“Benzinho”, Brasil, 2017
Direção: Gustavo Pizzi
Uma correria para a praia. Carregando boia, bola, comida e
guarda sol, a família aproveita a casa de Araruama. Mas a cena seguinte, na
casa em Petrópolis, mostra a triste realidade em que vive a classe média baixa
brasileira.
A casa está caindo aos pedaços, literalmente, há rachaduras
profundas, a torneira da cozinha emperra, a porta da frente não abre e o jeito
é sair pela janela. Não cabem no orçamento os reparos necessários.
Metáfora da realidade maior do povo brasileiro? Claro. Mas
“Benzinho” não tem como objetivo a crítica em si. Quer mais mostrar os afetos
contraditórios que circulam no coração da gente.
E escolhe a figura de uma mãe superprotetora (Karina Telles,
uma atriz que se expressa com os olhos, boca e alma) para demonstrar isso de
maneira que soa espontânea e natural, sem maiores dramas.
É bem isso que seduz em “Benzinho”. O cotidiano agridoce de
uma mãe, um padecer no paraiso mas também mostrando uma pessoa que quer colocar
todos debaixo de sua asa, controladora, que quer consertar uma auto estima
baixa, que no fundo esperava mais da vida e que quando se deprime parte para a
mania, fazendo mil coisas ao mesmo tempo, falando muito, correndo para não ser
atingida, finalmente, pela angústia que sente invadir seu ser.
Vivem com Irene naquela casa oito pessoas: o marido Klaus,
os quatro filhos (Fernando, Rodrigo e os gêmeos pequenos), Sonia, a irmã e seu
filho, fugidos de um pai e marido violento.
E com seus atores, assim como no roteiro a duas mãos pelo
diretor Gustavo Pizzi e Karina Telles, que já foram casados, o filme mostra uma
família de verdade nos filhos gêmeos dos dois, Francisco e Arthur, no sobrinho
de Karina, Luan Telles, que faz o filho que toca tuba. E outra família de
coração, nos amigos Adriana Esteves, a tia e o uruguaio Cesar Trancoso, os pais
de Vicente Demori. Sem esquecer Otávio Muller, que é o pai e marido carente, um
outro filho de Irene.
Quando Fernando (Kostantin Sarris, estreante talentoso), o
mais velho, é convidado para uma bolsa de estudos na Alemanha porque é ótimo no
handebol, o coração da mãe se divide. Feliz pela oportunidade que o filho tem
na vida e chorosa porque ele vai partir e quem sabe não voltar.
Certamente é difícil deixar partir os filhos, a famosa
síndrome do ninho vazio, mas há aí também uma primeira chamada para Irene
olhar-se de perto E, com coragem, ver o que se passa com ela, além do espelho.
E é nos olhos que Karina Telles mostra o que a boca não diz. O tempo passa e a
vida também.
Na cena final, belamente conduzida pelo diretor, enquanto a
banda passa, um close inesquecível de sua atriz principal expressa uma tomada
de consciência nas lágrimas que escorrem e no sorriso que se desmancha, ao som
de uma voz feminina que canta “Loveling”.
Assim, Irene lava a alma e vai enfrentar os inevitáveis
sofrimentos que virão. Ela cresceu.
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