sábado, 1 de setembro de 2018

Benzinho




“Benzinho”, Brasil, 2017
Direção: Gustavo Pizzi

Uma correria para a praia. Carregando boia, bola, comida e guarda sol, a família aproveita a casa de Araruama. Mas a cena seguinte, na casa em Petrópolis, mostra a triste realidade em que vive a classe média baixa brasileira.
A casa está caindo aos pedaços, literalmente, há rachaduras profundas, a torneira da cozinha emperra, a porta da frente não abre e o jeito é sair pela janela. Não cabem no orçamento os reparos necessários.
Metáfora da realidade maior do povo brasileiro? Claro. Mas “Benzinho” não tem como objetivo a crítica em si. Quer mais mostrar os afetos contraditórios que circulam no coração da gente.
E escolhe a figura de uma mãe superprotetora (Karina Telles, uma atriz que se expressa com os olhos, boca e alma) para demonstrar isso de maneira que soa espontânea e natural, sem maiores dramas.
É bem isso que seduz em “Benzinho”. O cotidiano agridoce de uma mãe, um padecer no paraiso mas também mostrando uma pessoa que quer colocar todos debaixo de sua asa, controladora, que quer consertar uma auto estima baixa, que no fundo esperava mais da vida e que quando se deprime parte para a mania, fazendo mil coisas ao mesmo tempo, falando muito, correndo para não ser atingida, finalmente, pela angústia que sente invadir seu ser.
Vivem com Irene naquela casa oito pessoas: o marido Klaus, os quatro filhos (Fernando, Rodrigo e os gêmeos pequenos), Sonia, a irmã e seu filho, fugidos de um pai e marido violento.
E com seus atores, assim como no roteiro a duas mãos pelo diretor Gustavo Pizzi e Karina Telles, que já foram casados, o filme mostra uma família de verdade nos filhos gêmeos dos dois, Francisco e Arthur, no sobrinho de Karina, Luan Telles, que faz o filho que toca tuba. E outra família de coração, nos amigos Adriana Esteves, a tia e o uruguaio Cesar Trancoso, os pais de Vicente Demori. Sem esquecer Otávio Muller, que é o pai e marido carente, um outro filho de Irene.
Quando Fernando (Kostantin Sarris, estreante talentoso), o mais velho, é convidado para uma bolsa de estudos na Alemanha porque é ótimo no handebol, o coração da mãe se divide. Feliz pela oportunidade que o filho tem na vida e chorosa porque ele vai partir e quem sabe não voltar.
Certamente é difícil deixar partir os filhos, a famosa síndrome do ninho vazio, mas há aí também uma primeira chamada para Irene olhar-se de perto E, com coragem, ver o que se passa com ela, além do espelho. E é nos olhos que Karina Telles mostra o que a boca não diz. O tempo passa e a vida também.
Na cena final, belamente conduzida pelo diretor, enquanto a banda passa, um close inesquecível de sua atriz principal expressa uma tomada de consciência nas lágrimas que escorrem e no sorriso que se desmancha, ao som de uma voz feminina que canta “Loveling”.
Assim, Irene lava a alma e vai enfrentar os inevitáveis sofrimentos que virão. Ela cresceu.


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