domingo, 13 de novembro de 2016

Elle


Elle”- Idem, França, Alemanha, 2016
Direção: Paul Verhoeven

A realidade não pode ser objetiva. É sempre subjetiva. Depende de tudo que somos nós. Mas, normalmente, sabemos o que é real e o que é imaginário.
Porém, em algumas pessoas, a fantasia extrapola a mente e se espalha pelos sentidos, fabricando alucinações.
Assim pensando, talvez possamos entender melhor a personagem da atriz extraordinária e sempre nova que é Isabelle Huppert em “Elle”, o novo filme do diretor holandês de 77 anos, Paul Verhoeven do famoso “Instinto Selvagem” de 1992.
Michèlle Leblanc é a personagem que vive sua história na tela. Presente e passado. E com ela, o que foi, será sempre o mesmo ou, pelo menos, o velho disfarçado de novo, fonte obsessiva de dor e prazer. Porque é lá, em seu passado que Michèlle ainda está e, por isso, quase todos os seus atos tem a ver com aquele pai que ela odeia. E ódio é sempre amor pelo avesso.
Aparentemente fria e sabendo o que quer da vida, ela comanda uma empresa que cria jogos, videogames violentos. Sua sócia Anna (Anne Consigny) é amiga antiga e o marido Robert (Christian Berkel), também trabalha lá e é mais íntimo de Michèlle do que se pensa.
O ex-marido Richard (Charles Berling) ainda é alvo de ciúmes de Michèlle, controladora e manipuladora. Assim ela é também na empresa que dirige. Temida e cobiçada, ela dirige os empregados, quase todos homens, com mão firme. Logo vão começar a surgir elementos explícitos de violência contra a patroa.
E um mundo cruel, de assassinatos, sangue e terror, está impresso numa foto antiga, que aparece na TV que fala de um assassino famoso. A “Ashgirl”, como a chamam, “Garota das Cinzas”. Ela nos olha em primeiro plano seminua, ensanguentada, na frente de uma fogueira, onde ardem objetos de uma casa. É a pequena Michèlle que também odeia a mãe.
Personalidade dividida, o que Michèlle aparenta ser, é muito diferente do que ela pode ser.
E quando a fantasia se mistura com a realidade, ela se masturba enquanto observa o vizinho atraente (Laurent Lafitte) com binóculos. E já não serão apenas alucinações ou fantasias que darão prazer a Michèlle pois agora há um parceiro real envolvido. Ela quer mais.
A primeira cena do filme, pela atitude do gato que a olha placidamente, é talvez a chave desse jogo que Paul Verhoeven administra na tela. De propósito, o diretor tenta nos envolver na trama de um estupro, que é dominação e prazer, levantando dúvidas no espectador. Gritos ou gemidos?
Michèlle é fruto de tudo que viu e vivenciou, com aquilo que nasceu com ela. E assim somos todos nós. Uns com mais sorte, outros marcados pelo sinal de Caim.
O suspense bem construído e original do holandês Paul Verhoeven é um filme intrigante e exemplar. Quem não tem algo de Michèlle em si mesmo?
Baseado no livro “Oh...”, 2012, de Phillippe Djian, “Elle” é o indicado da França para o Oscar 2017.
Vai dar o que falar.


