Direção: Olivier Assayas
Quem já teve o privilégio de conhecer a cidadezinha de
Sils Maria, nos Alpes suiços, sabe o quanto ela é encantadora. Há um belo lago
brilhante e branco, de águas congeladas no inverno que, no verão, é azul e
cristalino. Como um espelho, reflete montanhas altíssimas, percorridas no
inverno pelos esquiadores. O cenário é de cartão
postal.
Foi alí que o autor teatral Wilhelm Merchior escolheu
viver e morrer. Seu corpo é encontrado nas alturas, onde a neve cobre as
montanhas.
Maria Enders (Juliette Binoche) e sua assistente
Valentine (Kristen Stewart) recebem a notícia dessa morte quando estão no trem,
a caminho de Zurique, onde Maria, amiga íntima e atriz famosa das peças do
dramaturgo, iria receber um prêmio em seu nome. Ele era recluso e avesso a
homenagens.
Há 20 anos atrás, Maria interpretara o papel da jovem
Sigrid na peça “A Serpente de Maloja” do autor, agora morto. O título se referia
a um fenômeno local de Sils Maria quando nuvens caminham como uma enorme
serpente sobre o lago, à procura dos vales mais baixos. Sinal de mau tempo para
os habitantes locais.
A peça tinha duas personagens, a que Maria interpretava,
Sigrid, jovem ambiciosa e cruel e a mais velha, Helena, que se suicida após ser
abandonada por Sigrid, a quem amava com uma dependência
doentia.
Maria, convidada agora para reviver não Sigrid mas
Helena, por um jovem diretor teatral, vai sofrer com a percepção ingrata de que
o tempo passou, que ela envelheceu, que agora é a mulher que vai ser abandonada.
Na vida real ela vive um divórcio. Ainda é bela mas o espelho mostra que a
juventude se foi. Ciumenta e invejosa do frescor da assistente, Maria mostra as
garras.
Valentine, com quem ela ensaia as falas da peça, na casa
do autor morto, torna-se Sigrid, não só porque repete as palavras da jovem
interpretada por Maria no passado mas porque começa a comportar-se com rebeldia
e crueldade. Contesta a percepção que Maria tem da jovem Sigrid, dizendo
claramente que isso já passou para ela, fechada agora em outro tempo, a meia
idade.
As duas mulheres passam a confundir vida real e ficção.
Em outras palavras, talvez a peça teatral começa a se encaixar nas pessoas que
elas realmente são?
Quando entra em cena Chloe Moretz, 19 anos, estrela de
Hollywood já famosa pelos escândalos e a vida livre que leva, objeto de todo
tipo de comentário na internet, Maria vai sentir por ela uma mistura de amor e
ódio. E vai aceitar a passagem do tempo como se aceita uma tempestade que desaba
sobre nós, sem aviso, terrível e fatal.
Juliette Binoche, sempre talentosa e carismática e
Kristen Stewart (a atriz da saga “Crepúsculo”), que mostra-se marcante no duelo
verbal entre as duas, são o espetáculo principal. “A Serpente de Maloja” encarna
nelas, trazendo mau tempo para aquele chalé na
montanha.
Olivier Assayas, 59 anos (“Depois de Maio” 2012,
“Carlos” 2010, “Horas de Verão” 2008), diretor e roteirista, discute em seu
filme a relação entre arte e vida real, juventude e maturidade, memória e
verdade, passado e presente.
Conclusão: o tempo nos faz prisioneiros. Cruel?
Realidade.
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