segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Afterimage


“Afterimage”- Powidoki”, Polonia, 2016
Direção: Andrzej Wajda

Não pode ter sido à toa, nem mera coincidência. O último filme da carreira do importante cineasta polonês Andrzej (1926-2016), teve como assunto a biografia de Wladslaw Strzeminski (1893- 1952), considerado um dos maiores pintores da Polônia.
Criado na tradição da arte russa, ele morreu aos 59 anos como indigente, tuberculoso, sem trabalho, expulso da Associação de Artistas de Lodz onde morava e demitido como professor de arte da Escola Superior de Belas Artes, da qual tinha sido co-fundador.
Mais. A Sala Neoplástica no Museu de Arte de Lodz (criado por ele, o segundo Museu de Arte Moderna da Europa) que exibia suas pinturas e esculturas de sua então mulher, Katarzyna Kobro, foi desmontada por ordem superior no começo dos anos 50.
No entanto, Strzeminski (lindamente interpretado pelo excelente Boguslaw Linda) era um pintor contemporâneo de Malevitch, Kandinsky e Chagal, criador em 1922 da primeira exposição “avant-garde” na Lituânia, então sob domínio polonês.
O artista tinha perdido um braço e uma perna na Primeira Guerra mas, mesmo assim, trabalhava bastante e os alunos adoravam suas aulas, que ninguém perdia, na Escola Superior de Belas Artes. Nelas, ele expunha sua “Teoria da Visão” que depois foi publicada em livro.
O que aconteceu com Strzeminski? A que se deveu a condição decadente como terminou seus dias?
Foi vítima da intransigência dos burocratas do Partido Comunista que abominavam a arte abstrata e a liberdade de escolha do artista, pregando o “realismo soviético”, arte ideológica com o intuito de engrandecer os ideais do comunismo soviético, retratando os precursores e líderes do movimento stalinista e os camponeses e operários, já que para eles toda arte deveria sustentar “as necessidades do povo”. Pura propaganda em cartazes, esculturas e imensos quadros, a maioria beirando o mau gosto.
Essa descida para a morte que o pintor executa com sóbrio rigor e até mesmo, aceitação, dá uma pista sobre a escolha de sua vida como um filme do fim da vida de Wajda.
Ele, que foi exilado político e depois senador pela Polônia, é conhecido por seus filmes engajados. Seu pai foi morto por Stalin e ele viveu a época de que trata o filme, sabendo bem do sofrimento a que os opositores do regime estavam condenados.
Há uma forte identificação entre o cineasta e o pintor, ambos apoiados em sua arte e vivendo seus próprios ideais, sem adesão alguma ao que não julgavam verdadeiro.
Mesmo a maneira com que o roteiro conta a vida do pintor, sem entrar em detalhes sobre sua vida afetiva, parece ecoar o desejo de Wajda de valorizar no homem que ele retrata, mais do que tudo, a atitude, a postura firme frente às convicções que defendeu até o fim.
Depois de mais de 50 filmes (“Cinzas e Diamantes”1958, “Danton”1983) e 90 anos de idade, “Afterimage” é um testamento estóico e sobretudo um libelo intransigente contra a falta de liberdade na criação artística.
Vamos sentir falta do cinema brilhante de Wajda...



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