presente que veio quando eles já não tinham mais esperanças de felicidade.
Foi difícil convencer Tom a ocultar a bebê e fazê-la passar por filha deles. Mas ele não teve forças para arrancar a felicidade dos braços dela.
E o epílogo mostra a cegueira da justiça frente aos sentimentos intensos que a perda de um filho faz surgir nos pais.
“A Luz entre Oceanos”é um filme belíssimo. Com cenas deslumbrantes da natureza, filmado na Nova Zelândia e Tasmânia, tem a música inspiradíssima de Alexandre Desplat.
O diretor americano Derek Cianfrance soube adaptar o romance bestseller da australiana M.I. Stedman que conta uma historia dramática e surpreendente.
O elenco brilha e a composição dos personagens é perfeita.O Tom de Fassbender mostra-se tão apaixonado pela Isabel de Alicia Vikander e com tanta força, que o personagem obscurece o ator, se não soubéssemos que são casados na vida real. Vikander é doce e amarga, feliz e trágica. Principalmente  profunda. Uma atriz jovem que conseguiu entender a complexidade de Isabel.
O resto do elenco acompanha o casal, destacando-se Rachel Weiz, bela e intensa.

Eu me emocionei até as lágrimas e não fui a única. Vá ver você também esse filme que arrasta nossas emoções ao sabor dos dramas dessa bela história.

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Depois da Tempestade


“Depois da Tempestade”- “After the Storm”, Japão, 2016
Direção: Hirokazu Kore-Eda
Ele é o cineasta dos afetos delicados. Os últimos filmes dele, que vimos por aqui, foram “Pais e Filhos”de 2013, prêmio do Júri em Cannes, “Nossa Irmã Mais Nova”de 2015 e agora, “Depois da Tempestade” que ganhou o prêmio da crítica da 40a Mostra Internacional de Cinema de SP. Todos encantadores, apesar de não pouparem os comentários sobre os defeitos da natureza humana.
Kore-Eda, 54 anos, além de diretor, é também roteirista e montador e seus filmes são quase sempre em torno à família, o microcosmo do mundo humano. E por isso, ele consegue ser universal falando do Japão.
O filme começa com Yoshiko (Kirin Kiki, atriz fabulosa) conversando na pequena cozinha da casa dela com sua filha (Satomi Kobayashi) sobre o tufão que se aproxima:
“- É o 23º desse ano... Muitos para um ano só...”, comenta a senhora. E conta que, antes temia mas agora gosta de tufões, porque antes não se sentia segura na casa que morava, como naquele apartamento. E fala do marido com alguma nostalgia:
“- A senhora parece ter saudades dele...”comenta a filha irritando a mãe.
“- Imagina!” resmunga ela.
“- A mãe precisava arranjar amigos...”sugere a filha.
“- E arranjar mais enterros para ter que ir?”responde a senhora.
Esse é humor que Kore-Eda vai buscar no meio de conversas quotidianas banais entre mãe e filhos. Porque Ryota (Hiroshi Abe) vai aparecer também na casa da mãe, que ainda tem esperanças de que o filho mais velho se torne um grande escritor de sucesso:
“- Dizem que os grandes talentos desabrocham mais tarde”, divaga ela, aguçando os ciúmes da filha.
O tempo todo há menções ao pai deles, marido já falecido de Yoshiko, que ela acha parecido com seu filho Ryota. Até por isso percebemos o afeto que emana da figura dessa mãe que se preocupa com o filho divorciado.
Vemos Ryota no trem e ele é muito alto, mal ajambrado mas bonito. Leva um bloquinho na mão, onde não escreve nada. Está à procura de inspiração para um novo livro. Ele é o autor de um único livro publicado, “Mesa Vazia”. E seu vício é o jogo. Separado da mulher (Yoko Maki) tem direito a ver o filho uma vez por mês , se for pontual no pagamento da pensão, o que nem sempre ocorre. E Ryota morre de ciúmes do namorado dela.
Para conseguir algum dinheiro para a pensão e viver modestamente, Ryota é detetive particular em casos de divórcio, principalmente. Ele e o parceiro seguem os maridos e esposas infiéis para flagrá-los em fotos úteis para o processo do divórcio.
E quando visita a mãe, pede perdão a ela por não conseguir dinheiro para que ela mude para um lugar mais luxuoso:
“- Perdão mãe por ser um filho fracassado...”
Mas não há angústia no que ele diz. Percebemos que tanto ele quanto a mãe gostam da ex-mulher de Ryota e ficariam felizes se ele voltasse para ela. Há uma esperança de que a família de novo reunida dê um rumo novo à vida deles.
E vamos seguindo com interesse os pequenos dramas que acontecem nessa família, os ciúmes entre irmãos, a preocupação com o dinheiro, com o futuro, com a felicidade.
“- É preciso abrir mão de muita coisa para ser feliz”, diz a mãe para o filho numa conversa antes do tufão.
E o vendaval e a chuva desabam sobre eles, mais para uni-los, sem causar estragos. Ao contrário.
Kore-Eda é um mestre do simples e delicado. Comove sempre.



