domingo, 1 de maio de 2011

A Minha Versão do Amor



“A Minha Versão do Amor”- “Barney’s Version”, Estados Unidos, 2010

Direção: Richard J. Lewis





Um charuto no cinzeiro, um copo de uísque sobre a mesa e um homem de meia idade no telefone.

“- Chame minha esposa!”, diz com voz pastosa.

“- São 3 da manhã. Ela não vai falar com você”, respondem do outro lado da linha.

“- E aquelas fotos dela nua, quando era bem novinha? Você não vai querer ver?”, pergunta o homem com ironia maldosa.

Assim somos apresentados a Barney Panofsky, 65 anos, quase careca e muitos quilos a mais em seu corpo atarracado e envelhecido.

A filha dele pergunta no dia seguinte:

“_ Por que telefonou às 3 da madrugada para o marido de minha mãe?”

Parece que Barney não se conforma com essa separação.

Ele tem uma produtora de TV que faz filmes classe B, a “Totally Unnecessary Productions”. O nome diz tudo.

Está encrencado com um delegado de polícia por causa de algo que aconteceu no passado e pior, sua lucidez começa a falhar. Vive perdendo o carro.

É aí que vamos começar a ver o desfile de suas memórias, em “flashbacks”. A versão de Barney sobre sua vida.

Essa história vai girar em torno às suas mulheres. Ou melhor, ex-mulheres, porque à esta altura já percebemos que ele está só e desconsolado.

Assim, vamos a 1974. Na Roma boêmia, Barney, cercado de amigos farristas, ainda com cabelos crespos e mais magro, se casa com uma pintora pornô, uma linda judia ruiva, desequilibrada e auto-destrutiva ( Rachelle Lefevre). Ela está grávida e pensa que o filho é dele. O final é trágico.

Já em 1979, no Canadá, Barney casa-se uma segunda vez com outra linda judia, desta vez morena, rica e faladeira (Minnie Driver).

É a ocasião de vermos um legítimo casamento judaico com muita dança, comida a granel, famílias emperiquitadas e muita alegria.

Só o noivo parece macambúzio, bebendo muito e até acompanhando um jogo de hóquei no bar com os amigos.

Será nessa festa de seu casamento que Barney vai conhecer aquela que ele diz ser a mulher de sua vida (a suave Rosamund Pike). Ela vai ser a mãe de seus dois filhos e, com ela, ele vive um romance atrapalhado pelos seus ciúmes e egoismo, mas intenso e correspondido.

Barney Panofsky é um personagem que vai nos conquistando ao longo do filme. Narcisista, ególatra e machista, sofre transformações por conta das “trombadas” que leva pela vida e acaba por nos comover. É um veiculo sensacional para a atuação de Paul Giamatti, que interpreta com paixão e sinceridade esse homem por vezes detestável.

Dirigido com competência por Richard J. Lewis, com roteiro de Michael Kanyves, o filme é a adaptação para o cinema do livro “A Versão de Barney” (Cia das Letras), de Mordechai Richter (1931- 2001), a quem o filme é dedicado.

Considerado um dos mais famosos escritores canadenses, ele retrata em seu último livro de 1997, com amor e ironia, o meio em que viveu: os judeus do Québec.

Os diálogos são ótimos e quem entende “idish”, o dialeto dos judeus da Europa Central, se delicia com as palavras enxertadas nas frases em inglês.

O humor judaico do filme é inteligente e peculiar. O toque picante fica por conta das cenas que envolvem o pai de Barney, um policial aposentado, mal educado e vulgar. Dustin Hoffman encarna essa figura, tão hilariante quanto inconveniente, com o talento de sempre.

“A Minha Versão do Amor” é um filme que quer divertir e consegue, fazendo com que a gente ria e também se emocione nas situações mais melodramáticas. Prende o espectador nem tanto pelo riso mas com a humanidade dos tipos que aparecem na história.

Vá ver e pense como a vida é contada sempre como uma narrativa subjetiva. A verdade, nesse mundo, só existe como a versão de cada um.

Nas histórias que contamos sobre a nossa vida sempre valerá o dito “Assim é, se lhe parece”. Concordam?


