Direção: Marco
Bellocchio
A morte nos assusta.
Gostamos de ignorá-la. Mas existem situações em que precisamos tomar decisões e
até adotar uma posição clara, que terá consequências
irremediáveis.
Em “A Bela que Dorme”, um
dos melhores cineastas vivos, o italiano Marco Bellocchio, vai tratar dessa
questão espinhosa com muito talento. Ele não nos coloca perante uma resposta
única. Mesmo porque, o que está por trás da eutanásia (do grego “boa morte”), é
a liberdade de escolher entre a vida e a morte, nossa ou de outros, território
final embaçado por religiosidades, moralismos e, no fundo,
medo.
Mas, ultimamente, o
cinema tem nos proposto a realidade da eutanásia, assunto tabu, segredo de
família, terreno de rancores, quando deveria ser de compaixão.
“Mar Adentro” (2004), do
diretor chileno-espanhol Alejandro Amenábar, tem Javier Bardem, vivendo um homem
que luta para ter direito de por fim à própria vida, condenado que está à uma
cama, tetraplégico, há 28 anos.
Antes mesmo, em 2002,
assistimos ao surpreendente “Invasões Bárbaras”, do canadense Denys Arcand, no
qual um filho ajuda seu pai a morrer com dignidade.
Feito para a televisão
americana, “You don’t know Jack” de 2010, tem ninguém menos que Al Pacino
vivendo o controvertido Jack Kervokian, conhecido como o Dr Morte, que ajudava
pessoas com doenças terminais a morrer.
É esse também o assunto
de um filme francês de 2012, que não passou aqui ainda, “Quelques Heures du
Printemps”, de Stéphane Brizé, no qual um filho, interpretado por Vincent
Lindon, acompanha sua mãe, com um câncer fatal, a procurar suicídio assistido na
Suiça.
Sem falar de “Amor” de
Michael Haneke, Palma de Ouro em Cannes e Oscar de melhor filme estrangeiro de
2012, quando, fazer o outro morrer, é um ato extremo de amor.
Coincidência ou não, o
filme de 2011, inédito no Brasil, “Vulcão” da Islândia, trata de forma
semelhante a “Amor”, um caso envolvendo um casal de idosos.
Bellocchio em “A Bela que
Dorme”, usa um fato real para alimentar a discussão sobre a
eutanásia.
Em 2009, a Itália viu um
pai ganhar uma batalha na justiça para desligar os aparelhos que mantinham em
coma, há 17 anos, sua filha Eluana Englaro.
Na vigília, em frente à
clínica onde vai acontecer a morte permitida pela justiça, aglomeram-se pessoas
contrárias à eutanásia que rezam, acendem velas, gritam palavras de ordem e
cantam. Tudo passado ao vivo na TV italiana.
Entre essas pessoas está
Maria (Alba Rohrwacher), filha do senador Uliano Beffardi (Toni Servillo, que
foi Aldo Moro no filme “Bom Dia, Noite”(2003), também de Bellocchio), que ali
encontra Roberto (Michelle Riondino), militante pró-vida, que cuida do irmão com
problemas psiquiátricos.
São duas as belas
adormecidas: Eluana e a filha da atriz, a “Divina Madre”, interpretada por
Isabelle Huppert.
Eluana morre na clínica.
E a menina, filha da atriz, é uma coadjuvante no ritual macabro que sua mãe
sustenta, atormentada em sonhos por desejos contrários aos que expressa
acordada.
E duas mulheres querem
morrer. O senador, pai de Maria, viveu um drama pessoal quando sua esposa
católica fervorosa, sofrendo muito, pede a ele que a liberte da vida que não
valia mais a pena.
E, como contraponto, uma
mulher drogada (Maya Sansa), quer se suicidar e é impedida pelo médico Dr
Pallido (Pier Giorgio Bellocchio, filho do diretor) que acredita que ela tem
futuro.
Marco Bellocchio, com “A
Bela que Dorme”, ganhou o prêmio de melhor filme do júri da Mostra Internacional
de Cinema de São Paulo em 2012.
Não é um filme que
levanta bandeiras a favor ou contra a eutanásia. Ao contrário, devolve ao ser
humano a decisão a ser tomada com liberdade conforme a consciência de cada
um.
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