sábado, 5 de novembro de 2016

A Luz entre Oceanos


“A Luz entre Oceanos”- “The Light between Oceans”, Reino Unido, Nova Zelândia, Estados Unidos, 2016
Direção: Derek Cianfrance
Foi amor à primeira vista. Ele, saído de Primeira Grande Guerra, estava triste e cansado. Vira tantos horrores que queria afastar-se do mundo dos homens. Tom Sherbourne (Michael Fassbender) conseguira o emprego de cuidador do farol da ilha de Janus. Ela, Isabel Graysmark (Alicia Vikander), era jovem, bonita, a única filha que restara aos pais dela, já que seus dois irmãos tinham morrido na mesma guerra que tanto abatera Tom. Mas ela era vivaz, calorosa e na primeira vez que ele a viu, ela estava com um vestido branco, alimentando as gaivotas no pier de onde ele deveria partir para a ilha.
A caminho do farol, um almoço na casa dos pais dela vai mudar completamente os planos de Tom quanto a querer voltar as costa ao mundo. Ela o enfeitiçou. Saíram para um piquenique e ficaram juntos até aquele inesquecível por do sol frente ao qual ela pedira para casar-se com ele, a única maneira de irem juntos para a ilha.
Em Janus, a derradeira inibição de Tom caiu por terra quando ele a tem em seus braços, tímida mas afetiva, seus corpos falando a língua do desejo de ambos. Era amor e paixão.
E quanto foram felizes passeando de mãos dadas pela praia, na colina atrás da casa aconchegante, subindo pela escadaria íngreme do farol onde se avistavam os dois oceanos que banhavam a ilha deles.
“- Janus é o nome do deus de duas faces”, conta ele para Isabel.
“Uma olha para o passado e a outra o ano que começa. Daí o nome Janeiro para o primeiro mês do ano.”
“- Essa face olha para o futuro?”
“- O futuro não existe, Isabel. Existem nossos desejos, aquilo que queremos que aconteça.”
E eles queriam ser felizes. Aquela ilha, seria o paraíso. Um tinha o outro. O amor deles era um projeto concretizado.
E Isabel ficou grávida. Apesar de não haver médico, nem hospital, ou qualquer outra pessoa na ilha, aquilo não os assustou. Mas, numa noite de tempestade aquele sonho morreu. E uma cruz marcou o lugar de um bebê que seria lembrado para sempre.
Triste, deprimida, Isabel parecia outra.Tom a consolava:
“- Quando você tiver cinco filhos correndo ao seu redor, isso vai se tornar um sonho esquecido.”
Mas foi a mesma coisa com o segundo filho. Ela não conseguia levar avante a gravidez. E outra cruz fez companhia à primeira.
Isabel afundou. Calada, deitada no capim seco, ela era a imgem da desolação. Tom, preocupado, não sabia o que fazer.
Foi quando aquele barquinho apareceu, ao sabor das ondas. Havia alguém a bordo. Os dois saem em disparada e encontram um homem morto e um bebê, de poucos meses, chorando.
A transformação foi imediata. Parecia que Isabel conhecia aquela menina da vida toda. Logo, ela estava alimentada, trocada e dormindo em seu colo. Isabel parecia flutuar de tanta felicidade. Lucy foi o presente que veio quando eles já não tinham mais esperanças de felicidade.
Foi difícil convencer Tom a ocultar a bebê e fazê-la passar por filha deles. Mas ele não teve forças para arrancar a felicidade dos braços dela.
E o epílogo mostra a cegueira da justiça frente aos sentimentos intensos que a perda de um filho faz surgir nos pais.
“A Luz entre Oceanos”é um filme belíssimo. Com cenas deslumbrantes da natureza, filmado na Nova Zelândia e Tasmânia, tem a música inspiradíssima de Alexandre Desplat.
O diretor americano Derek Cianfrance soube adaptar o romance bestseller da australiana M.I. Stedman que conta uma historia dramática e surpreendente.
O elenco brilha e a composição dos personagens é perfeita.O Tom de Fassbender mostra-se tão apaixonado pela Isabel de Alicia Vikander e com tanta força, que o personagem obscurece o ator, se não soubéssemos que são casados na vida real. Vikander é doce e amarga, feliz e trágica. Principalmente  profunda. Uma atriz jovem que conseguiu entender a complexidade de Isabel.
O resto do elenco acompanha o casal, destacando-se Rachel Weiz, bela e intensa.

Eu me emocionei até as lágrimas e não fui a única. Vá ver você também esse filme que arrasta nossas emoções ao sabor dos dramas dessa bela história.

