terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

A Dama de Ferro



“A Dama de Ferro” – “The Iron Lady”, Inglaterra/França 2011

Direção: Phyllida Lloyd



Ela parece estar perdida numa neblina. Lembranças e realidade alternam-se indistintamente. Seus olhos, que antes eram azul-aço, se apertam, embaçados.

“- Bom dia Lady Tatcher! Tudo bem? Vamos falar sobre seus encontros de hoje?”, diz a secretária Susie, entrando no apartamento da velha senhora pela manhã.

Mas ela não está lá. Sentada no teatro, escuta Maria cantar “Shall We Dance?” no musical “The King and I“. Rodopiam no palco e ela se encanta, tamborilando os dedos no ritmo da valsa alegre.

Denis, seu marido fala qualquer coisa, ela se vira mas ele sumiu e ela não está mais no teatro.

Uma pilha de livros espera por seu autógrafo. Senta-se na escrivaninha e começa a tarefa. Assina Margareth Tatcher muitas vezes até que um Margareth Roberts nos surpreende.

Em um “flashback”criado por sua mente, a vemos muito jovem com os pais, debaixo de uma mesa, durante um bombardeio alemão a Londres durante a Segunda Guerra.

E logo o pai diz a ela:

“- Vá pelo seu próprio caminho. Não me desaponte Margareth!”

“- Ganhei uma bolsa para Oxford”, diz ela orgulhosa ao pai.

Mas a cena se dissipa e é a secretária que fala sobre algumas pílulas que ela deixara de tomar.

Algo a ver com ficar lúcida.

Mas como? E nunca mais ser jovem e entusiasta, casada com Denis, dez anos mais velho que ela e ter um par de gêmeos?

Nunca mais ter 49 anos e tornar-se a primeira mulher na história da Inglaterra a liderar um partido político e quatro anos depois tornar-se a primeira mulher do Ocidente a ser Primeiro Ministro? Nunca mais morar no 10, Downing Street que foi a sua casa por onze anos?

É pedir demais para a velha senhora que, sem o seu passado, torna-se inútil para si mesma.

Ela, que os russos apelidaram de “Dama de Ferro” e de quem o presidente Mitterrand da França dizia: “Ela tem olhos de Caligula e boca de Marilyn Monroe”? Ela, que tinha vencido aqueles que a chamavam de “filha do quitandeiro” e a discriminavam por suas origens humildes?

Não. A lucidez tira dela o poder.

“- Você tem que lembrar-se de que não é mais a Primeira Ministra, mamãe”, diz a filha.

Tiraram tudo dela... Até o amado filho Mark que vive na África do Sul.

Não. O que ela mais quer é viver no passado com sua glória.

Em sua 17ª indicação ao Oscar, Meryl Streep criou um corpo para essa senhora e parece que a reencarna, vivendo dentro desse corpo inventado. Dos 49 anos aos 86, Meryl Streep é Margareth Tatcher, numa atuação assombrosa.

Phyllida Lloyd, que dirigiu “Mamma Mia!”, seu primeiro longa, no qual Meryl Streep canta e dança, teve o prazer de ter essa atriz extraordinária de novo com ela.

O roteiro de Abi Morgan é um achado. Faz o filme ser um relato na primeira pessoa, em “flashbacks”que trazem de volta o passado de alguém que comandou uma nação.

Amada e odiada pelos ingleses, ela deixou sua marca na História.

E é assim que ela quer se lembrar de si mesma.

Apesar de não comungar com suas idéias políticas, Meryl Streep entendeu a personagem, uma rainha sem coroa mas com poder que, no fim, qual um rei Lear destronado, vaga, alucinando uma vida que acabou, em um apartamento em Londres.

Grande história, grande atriz.



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