domingo, 24 de fevereiro de 2013

Adorável Sonhadora

“Adorável Sonhadora”- “Beasts of The Southern Wild” , Estados Unidos, 2012
Direção: Benh Zeitlin

Ela aparece brincando com lama. Faz um bolo e o coroa com um patinho vivo. Cabelos encarapinhados, botas de borracha brancas, calcinha e camiseta. Vive entre galinhas, patos, porcos, cachorro, gato, siris. Todos no meio do lixo.
A casa dela é difícil de descrever. Um “trailler”, talvez, montado sobre uma estrutura estranha. O acesso é por uma escada precária e, lá dentro, uma bagunça de coisas misturadas num espaço pequeno.
Ouvimos seus pensamentos, assim como ela ouve o coração dos bichos, colocando-os na orelha:
“Aposto que eles falam quero comer. Mas às vezes falam num código que eu não entendo...”
A câmara está sempre próxima do rosto dela que mostra um ar de concentração e olhos atentos. É uma criança mas passa uma determinação e reflexão difíceis de encontrar em meninas e meninos de sua idade, uns 7 anos.
Mora com o pai Wink ( Dwight Henry), doente e alcoólatra, como todos que vivem nessa comunidade à beira de um rio no sul dos Estados Unidos. Ele a ensina a sobreviver, a ser dura e selvagem e amar a “Banheira”, o lugar pantanoso onde moram.
“Mamãe, é você? “, pergunta a menina quando ouve um som diferente ou vê uma luz na floresta.
Hushpuppy procura a mãe que fugiu dali nadando. E escuta as preleções de uma vizinha que diz que todos serão destruídos quando as calotas polares descongelarem e os “airoques”, bichos pré-históricos, saírem vivos do gelo onde dormem.
Pesadelos de olhos abertos mostram a ela grandes pedaços de gelo caindo e vultos congelados espreitando no escuro.
“Adorável Sonhadora”, o titulo em português, não tem nada a ver com o original que é algo como “As Bestas do Sul Selvagem”. Mostra pessoas que vivem totalmente à margem da nossa cultura e não são apenas pobres, querem permanecer selvagens, dentro de seu território.
Benh Zeitlin, o diretor estreante de 30 anos, nasceu em Nova Iorque de pai brasileiro, radicado nos Estados Unidos. Ele vive em Nova Orleans e foi lá que rodou seu curta sobre o furacão Katrina de 2005 que destruiu a Louisianna, “Glory at Sea” (2008).
Seu longa, protagonizado por amadores, foi baseado na peça de Lucy Alibar, amiga de infância, “Juicy and Delicious”. Escreveram o roteiro juntos:
“Depois do Katrina eu estava muito ligado nos temas da água e da perda dos lugares. “Juicy” é sobre a perda de uma pessoa. Percebi que podia juntar as duas coisas, a perda do lugar e da pessoa e foi assim que surgiu a personagem Hushpuppy “, diz o diretor em entrevista.
Quvenszhané Wallis tinha 8 anos quando fez o filme e agora vai completar 10. Indicada ao Oscar de melhor atriz, se ganhar, será a mais jovem oscarizada da história desse prêmio. Além de bem dirigida, a menina mostra talento e maturidade, aliados a uma graça natural que ela empresta à sua personagem.
“Adorável Sonhadora”
foi indicado também a melhor filme, melhor diretor e melhor roteiro adaptado.
Sucesso de público nos Estados Unidos, é um filme tocante e terrível, que mostra o mundo recriado na cabeça de uma criança que vive como um bichinho e quer permanecer assim.

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