A Luz entre Oceanos


“A Luz entre Oceanos”- “The Light between Oceans”, Reino Unido, Nova Zelândia, Estados Unidos, 2016
Direção: Derek Cianfrance
Foi amor à primeira vista. Ele, saído de Primeira Grande Guerra, estava triste e cansado. Vira tantos horrores que queria afastar-se do mundo dos homens. Tom Sherbourne (Michael Fassbender) conseguira o emprego de cuidador do farol da ilha de Janus. Ela, Isabel Graysmark (Alicia Vikander), era jovem, bonita, a única filha que restara aos pais dela, já que seus dois irmãos tinham morrido na mesma guerra que tanto abatera Tom. Mas ela era vivaz, calorosa e na primeira vez que ele a viu, ela estava com um vestido branco, alimentando as gaivotas no pier de onde ele deveria partir para a ilha.
A caminho do farol, um almoço na casa dos pais dela vai mudar completamente os planos de Tom quanto a querer voltar as costa ao mundo. Ela o enfeitiçou. Saíram para um piquenique e ficaram juntos até aquele inesquecível por do sol frente ao qual ela pedira para casar-se com ele, a única maneira de irem juntos para a ilha.
Em Janus, a derradeira inibição de Tom caiu por terra quando ele a tem em seus braços, tímida mas afetiva, seus corpos falando a língua do desejo de ambos. Era amor e paixão.
E quanto foram felizes passeando de mãos dadas pela praia, na colina atrás da casa aconchegante, subindo pela escadaria íngreme do farol onde se avistavam os dois oceanos que banhavam a ilha deles.
“- Janus é o nome do deus de duas faces”, conta ele para Isabel.
“Uma olha para o passado e a outra o ano que começa. Daí o nome Janeiro para o primeiro mês do ano.”
“- Essa face olha para o futuro?”
“- O futuro não existe, Isabel. Existem nossos desejos, aquilo que queremos que aconteça.”
E eles queriam ser felizes. Aquela ilha, seria o paraíso. Um tinha o outro. O amor deles era um projeto concretizado.
E Isabel ficou grávida. Apesar de não haver médico, nem hospital, ou qualquer outra pessoa na ilha, aquilo não os assustou. Mas, numa noite de tempestade aquele sonho morreu. E uma cruz marcou o lugar de um bebê que seria lembrado para sempre.
Triste, deprimida, Isabel parecia outra.Tom a consolava:
“- Quando você tiver cinco filhos correndo ao seu redor, isso vai se tornar um sonho esquecido.”
Mas foi a mesma coisa com o segundo filho. Ela não conseguia levar avante a gravidez. E outra cruz fez companhia à primeira.
Isabel afundou. Calada, deitada no capim seco, ela era a imgem da desolação. Tom, preocupado, não sabia o que fazer.
Foi quando aquele barquinho apareceu, ao sabor das ondas. Havia alguém a bordo. Os dois saem em disparada e encontram um homem morto e um bebê, de poucos meses, chorando.
A transformação foi imediata. Parecia que Isabel conhecia aquela menina da vida toda. Logo, ela estava alimentada, trocada e dormindo em seu colo. Isabel parecia flutuar de tanta felicidade. Lucy foi o presente que veio quando eles já não tinham mais esperanças de felicidade.
Foi difícil convencer Tom a ocultar a bebê e fazê-la passar por filha deles. Mas ele não teve forças para arrancar a felicidade dos braços dela.
E o epílogo mostra a cegueira da justiça frente aos sentimentos intensos que a perda de um filho faz surgir nos pais.
“A Luz entre Oceanos”é um filme belíssimo. Com cenas deslumbrantes da natureza, filmado na Nova Zelândia e Tasmânia, tem a música inspiradíssima de Alexandre Desplat.
O diretor americano Derek Cianfrance soube adaptar o romance bestseller da australiana M.I. Stedman que conta uma historia dramática e surpreendente.
O elenco brilha e a composição dos personagens é perfeita.O Tom de Fassbender mostra-se tão apaixonado pela Isabel de Alicia Vikander e com tanta força, que o personagem obscurece o ator, se não soubéssemos que são casados na vida real. Vikander é doce e amarga, feliz e trágica. Principalmente  profunda. Uma atriz jovem que conseguiu entender a complexidade de Isabel.
O resto do elenco acompanha o casal, destacando-se Rachel Weiz, bela e intensa.

Eu me emocionei até as lágrimas e não fui a única. Vá ver você também esse filme que arrasta nossas emoções ao sabor dos dramas dessa bela história.