terça-feira, 1 de novembro de 2016

O Plano de Maggie


“O Plano de Maggie”- “Maggie’s Plan”, Estados Unidos, 2016
Direção: Rebecca Miller
Greta Gerwig, atriz adorável e consistente, é Maggie e está naquela idade que a natureza estimula o desejo de ser mãe. Mas, para Maggie, não a qualquer custo. E muito menos tendo que aturar o pai do bebê. Afinal, seus relacionamentos amorosos até então, nunca tinham durado mais de seis meses.
O fato de ter sido criada pela mãe, que engravidou tempos depois de separar-se do pai dela, quando tiveram uma recaída numa festa, deve ter ajudado na criação desse plano. Mamãe e eu soava bem aos ouvidos daquela que fora a filha que ajudava a mãe em tudo. Nada prática, a professora de poesia inglesa do século XIX, deixava tudo nas mãos de Maggie. Quando ela morreu e a filha teve que viver com o pai, foi um fim de adolescência sereno e solitário.
O plano de Maggie para ter o seu bebê incluía a doação de sêmen de um colega da faculdade, Guy (Travis Fimmel), que era o craque da matemática, além de alto e bonitão. A inseminação artificial seria feita por ela mesma.
Perguntado, Guy expressou nenhum desejo de envolvimento com o bebê, já que seu tempo agora era dedicado à sua empresa de pickles, que ia muito bem.
Só que na hora em que Guy doa o esperma e ela está num dia fértil, fazendo a auto-inseminação na banheira, toca a campainha.  E é John Harding que aparece (Ethan Hawke, ótimo). Ela vinha ajudando o antropólogo, que lecionava na mesma faculdade que ela, com seu romance, lendo e discutindo os capítulos, já que a mulher dele, uma professora famosa, não tinha tempo para isso.
Ela abre a porta, mal recomposta da banheira, quando ele se joga a seus pés e declara sua paixão. Está farto do casamento com a brilhante antropóloga.
Maggie, que estava num dia fértil, num impulso, vai para a cama com ele.
Três anos depois e com uma linda filhinha no colo, Maggie começa a se dar conta de que John é muito folgado. Sempre enrolado com aquele livro dele, não tem tempo para cuidar dos filhos do outro casamento, que empurra para Maggie. Adora a bebê, mas só para brincar com ela por pouco tempo. E a cabecinha de Maggie começa a trabalhar.
Sempre muito prestativa, passa a frequentar a casa de Georgette, a ex de John. Julianne Moore está irresistível no papel da professora mandona, com um sotaque dinamarquês e cabelos ruivos. Sentindo-se superior àquela mocinha que tivera o desplante de tirar o marido dela, foi difícil para Maggie conquistá-la. Mas, quando isso acontece, o segundo plano de Maggie vai ser posto em ação.
Rebecca Miller, em seu quinto longa, conta com um elenco resplandecente, que é o ponto alto de seu filme. Estão todos ótimos e dão vida inteligente a um roteiro que tem altos e baixos.

“O Plano de Maggie” é uma comédia romântica que se destaca das outras, principalmente por Greta Gerwig (a inesquecível Frances Ha) e Julianne Moore, a atriz mais polivalente de Hollywood. Vale a pena ver essa dupla charmosa e divertida.