Direção: Noémie
Lvovsky
Em pleno filme B, a atriz
só serve como uma garganta a ser cortada e sangrar
abundantemente.
No camarim, a outra
pergunta:
“- Você teve
falas?”
“- Argh...” responde ela
revirando os olhos.
Camille Vaillant, 40
anos, atriz sem futuro, uma filha de 16 anos, afoga as mágoas no álcool. Seu
marido e pai de sua filha, que conheceu quando estavam ainda na escola, vai
abandoná-la por outra mais jovem.
Amarga, seu olhar traduz
desprezo pelo mundo que a cerca.
Durante os créditos,
objetos como cigarros, plumas, brilhos, relógio, palitos de fósforo, sobem e
descem na tela num balé em câmara lenta.
Na noite de Ano Novo, ela
anda pelas ruas no meio da neve e, a caminho de uma festa, resolve entrar numa
relojoaria, estranhamente aberta naquela hora da noite.
E aqui começa a graça
desse filme que faz todos se lembrarem de “Peggy Sue - Seu Passado a Espera” de
Copolla de 1986.
Mas, apesar de alguns
pontos em comum, o filme francês é bem diferente do americano.
Assim, como numa fábula
encantada, Jean-Pierre Léaud faz o relojoeiro mágico que abre as portas do tempo
para Camille. Ele mexe no relógio dela, parado há muito, presente de seus pais
aos 16 anos, quando conheceu o marido, ficou grávida e sua mãe morreu. E
consegue tirar de seu dedo o anel, primeiro presente do marido. Esses objetos
icônicos vão ser a chave para a volta ao passado.
Na festa de réveillon à
fantasia, no meio das amigas do tempo do colégio, dançando uma música da sua
adolescência, ela desmaia para acordar num hospital nos anos
80.
O tempo foi para trás.
Camille tem 16 anos novamente. E esse é o maior encanto do filme de Noémie
Lvovsky, 48 anos, diretora, atriz e co-roteirista de “Camille Outra
Vez”.
Ela consegue passar para
o espectador essa transformação para adolescente apenas alongando o cabelo e
vestindo as roupas cafonas dos anos 80. E Noémie não tem um corpinho de
menina.
Mas é o brilho nos olhos
e o frescor do sorriso, quando anda em sua bicicleta de menina, que faz o pacto
com o espectador. Todos nós nos lembramos de nossa adolescência nos espelhando
na animação dela.
Claro que ela vai tentar
mudar o futuro que só ela conhece. Mas o tema do filme parece ser a redescoberta
do amor. Não só o entre homem e mulher mas também o amor
filial.
Pois é com ternura que
Camille encara os pais e num ato comovente grava as vozes deles. Essa será a
cápsula do tempo que fará com que o passado devolva algo que ela valoriza mais
quando volta a ser menina. E ela consegue levar
para o futuro a sua recuperada capacidade de amar.
O elenco, que também não
é de adolescentes, convence pelo mesmo motivo que a atriz principal ou seja, não
são caricaturas, são eles mesmos, lembrando-se da
adolescência.
“Camille Outra Vez” é uma
boa comédia francesa e, assim sendo, não consegue ser superficial ou gratuita.
Mas também não é um filme de Francis Ford Coppola e portanto, as angústias são
vividas com mais leveza e ironia.
Um filme que surpreende e
nos envolve, mesmo a contragosto.
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