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Depois da Tempestade


“Depois da Tempestade”- “After the Storm”, Japão, 2016
Direção: Hirokazu Kore-Eda
Ele é o cineasta dos afetos delicados. Os últimos filmes dele, que vimos por aqui, foram “Pais e Filhos”de 2013, prêmio do Júri em Cannes, “Nossa Irmã Mais Nova”de 2015 e agora, “Depois da Tempestade” que ganhou o prêmio da crítica da 40a Mostra Internacional de Cinema de SP. Todos encantadores, apesar de não pouparem os comentários sobre os defeitos da natureza humana.
Kore-Eda, 54 anos, além de diretor, é também roteirista e montador e seus filmes são quase sempre em torno à família, o microcosmo do mundo humano. E por isso, ele consegue ser universal falando do Japão.
O filme começa com Yoshiko (Kirin Kiki, atriz fabulosa) conversando na pequena cozinha da casa dela com sua filha (Satomi Kobayashi) sobre o tufão que se aproxima:
“- É o 23º desse ano... Muitos para um ano só...”, comenta a senhora. E conta que, antes temia mas agora gosta de tufões, porque antes não se sentia segura na casa que morava, como naquele apartamento. E fala do marido com alguma nostalgia:
“- A senhora parece ter saudades dele...”comenta a filha irritando a mãe.
“- Imagina!” resmunga ela.
“- A mãe precisava arranjar amigos...”sugere a filha.
“- E arranjar mais enterros para ter que ir?”responde a senhora.
Esse é humor que Kore-Eda vai buscar no meio de conversas quotidianas banais entre mãe e filhos. Porque Ryota (Hiroshi Abe) vai aparecer também na casa da mãe, que ainda tem esperanças de que o filho mais velho se torne um grande escritor de sucesso:
“- Dizem que os grandes talentos desabrocham mais tarde”, divaga ela, aguçando os ciúmes da filha.
O tempo todo há menções ao pai deles, marido já falecido de Yoshiko, que ela acha parecido com seu filho Ryota. Até por isso percebemos o afeto que emana da figura dessa mãe que se preocupa com o filho divorciado.
Vemos Ryota no trem e ele é muito alto, mal ajambrado mas bonito. Leva um bloquinho na mão, onde não escreve nada. Está à procura de inspiração para um novo livro. Ele é o autor de um único livro publicado, “Mesa Vazia”. E seu vício é o jogo. Separado da mulher (Yoko Maki) tem direito a ver o filho uma vez por mês , se for pontual no pagamento da pensão, o que nem sempre ocorre. E Ryota morre de ciúmes do namorado dela.
Para conseguir algum dinheiro para a pensão e viver modestamente, Ryota é detetive particular em casos de divórcio, principalmente. Ele e o parceiro seguem os maridos e esposas infiéis para flagrá-los em fotos úteis para o processo do divórcio.
E quando visita a mãe, pede perdão a ela por não conseguir dinheiro para que ela mude para um lugar mais luxuoso:
“- Perdão mãe por ser um filho fracassado...”
Mas não há angústia no que ele diz. Percebemos que tanto ele quanto a mãe gostam da ex-mulher de Ryota e ficariam felizes se ele voltasse para ela. Há uma esperança de que a família de novo reunida dê um rumo novo à vida deles.
E vamos seguindo com interesse os pequenos dramas que acontecem nessa família, os ciúmes entre irmãos, a preocupação com o dinheiro, com o futuro, com a felicidade.
“- É preciso abrir mão de muita coisa para ser feliz”, diz a mãe para o filho numa conversa antes do tufão.
E o vendaval e a chuva desabam sobre eles, mais para uni-los, sem causar estragos. Ao contrário.
Kore-Eda é um mestre do simples e delicado. Comove sempre.



