sábado, 3 de agosto de 2013

A Bela que Dorme


“A Bela que Dorme”- “Bella Adormentata”, Itália/França, 2012
Direção: Marco Bellocchio

A morte nos assusta. Gostamos de ignorá-la. Mas existem situações em que precisamos tomar decisões e até adotar uma posição clara, que terá consequências irremediáveis.
Em “A Bela que Dorme”, um dos melhores cineastas vivos, o italiano Marco Bellocchio, vai tratar dessa questão espinhosa com muito talento. Ele não nos coloca perante uma resposta única. Mesmo porque, o que está por trás da eutanásia (do grego “boa morte”), é a liberdade de escolher entre a vida e a morte, nossa ou de outros, território final embaçado por religiosidades, moralismos e, no fundo, medo.
Mas, ultimamente, o cinema tem nos proposto a realidade da eutanásia, assunto tabu, segredo de família, terreno de rancores, quando deveria ser de compaixão.
“Mar Adentro” (2004), do diretor chileno-espanhol Alejandro Amenábar, tem Javier Bardem, vivendo um homem que luta para ter direito de por fim à própria vida, condenado que está à uma cama, tetraplégico, há 28 anos.
Antes mesmo, em 2002, assistimos ao surpreendente “Invasões Bárbaras”, do canadense Denys Arcand, no qual um filho ajuda seu pai a morrer com dignidade.
Feito para a televisão americana, “You don’t know Jack” de 2010, tem ninguém menos que Al Pacino vivendo o controvertido Jack Kervokian, conhecido como o Dr Morte, que ajudava pessoas com doenças terminais a morrer.
É esse também o assunto de um filme francês de 2012, que não passou aqui ainda, “Quelques Heures du Printemps”, de Stéphane Brizé, no qual um filho, interpretado por Vincent Lindon, acompanha sua mãe, com um câncer fatal, a procurar suicídio assistido na Suiça.
Sem falar de “Amor” de Michael Haneke, Palma de Ouro em Cannes e Oscar de melhor filme estrangeiro de 2012, quando, fazer o outro morrer, é um ato extremo de amor.
Coincidência ou não, o filme de 2011, inédito no Brasil, “Vulcão” da Islândia, trata de forma semelhante a “Amor”, um caso envolvendo um casal de idosos.
Bellocchio em “A Bela que Dorme”, usa um fato real para alimentar a discussão sobre a eutanásia.
Em 2009, a Itália viu um pai ganhar uma batalha na justiça para desligar os aparelhos que mantinham em coma, há 17 anos, sua filha Eluana Englaro.
Na vigília, em frente à clínica onde vai acontecer a morte permitida pela justiça, aglomeram-se pessoas contrárias à eutanásia que rezam, acendem velas, gritam palavras de ordem e cantam. Tudo passado ao vivo na TV italiana.
Entre essas pessoas está Maria (Alba Rohrwacher), filha do senador Uliano Beffardi (Toni Servillo, que foi Aldo Moro no filme “Bom Dia, Noite”(2003), também de Bellocchio), que ali encontra Roberto (Michelle Riondino), militante pró-vida, que cuida do irmão com problemas psiquiátricos.
São duas as belas adormecidas: Eluana e a filha da atriz, a “Divina Madre”, interpretada por Isabelle Huppert.
Eluana morre na clínica. E a menina, filha da atriz, é uma coadjuvante no ritual macabro que sua mãe sustenta, atormentada em sonhos por desejos contrários aos que expressa acordada.
E duas mulheres querem morrer. O senador, pai de Maria, viveu um drama pessoal quando sua esposa católica fervorosa, sofrendo muito, pede a ele que a liberte da vida que não valia mais a pena.
E, como contraponto, uma mulher drogada (Maya Sansa), quer se suicidar e é impedida pelo médico Dr Pallido (Pier Giorgio Bellocchio, filho do diretor) que acredita que ela tem futuro.
Marco Bellocchio, com “A Bela que Dorme”, ganhou o prêmio de melhor filme do júri da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo em 2012.
Não é um filme que levanta bandeiras a favor ou contra a eutanásia. Ao contrário, devolve ao ser humano a decisão a ser tomada com liberdade conforme a consciência de cada um.

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