“A Noite
Devorou o Mundo”- “La Nuit a Devoré le Monde”, França, 2017
Direção:
Dominique Rocher
Confesso
que não vejo filmes de zumbis. Gosto de filmes de horror quando há algo a
pensar. O que é muito raro.
Mas sei que
sentir medo e tudo acabar depois de duas horas, é diversão para muitos. Talvez
porque se reasseguram que não há nada a temer fora da sala de cinema, onde
gritaram e fecharam os olhos quando o clima apertava. Adrenalina na veia.
Mas o mundo
de hoje em dia provê bastante terror real. É isso que os fãs de filmes de
horror não querem ver? Porque não dá para controlar a ameaça real.
E quem
algum dia imaginou Paris entregue aos zumbis?
Se no lugar
dos mortos vivos pensarmos em imigrantes muçulmanos, não fica muito diferente o
cenário para os xenófobos, os que temem os estrangeiros em geral e os árabes em
particular, muito mais depois dos ataques terroristas que aconteceram na
França.
Há mesmo
uma paranoia crescente entre os que vivem com medo de homens bomba, os “zumbis”
atuais.
“A Noite
Devorou o Mundo” presta-se a esse tipo de reflexão. Mas também a leituras mais
psicológicas.
Assim, Sam
(Anders Danielsen, ator norueguês de “Oslo, 31 de agosto” de 2011, do genial
diretor Joaquim Trier) é um garoto que está bravo e triste porque levou um fora
da namorada. Quando ele volta na casa dela para pegar coisas dele ainda com ela
(o coração?), depara-se com uma festa dada pela ex e o atual dela. Fica ainda
mais raivoso, ignorado que é pelos outros convidados. E não aceita nem
conversar com a menina que o desprezou.
Nesse
estado de espírito, Sam vai se refugiar num quartinho dos fundos do apartamento
onde, cansado de tanta injustiça contra ele, dorme.
E, claro,
acorda num pesadelo.
Algo
aconteceu porque todos morreram e viraram zumbis. Se pensarmos na raiva
mortífera que o acompanhou naquele exílio voluntário no quartinho, foi ele
mesmo o causador do massacre. E agora, está à mercê dos devoradores de gente.
Dente por dente, olho por olho.
Quem era
Sam antes desse apocalipse? Não sabemos grande coisa. Gosta de música porque o
vemos com fones de ouvido e improvisando sons com copos, garrafas e coisas da
cozinha, qual um Phillip Glass sem talento.
Isso quando
não bate nos pratos e tambores da bateria que já foi de alguém. Nela descarrega
sua raiva e também chama os zumbis para caçoar deles. Ele é onipotente e reina
acima dos pobres mortos vivos que não conseguem atingi-lo.
Sam é um
solitário. Talvez tenha o perfil daqueles garotos americanos que voltam à
escola para matar.
O certo é
que ele prendeu um dos zumbis (Denis Lavant, ótimo), que queria come-lo, no
elevador. Toda noite senta-se a seu lado, ouve os grunhidos e, fora do alcance
daquelas garras, fuma charutos e faz confissões.
Há uma
garota que ele fere pensando que ela era um dos zumbis. A bela iraniana
Golshifteh Farahani semeia um início de culpa e luto em Sam e parece que isso o
liberta da prisão que ele habita.
Mas não
ficamos sabendo de muito mais.
“A Noite
Devorou o Mundo” é um filme de um jovem diretor estreante, Dominique Rocher,
bem realizado e baseado no romance de Martin Page (sob pseudônimo de Pit
Agarmen, em anagrama), com ideias originais e uma competente produção.
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