terça-feira, 1 de novembro de 2016

O Plano de Maggie


“O Plano de Maggie”- “Maggie’s Plan”, Estados Unidos, 2016
Direção: Rebecca Miller
Greta Gerwig, atriz adorável e consistente, é Maggie e está naquela idade que a natureza estimula o desejo de ser mãe. Mas, para Maggie, não a qualquer custo. E muito menos tendo que aturar o pai do bebê. Afinal, seus relacionamentos amorosos até então, nunca tinham durado mais de seis meses.
O fato de ter sido criada pela mãe, que engravidou tempos depois de separar-se do pai dela, quando tiveram uma recaída numa festa, deve ter ajudado na criação desse plano. Mamãe e eu soava bem aos ouvidos daquela que fora a filha que ajudava a mãe em tudo. Nada prática, a professora de poesia inglesa do século XIX, deixava tudo nas mãos de Maggie. Quando ela morreu e a filha teve que viver com o pai, foi um fim de adolescência sereno e solitário.
O plano de Maggie para ter o seu bebê incluía a doação de sêmen de um colega da faculdade, Guy (Travis Fimmel), que era o craque da matemática, além de alto e bonitão. A inseminação artificial seria feita por ela mesma.
Perguntado, Guy expressou nenhum desejo de envolvimento com o bebê, já que seu tempo agora era dedicado à sua empresa de pickles, que ia muito bem.
Só que na hora em que Guy doa o esperma e ela está num dia fértil, fazendo a auto-inseminação na banheira, toca a campainha.  E é John Harding que aparece (Ethan Hawke, ótimo). Ela vinha ajudando o antropólogo, que lecionava na mesma faculdade que ela, com seu romance, lendo e discutindo os capítulos, já que a mulher dele, uma professora famosa, não tinha tempo para isso.
Ela abre a porta, mal recomposta da banheira, quando ele se joga a seus pés e declara sua paixão. Está farto do casamento com a brilhante antropóloga.
Maggie, que estava num dia fértil, num impulso, vai para a cama com ele.
Três anos depois e com uma linda filhinha no colo, Maggie começa a se dar conta de que John é muito folgado. Sempre enrolado com aquele livro dele, não tem tempo para cuidar dos filhos do outro casamento, que empurra para Maggie. Adora a bebê, mas só para brincar com ela por pouco tempo. E a cabecinha de Maggie começa a trabalhar.
Sempre muito prestativa, passa a frequentar a casa de Georgette, a ex de John. Julianne Moore está irresistível no papel da professora mandona, com um sotaque dinamarquês e cabelos ruivos. Sentindo-se superior àquela mocinha que tivera o desplante de tirar o marido dela, foi difícil para Maggie conquistá-la. Mas, quando isso acontece, o segundo plano de Maggie vai ser posto em ação.
Rebecca Miller, em seu quinto longa, conta com um elenco resplandecente, que é o ponto alto de seu filme. Estão todos ótimos e dão vida inteligente a um roteiro que tem altos e baixos.

“O Plano de Maggie” é uma comédia romântica que se destaca das outras, principalmente por Greta Gerwig (a inesquecível Frances Ha) e Julianne Moore, a atriz mais polivalente de Hollywood. Vale a pena ver essa dupla charmosa e divertida.

segunda-feira, 31 de outubro de 2016

13 Minutos


“13 Minutos”- “Elser”, Alemanha, 2015
Direção: Oliver Hirschbiegel
Um herói anônimo e desconhecido, por muito tempo depois de sua morte, é o personagem central desse filme de Oliver Hirschbiegel, famoso por “A Queda – As Últimas Horas de Hitler” de 2004, com o fantástico ator Bruno Ganz.
Johann Georg Elser (Christian Friedel) é o nome do alemão nascido em 4 de janeiro de 1903 e que morreu em Dachau, executado com um tiro na nuca, em 9 de abril de 1945, dias antes da libertação do campo de concentração pelos aliados. Uma execução cercada de segredo e da qual poucos oficiais nazistas teriam conhecimento.
Mas por que esse carpinteiro e operário alemão, simpatizante do comunismo, foi escondido?
A resposta é simples: vergonha. Como pode ter acontecido de um simples carpinteiro executar tal plano e ainda por cima sozinho, como afirmava? Como poderia Elser, um qualquer, executar um atentado contra a vida de Hitler em novembro de 1939, numa reunião em Munique à qual compareceram Goebbels, Heydrich e Himmler, entre os 3.000 membros do Partido Nacional Socialista presentes?
Isso não fazia sentido para o orgulho nazista. Por isso tentaram conseguir com torturas, as mais cruéis, a confissão de Elser de que não agira sozinho e sim a mando e ajudado pelos Estados Unidos e Inglaterra.
Mas não tiveram sucesso, por mais que se esforçassem e acabaram solucionando o caso à sua maneira. Enforcaram um oficial nazista como o responsável pelo atentado e esperaram para executar o verdadeiro cabeça em sigilo absoluto, para que nenhuma sombra de incompetência pairasse sobre o partido.
A Elser, os nazistas quiseram tirar o mérito e a honra que a História poderia conceder-lhe. Esse homem do povo, que via o que muitos não percebiam ainda, quase conseguiu seu intento e a História teria tomado outros rumos.
Hitler escapou por um triz. A bomba explodiu 13 minutos depois que ele deixou às pressas o local da reunião, devido a um nevoeiro que poderia impedi-lo de sair de Munique, se não se apressasse.
O filme conta o que aconteceu depois do atentado que fez vítimas e em “flashback” faz conhecer a história desse herói pacifista, que deu sua vida pelo bem da humanidade, sem qualquer outro interesse que não fosse o de evitar o que ele pressagiava: a Segunda Guerra e seus 55 milhões de mortos.
“Elser”, o título original do filme, faz vir à luz a vida desse homem amante da música e das mulheres e seu grande amor por Else, que não aconteceu como ele queria, com um final feliz, porque ele colocou o seu projeto de salvar a humanidade do mal que significava Hitler, à frente de sua própria felicidade pessoal.

