quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Bravura Indômita





“Bravura Indômita”- “True Grit”, Estados Unidos, 2010

Direção: Ethan e Joel Coen





Os irmãos Ethan e Joel Coen são hoje figuras obrigatórias quando se pensa em bom cinema. Seus filmes, sempre inteligentes e quase sempre de um humor mordaz, trazem para a discussão temas que falam sobre a complexidade da natureza humana.

Para “Bravura Indômita”, eles foram buscar inspiração no livro de Charles Portis, publicado em 1968, que virou filme no ano seguinte, estrelado por John Wayne que ganhou o Oscar de melhor ator.

Mas não se enganem. Porque “Bravura Indômita” dos Coen não é uma refilmagem:

“- Não foi o filme antigo que nos deu a vontade de fazer um novo “Bravura Indômita”. Foi o livro de Charles Portis. Nossa bússola foi o livro, não o filme”, esclarecem em Berlim, onde abriram o festival com o seu filme.

As cenas iniciais começam a contar a história de uma garota de 14 anos, chegando sozinha de trem a uma cidadezinha do velho oeste. Tranças apertadas, rosto decidido, olhos inteligentes, ela quer vingar a morte de seu pai, assassinado por um empregado, Tom Chaney (Josh Brolin), que fugira, refugiando-se no território índio.

Obcecada pelo tema da vingança, ela procura quem a auxilie na caçada ao assassino. E escolhe para isso o “Marshall” (policial federal) Rooster Cogburn (Jeff Bridges, criando um tipo inesquecível e mais uma vez indicado para o Oscar).

Ela acompanha com atenção o julgamento dele, acusado de matar pai e filho, procurados pela policia, em uma emboscada.

Parece que o que agrada a Mattie Ross (a surpreendente estreante Haylee Steinfeld), é a postura atrevida de Cogburn que, apesar de assassino confesso, beberrão e mentiroso conhecido, vira a causa a seu favor e sai livre do tribunal.

Ela precisa de alguém tão obstinado e atrevido quanto ela para levar à frente o seu projeto. Mas, em sua ingenuidade e onipotência juvenil, pensa que tudo vai ser do jeito que ela quer.

Ao não poder entregar-se ao luto pela morte de seu pai, Mattie precisa encontrar alguém que a ajude a praticar o auto-engano:

“- Vai ser como no tempo em que meu pai levava eu e meu irmão para caçar guaxinins. A gente se divertia muito, contando histórias em torno da fogueira”, diz com ar sonhador, tentando convencer o debochado Cogburn a aceitar o dinheiro que lhe promete se trouxer o assassino do pai para a forca.

Eis que, então, aparece o outro homem de Mattie, o “Texas Ranger”, delegado LaBoeuf (Matt Damon), que também quer pegar o mesmo homem, acusado de outro crime, o assassinato de um senador. Ele é todo certinho, o oposto de Rooster Cogburn.

Os três vão participar de uma viagem iniciática para Mattie.

Ao longo do caminho, os dois homens vão entrar em conflito por ninharias e competir como meninos. E a garota vai ter que enfrentar a morte dos outros ao vivo, sofrer a fraqueza e a força dos seres humanos, avaliar a existência da solidariedade e do egoísmo e constatar o poder da natureza.

A vida real, com toda a sua complexidade, vai cobrar o preço a quem se atreve a enfrentar o que não conhece.

Mattie vai ter que aceitar a própria fragilidade e depender dos homens que escolheu, para sua aventura insana, quando a natureza armar uma armadilha para ela.

Os irmãos Coen, que levaram o Oscar de melhor filme e direção em 2008 com “Onde os Fracos não tem vez”, voltaram a concorrer no ano passado com ”Um Homem Sério”, filme genial, que não foi compreendido pela critica nem pelo grande público.

Dessa vez fizeram um filme-cebola, com muitas camadas e que pode ser olhado de várias maneiras.

“Bravura Indômita” pode ser visto tanto como sendo um “bang-bang”divertido pelos mais simplórios ou como um filme que propõe questões importantes na formação dos Estados Unidos como nação, pelos mais informados e até como sendo uma obra que coloca reflexões psicológicas e filosóficas mais amplas, que servem para toda a humanidade.

O filme é sucesso de bilheteria nos Estados Unidos e foi indicado para 10 Oscars, incluindo melhor filme, direção, ator, atriz coadjuvante e roteiro adaptado.

O cenário do Novo México e Texas, com suas infindáveis planícies geladas e desertas, inspirou uma fotografia belíssima a Roger Deakins, que também foi indicado para o Oscar.

A beleza das cenas na natureza selvagem ajuda “Bravura Indômita” a inserir o homem em uma escala correta e cruel, ou seja, não somos nada perante as incertezas da vida e o inevitável da morte.

É sempre esse o tema dos irmãos Coen, que são brilhantes na demonstração dessa tese em “Bravura Indômita”, um filme que merece público apesar de ter sido esquecido no Oscar.

4 comentários:

  1. Este filme é mesmo tudo de bom! sou fã dos irmãos Coen!
    beijão

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  2. Querida Ana,
    Bom saber que gostamos dos mesmos diretores, pelo menos no caso dos Cohen, já que vc já é uma cineasta!
    E quem gosta de cozinhar, não pode perder o blog da Ana,
    pessoasesabores.com
    Tem cada receita show! Vcs vão gostar!
    Bjs

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  3. Estava contando até dez pra decidir se postava um confronto entre minha percepção passada e atual sobre ídolos que havia feito pro meu blog. Aí, decidi pelo impulso, não sabendo se cabia aqui como comentário, uma vez que ainda não vi o filme "Bravura...".
    Num trecho escrevia que:
    "apesar de adorar ou ter "adorado" o gênero western, estou c/ medo de assistir à BRAVURA INDÔMITA, por exemplo; embora apreciador das atuações de Jeffrey Bridges, êle não é John Wayne; frequentador contumaz que sou dos Irmãos Cohen, êstes não são Henry Hathaway; talvez sejam melhores em captar a essência do livro do jornalista Charles Portis, não importa, porque os atuais ídolos não são os de nossas percepções anteriores juvenis. Ou são?!

    Reforço, essa afirmação não é Qualitativa de quais eram ou são mesmos os ídolos, ou os melhores. Está claro?!

    Outro medo é de não apreciar mais a mise-en-scène toda de Bridges e elenco, c/ caras e atitudes duronas, já não mais criando a mesma emoção como no filme original, não tanto por sua atuação, mas muito mais pela comparação e mudança de percepção das emoções.

    Ou seja, já descascamos bastante a cebola de nossas projeções em tipos e personagens na ficção. Mas como o medo da decepção permanece, vou tirar isso a limpo a qualquer momento desses vendo o filme."

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  4. Querido Ser Amigo,
    Melhor conferir o filme.
    Bjs

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