5 comentários:

  1. Oi, Eleonora
    A abordagem deste fime é bastante interessante na medida em que o "comportamento masculino" (sem generalizações) recebe um tratamento delicado que vai nos conduzindo até o final com muita leveza e sensibilidade.
    Os "Barney" da vida, existem mundo a fora. São comuns e isentos de originalidade. Banalizam e terminam as suas vidas com um vulgar acidente de percurso em qualquer noite com uma mulher qualquer.
    A personagem da atriz Rosamund Pike, excelente,é um exemplo de mulher contemporanea com as suas reais convicções que desde sempre sabia o que queria. Portanto jamais aceitaria o triste e patético Barney de volta. Paul Giamatti, sempre magnífico, nos faz acreditar de tão bom ator que é, que o Barney é ele mesmo. A "musicalidade" da família judaida é perfeita em todos os momentos.
    Dustin Hoffman, na altura do seu talento, nos brinda com mais este personagem.
    É um filme simples mas que nos faz refletir.Bjs,Sonia Clara

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  2. Sonia Clara querida,
    Seu comentário como sp perfeito e bem articulado!
    Aproveito o espaço para contar um caso. Alguém disse para mim que não entendia o comportamento da terceira esposa de Barney. Como pode uma mulher tão doce e compreensiva romper o casamento por causa de uma transa que não teve importância nenhuma para ele?
    Tive que responder:
    - Mas esta é a versão dele! Se a gente perguntasse como foi a separação para ela, a resposta seria completamente diferente.Lembre-se de que o titulo original do livro e do filme é "A versão de Barney".
    E foi por isso que me veio à mente o "assim é se lhe parece".
    Bjs

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  3. Eleonora querida,
    Sem dúdida! Não é a toa que o Pirandello inspirou-se nesse maravilhoso dito popular e escreveu a peça "Cosi é si vi pare"... Nada mais perfeito!
    Baci

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  4. SIM, Eleonora.
    “Assim é, se assim é...” a versão que Mordechai Richler deu ao personagem Barney.
    “Usando a mesma força de seus pensamentos na realização correspondente de sua ação.”
    Onde tudo foi possível. O irreal acontecendo na sua versão real.

    Assim criou um personagem absolutamente normal, (Barney), sem maiores desvios de personalidade, a não ser o de ser ou estar “entupido” de tédio, acompanhado de todas as desqualificações correspondentes ao ser desse tipo, que consegue atrair para casamentos consecutivos, 3 mulheres e, a última em especial, acima de seus méritos. Assim foi no livro e no filme porque o autor assim imaginou sua versão. Um ser com dias, horas, rotinas, atitudes desprezíveis consegue até realizar suas versões com mulheres acima de seus talentos, enquanto vai se destruindo, culminando na deterioração, (alzheimer), do próprio pensamento, fonte de sua criação ou de sua versão da ação.

    Talvez, a figura de sua terceira e última mulher, a da sua Vida, a mãe de seus filhos, com sua suavidade, serenidade e positividade, signifique uma versão de ideal que se mantem “monocordicamente” mesmo depois de uma separação ou após a morte. Tanto que na cena final ela aparece depositando flores no túmulo de Barney, em cuja lápide consta também o seu nome a espera de seu futuro.

    Me pergunto também se a insistência de personagens como o Barney deste filme, na perseguição obsessiva da uma mulher como a de sua Vida, - tema muito recorrente em filmes e livros e muito provavelmente na Vida real, - pergunto-me se tem algum significado especial ou decisivo para uma Mulher, como fator de escolha de um Homem na sua Vida.

    Pergunto também se no filme não há uma crítica, na tradição judaica dessas pessoas do Canadá, referente à mulher seduzida e colada na figura masculina, quase como vítimas, mesmo esta sendo tão desqualificada quanto a de Barney.

    Embora de formas constrangedoras, é um filme que diverte, mas sobretudo faz a gente pensar muito nas relações humanas,- como também salientou a Sonia Clara - e nesse caso, centradas nos costumes de famílias judaicas de Montreal, Quebec, onde o autor vivia e se inspirava para seus ensaios e livros.
    Histórias de “amor com ironia”.(sic)
    Bjs
    P.S. (Re)vendo o filme, reparem no ator Jack Hoffman, que faz o filho do personagem Barney,
    e vejam se ele se parece com o pai, Dustin.

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  5. Querido Ser Amigo,
    Sp comentando e expandindo as reflexões dos filmes do blog, vc estava fazendo falta.
    Me escapou completamente que o ator que faz o filho do Barney fosse filho de Dustin Hoffman. Mas agora que vc contou, a semelhança existe .
    E é bom, o menino. Vamos ficar de olho nele.
    Bjs

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