Um homem raro.

sábado, 29 de outubro de 2016

A Garota do Trem


“A Garota no Trem”- “The Girl on the Train”, Estados Unidos, 2016
Direção: Tate Taylor

Um trem passa pelo subúrbio de Nova York, Arsdley-on-Hudson, onde de um lado da linha férrea está o rio Hudson e, do outro, casas acolhedoras e seus jardins. Ouvimos em “off” a voz de Emily Blunt, num monólogo interior, que olha da janela do trem com melancolia:
“- Quem nunca fantasiou sobre a vida das pessoas que moram nessas casas? Imagino como são suas vidas, o que dizem esses casais um para o outro na hora de dormir...”
Rachel (Emily Blunt, perfeita no papel), bebendo numa garrafa de água, olha angustiada para a paisagem das casas. Numa delas, vemos o casal que parece a imagem da perfeição para Rachel. Sorriem um para  outro, sentados no jardim. Numa das varandas, uma outra loura alonga o belo corpo e olha o rio.
“- Eu não sou mais a garota que eu fui. Eu tinha uma vida numa dessas casas. Era tudo que eu queria e foi tudo que perdi”, continua ela em seu monólogo interior.
Rachel tem um caderno na mão e desenha casas e casais. Parece obcecada com essas imagens. Aos poucos, vamos percebendo que o que ela bebe não é água. Uma mãe com seu bebê muda de lugar assustada, quando vê as garrafas de vodca barata que Rachel leva na bolsa. Ela é alcoólatra.
O que faz ela naquele trem todo dia? O que faz com que ela precise olhar todo dia aquelas casas?
Existem três mulheres nessa história: Rachel que perdeu sua vida e sua casa e agora mora de favor com uma amiga, Megan (Haley Bennett) que é a loura do casal perfeito na cabeça de Rachel e Anna (Rebecca Ferguson) que tem um bebê pequeno e mora na casa que foi de Rachel com Tom (Justin Theroux), o ex-marido dela.
A passageira diária do trem foi trocada por outra.
E, apesar da raiva intensa que a sufoca, ela se sente culpada pelo que aconteceu. Num delírio masoquista está certa de que foi ela mesma que destruiu o seu casamento, quando soube que não conseguia engravidar. Desde então jogou-se na bebida e cometeu desatinos que afastaram o marido e o jogaram nos braços de outra, com quem é feliz e tem uma família.
Toda vez que bebe muito, e isso é todo dia, telefona para a casa dele e não fala nada. Quem atende é a babá, a vizinha Megan, contratada por Anna para ajudá-la com o bebê. Anna está assustada com esse assédio.
Mas nem tudo que Rachel imagina é verdade. Ou seja, com sua baixíssima auto-estima e seu estado de completa falta de lucidez por causa da bebida, Rachel é um perigo para si mesma e para os outros. Tem buracos na memória e não é uma testemunha fidedigna nem de sua própria vida.
Quando acontece um desaparecimento inexplicável numa daquelas casas, a verdade, nada brilhante, vem à tona.
O filme, adaptado com eficiência por Erin Cressilda Wilson do best-seller escrito por Paula Hawkins, mistura suspense, drama e crime. Tudo em dose certa e com “flashbacks” que vão contando o que aconteceu.
O diretor Tate Taylor assina um filme com uma história envolvente e belas imagens.
O final é surpreendente e vale toda a espera. O trio de belas atrizes convence e impressiona.
E Emily Blunt é a mais brilhante. Uma atriz que nunca se deixa levar pela vulgaridade, mesmo interpretando uma alcoólatra. Torcemos por ela, mesmo quando há fortes indícios de que ela pode ter cometido um crime do qual não se lembra, por causa da destruição de sua memória pela bebida.
Ela merece sua primeira indicação ao Oscar.
E “A Garota no Trem” merece ser visto por seus personagens complexos, sua história bem contada e por seu final nada óbvio.