quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Depois da Tempestade


“Depois da Tempestade”- “After the Storm”, Japão, 2016
Direção: Hirokazu Kore-Eda
Ele é o cineasta dos afetos delicados. Os últimos filmes dele, que vimos por aqui, foram “Pais e Filhos”de 2013, prêmio do Júri em Cannes, “Nossa Irmã Mais Nova”de 2015 e agora, “Depois da Tempestade” que ganhou o prêmio da crítica da 40a Mostra Internacional de Cinema de SP. Todos encantadores, apesar de não pouparem os comentários sobre os defeitos da natureza humana.
Kore-Eda, 54 anos, além de diretor, é também roteirista e montador e seus filmes são quase sempre em torno à família, o microcosmo do mundo humano. E por isso, ele consegue ser universal falando do Japão.
O filme começa com Yoshiko (Kirin Kiki, atriz fabulosa) conversando na pequena cozinha da casa dela com sua filha (Satomi Kobayashi) sobre o tufão que se aproxima:
“- É o 23º desse ano... Muitos para um ano só...”, comenta a senhora. E conta que, antes temia mas agora gosta de tufões, porque antes não se sentia segura na casa que morava, como naquele apartamento. E fala do marido com alguma nostalgia:
“- A senhora parece ter saudades dele...”comenta a filha irritando a mãe.
“- Imagina!” resmunga ela.
“- A mãe precisava arranjar amigos...”sugere a filha.
“- E arranjar mais enterros para ter que ir?”responde a senhora.
Esse é humor que Kore-Eda vai buscar no meio de conversas quotidianas banais entre mãe e filhos. Porque Ryota (Hiroshi Abe) vai aparecer também na casa da mãe, que ainda tem esperanças de que o filho mais velho se torne um grande escritor de sucesso:
“- Dizem que os grandes talentos desabrocham mais tarde”, divaga ela, aguçando os ciúmes da filha.
O tempo todo há menções ao pai deles, marido já falecido de Yoshiko, que ela acha parecido com seu filho Ryota. Até por isso percebemos o afeto que emana da figura dessa mãe que se preocupa com o filho divorciado.
Vemos Ryota no trem e ele é muito alto, mal ajambrado mas bonito. Leva um bloquinho na mão, onde não escreve nada. Está à procura de inspiração para um novo livro. Ele é o autor de um único livro publicado, “Mesa Vazia”. E seu vício é o jogo. Separado da mulher (Yoko Maki) tem direito a ver o filho uma vez por mês , se for pontual no pagamento da pensão, o que nem sempre ocorre. E Ryota morre de ciúmes do namorado dela.
Para conseguir algum dinheiro para a pensão e viver modestamente, Ryota é detetive particular em casos de divórcio, principalmente. Ele e o parceiro seguem os maridos e esposas infiéis para flagrá-los em fotos úteis para o processo do divórcio.
E quando visita a mãe, pede perdão a ela por não conseguir dinheiro para que ela mude para um lugar mais luxuoso:
“- Perdão mãe por ser um filho fracassado...”
Mas não há angústia no que ele diz. Percebemos que tanto ele quanto a mãe gostam da ex-mulher de Ryota e ficariam felizes se ele voltasse para ela. Há uma esperança de que a família de novo reunida dê um rumo novo à vida deles.
E vamos seguindo com interesse os pequenos dramas que acontecem nessa família, os ciúmes entre irmãos, a preocupação com o dinheiro, com o futuro, com a felicidade.
“- É preciso abrir mão de muita coisa para ser feliz”, diz a mãe para o filho numa conversa antes do tufão.
E o vendaval e a chuva desabam sobre eles, mais para uni-los, sem causar estragos. Ao contrário.
Kore-Eda é um mestre do simples e delicado. Comove sempre.



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