Direção: Paul Thomas Anderson
Sei que muita gente vai sair do cinema e dizer que não
gostou, que não entendeu nada. Bem, eu precisei ver duas vezes para entender o
que tem que ser entendido.
Basta ter paciência e pesquisar um
pouco.
Paul Thomas Anderson, ou PTA para os cinéfilos, tem 44
anos e é considerado um dos diretores mais criativos da cena atual. Bastaria citar “Magnólia”1999, “Sangue
Negro”2007 e “O Mestre”2012, para quem gosta de cinema saber de quem se
trata.
Só que “Vício Inerente” tem algo diferente. PTA adaptou
para o cinema um livro de um autor “cult” americano, que ninguém achava possível
colocar em imagens.
Thomas Pynchon, 77 anos, premiadíssimo, não dá
entrevistas, não tem foto atual e faz mistério sobre onde ele mora. Mas sabe-se
que ele viveu nos anos 60 e início dos 70, do século passado, numa praia da
California, onde adotou um estilo de vida “hippie”. Seu livro “Vício Inerente”
tem, portanto, a qualidade do vivido. E, como todos os livros do autor, é
escrito com uma estrutura complexa, com ligações e referências a muitos assuntos
diferentes e personagens que parecem saídos de uma viagem
lisérgica.
PTA, admirador de Pynchon, resolveu filmar o livro,
reservando-se o direito de colocar no roteiro aquilo que achou mais
relevante.
A ação se passa na California, Gordita Beach, início dos
anos 70, quando o modo “hippie” de ser estava saindo da moda, a guerra do
Vietnam matava garotos e o grupo de Charlie Mason assustava o sonho
americano.
O personagem principal é um detetive particular, Doc
Sportello (Joaquim Phoenix, doce e extraordinário), que fuma baseados o tempo
todo, “para clarear a mente”, explica.
Visitado por sua ex-namorada e sempre amada Shasta Fay
(Katherine Waterston, bela e sexy), fica sabendo que ela namora um grande
empresário do ramo imobiliário, Mickey Wolfmann (Eric Roberts). Ela pede ajuda a
Doc porque acha que a mulher de Wolfmann montou um esquema com seu amante, para
internar o marido e roubar todo o dinheiro dele.
A história principal é logo embaralhada com várias
outras, às vezes perdidas no meio do caminho, com personagens surreais. Assim,
desfilam na tela o policial “Big Foot” (Josh Brolin) que adora bananas cobertas
de chocolate, fazendo o durão mas que é frágil e inseguro como uma criança na
casa dele, os participantes da Fraternidade Ariana que tem negócios com os
Panteras Negras, a prostituta oriental Jade que comanda uma casa de massagens e
pede que Doc tome cuidado com o Canino de Ouro, algo que não se sabe o que é, o
advogado de Doc (Benicio Del Toro) que parece ser o único a entender o que
acontece, um casal que se droga muito (Jena Malone e Owen Wilson), a namorada de
Doc que trabalha na promotoria (Reese Whiterspoon), o priápico dr Rudy que
chefia um sindicato de dentistas que atende viciados em heroína, com dentes
corroídos. Só para citar alguns dos personagens.
A sensação de confusão invade nossa mente e ficamos meio
em transe, procurando entender aquilo que sempre nos escapa. Perdemos ou
esquecemos de algo importante? Essa é uma possível identificação do espectador
com um drogado como Doc, cuja mente não foca
em nada por muito tempo. Se nos deixarmos ir, acontece uma imersão num
universo alucinante, paranoico e delirante. É tudo verdade ou eu
sonhei?
A única coisa que permanece é o amor por Shasta que
nunca abandona Doc. O “vício inerente”, que é um termo que se usa em seguros
marítimos para indicar o que não se pode evitar. A voz suave e envolvente da
narradora, a cantora e harpista Joanna Newson, chama a atenção para essa ligação
forte e cármica.
Coragem. Enfrente esse filme difícil e empolgante e
troque um olhar verde e cúmplice com Joaquim Phoenix na cena
final.
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