Espere muito mais de "500 dias com ela" do que simplesmente mais uma comédia romântica daquelas que as mulheres vão ver sozinhas ou com as amigas à tarde.
Porque o diretor, Marc Webb, em seu primeiro longa, depois de muitos vídeo-clips, surpreende.
Para começar, ele desconstrói um dos preconceitos de gênero mais arraigados que existem: nesse filme é o homem que é romântico de uma forma irrealista. É ele que idealiza o amor e espera angustiado pela "alma gêmea" que vai acabar com todos os seus dias ruins.
Acontece que ela, Summer, não é daquelas menininhas bobas que não sabem nada da vida.
Para o espectador que não entende inglês, é melhor explicar que o nome dela é Verão. E que, para quem mora em países onde existe um inverno rigoroso, só se pode ter certeza de 120 dias de verão. Para essas pessoas, o sol é um bem apreciado.
Ronaldo Bôscoli, um compositor brasileiro dos começos da bossa nova, captou o espírito do verão como ninguém:
"Dias de luz,
Festa de sol,
E o barquinho a deslizar
No macio azul do mar…
………………………
Tanto mar e luz!
Dias tão azuis!"
E essa explosão de cores e calor explica o encantamento de Tom, nosso garoto, pela garota Summer que é, para ele, tudo isso que Bôscoli cantou.
E mais.
A personagem tem pitadas de Gigi, do filme musical que todo mundo de uma certa idade conhece: é desligada e infantil. Como também é esperta e sofisticada como uma Holly Golightly saída de "Breakfast at Tiffany’s".
É uma menina que lembra também os anos 60 em Ipanema onde todas as mulheres do mundo queriam ser Leila Diniz: preza a sua liberdade, gosta de sexo e quer ser tratada de igual para igual pelos homens. Mas não deixa de ser feminina um minuto. Chora no cinema mas enfrenta a vida com decisão.
Enquanto nosso garoto espera dela promessas de amor eterno, ela faz com que ele viva dias de "luz e sol" como ninguém tinha feito com ele antes.
E se torna inesquecível como toda mulher por quem um homem se apaixona. "Adoro tudo nela", diz Tom. Quando está com ela o mundo se ilumina, quando ela não está Los Angeles fica gráfica, sem cor, vazia.
O filme tem também o mérito de contar uma história tão batida de "boy meets girl" (garoto encontra garota), em um ritmo diferente, indo para a frente e para trás, em uma cadência nova, ao som de músicas gostosas.
Menção especial para os sussuros de Carla Bruni cantando "Quelqu’un m’a dit que tu m’aimes encore" (Alguém me disse que você ainda me ama).
O recurso da tela dividida em duas, que não é novidade, ganha aqui uma ideia nova: de um lado as expectativas do garoto, de outro a realidade, o que realmente está acontecendo em sua relação com Summer.
E assim, entre trilha sonora caprichada e roteiro original, vemos os encontros e desencontros de uma história que não é uma "love story", como nos previnem com humor já nos titulos iniciais do filme.
"500 dias com ela" é um filme que diverte, encanta e faz com que nos identifiquemos com as situações criadas, qualquer que seja a nossa idade. Afinal, o amor não tem idade mas estações. E, depois de um verão de luz e sol, só depende da nossa competência e de algumas coincidências, deixar que aconteça um outono surpreendente em nossas vidas.
"500 dias com ela" foi postado originariamente em 15 de novembro de 2009, às 19:30
ResponderExcluirO texto recebeu quatro comentários a seguir:
ResponderExcluirRafael j, em 21 de novembro de 2009, às 21:22
Cara Eleonora. Seu rosto é figurinha carimbada em colunas sociais e afins, e por elas que tinha algum conhecimento sobre você, mesmo não sendo grande leitor desse mercado. A sua coluna sobre cinema tem sido uma grata surpresa, posso dizer até que é um dos pontos altos deste site.
Fica a minha sugestão - que tal expandir o campo de domínio e escrever sobre cinema de uma forma geral e não apenas sobre os filmes que estão em cartaz? Exemplo: os desafios do cinema no Brasil, produção independente, formação de público, história do cinema, atores, diretores, premiação, festivais, perspectivas futuras, etc.
abraço.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirComentário encaminhado à redação de MPost em 19 de novembro de 2009, às 16:17
ResponderExcluirOi, Eleonora!
Eu assisti este filme no avião vindo de Orlando e adorei , realmente o que vc escreve abaixo sintetiza muito bem a história e mostra não apenas um “love story” mas talvez uma realidade da minha geração , um pouco desprendida demais .
Outro aspecto legal do filme é o jogo do destino que só acontece se trabalharmos por ele , na verdade Summer preparou Tom para a garota que ele conheceu no dia que foi fazer uma entrevista num escritório de arquitetura , por falar nisso a letra do Ronaldo caiu muito bem no texto.
LGR
Andrea Pacífico, em 18 de novembro de 2009, às 12:21
ResponderExcluirEleonora, sempre amei suas sugestões, críticas e comentários sobre cinema. Que delícia poder estar a par dos filmes toda semana no MPost. Parabéns! Bj Andréa
Sylvia Manzano, em 15 de novembro de 2009, às 21:13
ResponderExcluirGosto de ver o afinco da Eleonora assumindo essa nova função de crítica de cinema e adoro suas críticas.
Eu detesto papo-cabeça, crítico que mais complica do que explicita o filme para o futuro expectador e com as críticas que a Eleonora faz, eu sempre fico com vontade de ir ver o filme: ela vende muito bem o peixe.
E aqui também começou a passar um filme lindo: assisti o primeiro bloco da entrevista com o Lula na RedeTv.