“Sem Data, Sem Assinatura”- “Bedoune Tarik, Bedoune Emza”,
Irã, 2017
Direção: Vahid Jalilvand
Tudo acontece muito rápido. Uma moto é atingida pelo espelho
do carro que teve de desviar de outro e está caída ao lado da avenida escura.
Imediatamente, o homem que causou o acidente estaciona e vai
ajudar a família que estava na moto. Um bebê chora no colo da mãe e um menino
de uns 8 anos está ao lado do pai que conduzia a moto.
“- O meu filho bateu a cabeça”, diz o pai aflito.
O homem do carro se ajoelha para examinar o menino:
“- Está com náuseas? Sua cabeça está doendo? Eu sou médico.
”
Acrescenta que pagará os estragos na moto e o hospital para
o menino. O médico parece preocupado. Não deixou chamar a polícia porque sabia
que seu seguro não estava em dia.
“- Vou dar uma carona até o hospital e pago o conserto da
moto. ”
Tira a carteira do bolso e diz para o pai da família:
“- Pegue o quanto quiser para o conserto. Tem um hospital
aqui perto. ”
Mas o homem põe a moto em pé e diz que vai sair dali com a
família. O carro do médico segue atrás e ele buzina sinalizando a entrada do
hospital. Mas a moto segue em frente.
Mal sabia o dr Nariman (Amir Aghaee), médico legista
respeitado que ali começaria um drama. Tanto para a família de Moose (Navid
Mohammadzadeh), quanto para ele próprio.
Perplexo, ele vê no dia seguinte, o corpo do menino no necrotério.
Tinha chegado pela manhã cedo e ia ser autopsiado para determinar a causa da
morte.
Atordoado, ele ouve falar que o exame laboratorial indicava
intoxicação alimentar e botulismo. Mas ele não consegue se convencer. Para ele
o menino tivera uma concussão cerebral por causa do acidente. Os sintomas são
os mesmos nos dois casos.
A família do menino é avisada e vemos a mãe (Zakiyeh
Behbahani) culpar o marido pela morte do filho.
Ele fica louco de dor e raiva e corre ao abatedouro onde
comprara barato carcaças de galinha.
Outro drama acontece.
O filme, dirigido e com roteiro do iraniano Vahid Jalilvand,
42 anos, mostra o conflito interno em que a culpa arrasta tanto o médico como o
pai do menino, de modos diferentes, mas igualmente terrível, para um inferno.
De quem é a culpa pela morte da criança?
Mesmo depois da justiça ser acionada, não importa a decisão
do juiz. Fica claro que cada um dos homens envolvidos nunca vão se livrar dessa
culpa que os perseguirá para sempre.
O filme tem cores desbotadas, quase cinza, combinando com a
situação de dor e luto que toca a todos.
“Sem Data, Sem Assinatura” mostra o Irã e seus problemas
sociais mas também ultrapassa fronteiras e fala do humano, sob o peso e o jugo
da culpa, sempre na sombra e da qual não nos livramos quando ela cai em cima de
nós e é acolhida. Se somos éticos, claro.
O filme foi premiado no 74º Festival de Veneza, na mostra
Orizzonti, como melhor direção e melhor ator para Navid Mahammadzadeh.
Seco, envolvente e trágico.
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