“Minha Querida Dama”- “My Old Lady” , Estados Unidos,
França, 2014
Direção: Israel Horovitz
Um americano em Paris. Procura um endereço andando pelas
ruas do Marais, bairro tradicional da cidade.
Entra no pátio de um “hotel particulier”, bate numa
porta azul e entra, porque está aberta. Vasculha o apartamento, como se fosse o
dono e se depara com uma velha senhora deitada numa “chaise
longue”.
Ele dirige-se a ela num francês sofrível mas ela
responde em inglês:
“- Você é Mathias?O advogado falou que você
vinha.”
“- Herdei esse apartamento de meu
pai.”
“- Sou Mathilde Girard”, apresenta-se
ela.
“- A senhora poderia me mostrar o
apartamento?”
“- Claro. Passemos ao “salon d’hiver”, por aqui” e ela o
conduz a uma sala luminosa cuja grande janela mostra um belo
jardim.
“- Esse jardim no meio de Paris deve valer uma fortuna!”
Ele senta-se ao piano e dedilha as teclas.
Ele senta-se ao piano e dedilha as teclas.
“- Você se parece muito com seu
pai.”
“- Você conheceu meu pai? Ele comprou o seu
apartamento?”
E é nesse momento que o sonho de Mathias Gold, de vender
o apartamento e sair do buraco financeiro em que estava metido, desmorona. Ele
fica sabendo pela velha senhora que havia herdado um “viager”, ou seja, uma
maneira da lei francesa permitir que alguém compre um imóvel, mais barato, com
um inquilino dentro, por toda sua vida. Além disso compromete-se a pagar-lhe uma
quantia por mês, até sua morte.
“- Seu pai comprou esse apartamento há 43 anos
atrás.”
“- Era a minha última esperança...Ele me pegou de novo!”
diz com raiva.
E assim começa a convivência forçada de um trio formado
pelo americano de 57 anos, três divórcios e problemas com a bebida, a senhora de
92 anos e sua filha, Chloé, solteirona de 50 anos, professora de inglês e amante
de um homem casado.
Israel Horovitz, 75 anos, autor de 70 peças teatrais,
escreveu “My Old Lady”, levou-a ao palco, fez a adaptação para o cinema e
dirigiu o filme.
O que começa divertido, vai ficando mais pesado quando o
passado sobe à tona. Mathias e Chloé são lamurientos e culpam seus pais por tudo
que não acontecera de bom na vida deles. Muito parecidos. E, portanto, com
vocação para casal.
Mas Mathias é o mais complicado dos dois. Além do pai
ausente e que não o valorizava, sempre segundo ele, descobrimos com horror que
sua mãe ainda fora mais cruel que o pai, como toda pessoa que se acha vítima
acha-se no direito de tratar os outros.
Mas crianças traumatizadas tem que fazer escolhas na
vida quando crescem. E é a partir de uma catarse que Mathias entende finalmente
que precisa viver seus dias, que ainda restam, saindo dessa sombra dos pais
sombrios.
Kevin Kline está soberbo. Faz rir com seu humor ácido e
comove quando encara de frente sua tragédia pessoal.
Kristin Scott-Thomas também caminha para um final melhor
resolvido, graças ao espelho que vê em Mathias.
E Maggie Smith, aos 80 anos, convencendo como uma
saudável e enérgica senhora de 92 anos, tem um jeito de olhar que faz do
espectador seu cúmplice. Está maravilhosa.
Só esse trio já vale o filme. Mas tem mais. O Sena, com
suas margens fotogênicas sob todo tipo de luz e um apartamento bem produzido
como cenário para uma nova história de amor.