sexta-feira, 26 de junho de 2020

Destacamento Blood



“Destacamento Blood”- “Da 5 Bloods”, Estados Unidos, 2020
Direção: Spike Lee

O genial diretor negro faz seu novo filme retratar o problema do racismo de maneira exemplar. Usa a Guerra do Vietnã como cenário, de 1965 a 1973, anos da participação americana, com o discurso do anticomunismo. Apoiavam o sul contra o norte do Vietnã. Os números dos mortos entre os negros eram escandalosos: 34% do exército era de negros na época que representavam 11% da população americana.
No começo vemos nomes famosos, líderes do movimento de direitos civis como Muhammad Ali, numa entrevista, chamando a atenção sobre o absurdo da guerra no Vietnã e o porquê de não se alistar: “...nunca me fizeram mal, nem me atacaram com cães nas ruas...” Depois Malcom X: “...os pretos cortaram algodão por 20 anos sem nenhuma paga, algum dia essas pessoas vão se voltar contra vocês”. E Angela Davis em 1961 enche a tela lembrando para todos nós o “Black is Beautiful”.
E lá do outro lado do mundo, monges se queimavam pela paz. Soldados morriam e matavam a população civil também. E um general vietnamita do Vietnã do sul, aliado dos americanos, dá um tiro na cabeça de um homem que cai morto na frente da câmera. E o horror no filme mostrando crianças desesperadas correndo com o corpo queimado pelo napalm. Saigon cai em 1975 e os refugiados do sul superlotam balsas.
Décadas depois chegam os “Bloods” em Ho Chi Min City, antiga Saigon. Esse nome não é familiar para nossas plateias. Trata-se de gangues violentas de Los Angeles, que usam a cor vermelha.
No hall do hotel se reúnem com alegria os quatro soldados americanos negros que lutaram juntos sob o comando do sargento “Stormin’ Norman”, que morreu na guerra. O número 5 do título do filme.
A razão da viagem era a recuperação do corpo do sargento, autorizados pelos americanos, para ser sepultado em Arlington. Bem, essa era a missão oficial. Mas por trás dela havia um segredo bem guardado: o ouro da CIA destinado a pagar os vietnamitas do sul.
O diretor insere filmes reais da guerra em preto e branco e faz flashbacks dos enfrentamentos em que participaram os quatro atores e não muda o visual deles. Talvez para mostrar que são lembranças onde o único que morreu aparece jovem. O ouro foi enterrado para ser resgatado por eles depois da guerra.
Assim Melvin (Isiah Whitlock Jr), o médico Otis (Clark Peters), Eddie (Norm Lewis) e Paul, o líder “cabeça quente” (Delroy Lindo, ator espetacular), se abraçam e fazem piadas, intimamente antecipando o tesouro enterrado.
De improviso chega no hotel o filho de Paul, David (Jonathan Majors), preocupado com o pai, que não gosta da presença dele.
“- Norman era uma religião para seu pai”, diz Otis para David que conta que o pai está perturbado e violento. Em pesadelos grita o nome de Norman.
Combinam ir com um guia vietnamita até certo ponto e depois seguir sozinhos. Claro, o segredo do tesouro era crucial. Tinham mapas e localizador de metais. Mas não antecipavam os perigos que teriam que enfrentar.
Hedy (Melanie Thierry) uma francesa de uma ONG, diz para David:
“- As guerras levam muito tempo para acabar. Não vê as minas terrestres ainda matando gente? E as bombas? “
Paul se destaca como o mais desequilibrado e traumatizado. Ele vai fazer uma viagem interna para um passado que quer esquecer mas não consegue. Seus demônios internos aparecem e ele vai sofrer uma catarse necessária, numa belíssima cena.
O filme de Spike Lee tem diversas camadas de entendimento e referências a filmes como “Apocalypse Now”, com “As Valquírias” de Wagner e o helicóptero negro contra o disco vermelho do sol, por exemplo.
E o belo som das canções de Marvin Gaye.
O filme termina com o discurso de Martin Luther King que foi também lembrado nas manifestações em torno ao assassinato de George Floyd por jovens do mundo todo contra o racismo e a violência.
“Black Lives Matter” porque “All Lives Matter”.

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