domingo, 18 de julho de 2010

À prova de morte





“À prova de morte”-“Death Proof”, Estados Unidos, 2007
Diretor: Quentin Tarantino

Jovens pés femininos, com pulseirinha no tornozelo, descansam sobre o painel de um carro que corre por uma estrada ao som de um rock animado.
“À prova de morte” abre com um dos fetiches do diretor Quentin Tarantino, que também produz, dirige a fotografia e seleciona as músicas da trilha sonora, além de atuar em uma ponta.
Claro que não é diversão para uma platéia convencional. Mas, quem conhece e gosta do estilo desse diretor, vai se deliciar com todos os clichês “a la Tarantino”que estão em “À prova de morte”, filme de 2007 que fazia a segunda parte de uma sessão dupla que começava com “Planeta Terror”de Roberto Rodrigues. Os diretores pensaram em homenagear as sessões de cinema com dois filmes dos “drive-in” americanos dos anos 60 e 70. Nelas passavam os filmes B de baixo orçamento e com muita violência, sexo, terror e perseguições em carros “envenenados”.
O projeto não fez sucesso nos Estados Unidos e apesar de ter sido exibido na Mostra de São Paulo e no Festival do Rio em 2007, só agora “À prova de morte” chega ao nosso circuito.
Propositalmente, o filme apresenta borrões, ranhuras e aqueles cortes mal feitos quando se passava de um rolo de filme para outro, como acontecia antigamente.Tudo produzido com tecnologia digital para criar o ar “retrô” dos anos 70.
O forte de “À prova de morte” não é a história. Já no “trailler” conta tudo: Stuntman Mike, um ex-dublê cabotino e meio ridículo com seu topete e casaco prateado, usa seu carro, um Chevy Nova 1970, com uma caveira pintada no capô, para atrair belas garotas que vão nutrir seus instintos assassinos. Elas morrem com as manobras violentas que faz o dublê porque só o banco do motorista é “death proof”, protegido e reforçado, à prova de morte. Mas isso ele só conta quando a aterrorizada garota já está sentada no outro banco.
Para o psicopata sanguinário, Stuntman Mike, seu carro é como que extensão de seu corpo impotente, para conseguir orgasmos letais. Mas haverá castigo surpresa.
Na primeira parte do filme, garotas safadinhas que falam e riem contando umas às outras seus casos amorosos, são excrutinadas pela câmara “voyeur” de Tarantino que explora a bela anatomia delas. “Close” em pernas, peitos e traseiros em shortinhos apertados. Estão naquele carro, que corre pela estrada, Jungle Julia, “a DJ mais sexy de Austin,Texas” (Sydney Tamiia Poitier, filha do ator Sidney Poitier) e suas amigas Shanna ( Jordan Lad) e Arlene ( Vanessa Ferlino). Elas vão ao bar do Warren (Quentin Tarantino se divertindo muito), onde bebem e dançam antes de partir para um fim de semana só de garotas.
Uma série de diálogos picantes e de duplo sentido esquentam a temperatura do bar para onde vai o dublê assassino atrás das garotas. E o “clímax” dessa excitação toda é a “lap dance”, dança erótica de Vanessa Ferlino para um participante Stuntman Mike (Kurt Russell, ótimo no papel). Quentíssimo.
A cena que encerra a primeira parte do filme, uma espetacular colisão, é mostrada quatro vezes porque é filmada a partir do ponto de vista de cada uma das quatro garotas que morrem em meio a latas retorcidas, vidro quebrado, explosões e fogo, com direito até a uma perna decepada no meio da estrada. Muito sangue, claro.
Graças a um xerife caipira que entende tudo o que aconteceu (referência a “Fargo” dos irmãos Cohen), o dublê assassino tem que mudar de estado e vamos para Lebanon, Tennessee, onde acontece a segunda parte do filme.
E se na primeira metade estamos na noite, com muito néon e bebida, na segunda parte a luz do sol ilumina a cena com cores vibrantes. As garotas que o psicopata escolhe dessa vez também são bonitas mas poderosas. E ele não sabe.
Este é um tema recorrente nos filmes de Tarantino que já vimos, por exemplo, em “Kill Bill” 1 e 2 (2003 e 2004), com Umma Thurman e Pam Grier em “Jackie Brown”( 1997).
Como se para vingar as outras quatro, em um carro branco desafiam o carro preto do assassino. “Quem com ferro fere...com ferro será ferido”, diz o ditado popular.
Quentin Tarantino, que sabe como ninguém brincar no cinema, em “À prova de morte” mostra que, mesmo quando faz de propósito um filme ruim, consegue ser divertido e original. Coisa fácil para ele.

Um comentário:

  1. 1) Gosto desse lado “não convencional” tarantiniano. Aprecio, sobretudo, o profissional original rompendo c/ o padrão “tudo certinho” dos dogmas cinematográficos, fazendo parecer “...de propósito um filme ruim...” se divertindo e fazendo divertir, como Eleonora aponta na sua crítica. Provavelmente este não seria um filme de sua preferência, (!), mas “articulada” c/ o Cinema e c/ a Vida, ELA soube se entregar à Diversão e nos chamar ao lúdico. “...Coisa fácil para ele...” e tbém pelos que “sabem se deixar brincar c/ o imaginário”. (segue...2)

    2) Valeu a dica, senão no cinema, - não havendo tempo, - pelo menos em vídeo.
    A pensar: até que ponto tem justificativa hoje em dia brincar c/ a violência, não sendo, o filme, nem simulação de história em quadrinho, nem paródia ao tema. Ou é?! A ser verificado vendo o filme. S/ moralismos edificantes! Talvez seja uma catarse, ou talvez nada disso, e sim, pura e simplesmente uma estória a la tarantino.
    Vc aí que está aqui, - (se já viu o filme ou não) – então? !

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