“Leviatã”- “Leviathan”,
Rússia,2014
Direção: Andrei
Zvyagintsev
O mar quebra suas ondas brancas no
rochedo negro. Carcaças de barcos, um cemitério de pequenas embarcações e restos
de um pier em escombros, refletem-se no espelho das
águas.
Uma paisagem morta. Casas humildes
espalham-se numa península.
No lusco-fusco de um dia que se finda,
um carro na poeira traz um amigo de Moscou para Kolya (Alexei Sobryakov), que
vive nessa região gelada com Lylia, sua bela mulher (Elena Lyadova, esplêndida)
e Roma (Sergey Pokhadaev), adolescente, filho do primeiro casamento dele, que
trata mal sua madrasta.
Os amigos se abraçam com força. O
advogado Dmitri (Vladimir Vdovitchenkov), bonitão e caloroso, veio ajudar no
processo em que o prefeito da cidade, Vadim (Roman Madyanov, ótimo), quer
expropriar as terras de Kolya, berço de seus
antepassados.
Com o retrato de Putin na parede e
bandeiras da Rússia no seu acanhado escritório, o prefeito se reune com seus
asseclas e planeja o bote. Aliado ao que de mais abjeto existe na cidade, com
apoio de cúmplices do governo, dará um outro destino à terra que Kolya
ama.
Mal sabe o russo louro e confiante, que
sua vida poderá também ser destruída.
O progresso parece trazer para os
russos mais do que televisões de plasma, celulares e carros blindados.
Corrupção, ética de bandidos, saques perpetrados por uma justiça vendida,
desfilam na tela.
Litros de vodca tentam anestesiar as
dores da alma russa doente e desviada de seu caminho. Nem a religião consola,
presa da mesma crise moral.
O menino chorando desolado na praia,
frente aos ossos do esqueleto de uma baleia, branqueados ao sol, parece apontar
para uma desesperança no futuro.
E, ao som da pungente sinfonia
“Akhnaten” de Philip Glass, uma civilização milenar vai se esfacelando.
O filme de Andrei Zvyagintsev ganhou o
prêmio de melhor roteiro em Cannes 2014. Na última Mostra Internacional de
Cinema de São Paulo levou o prêmio da crítica. E acaba de ser escolhido pela
imprensa estrangeira de Los Angeles como melhor filme estrangeiro na premiação
do Globo de Ouro.
O diretor chamou seu filme “Leviatã”. O
que nos remete à mitologia judaica, que dá esse nome a um monstro aquático que
seria o demônio representante do pecado da inveja. A inveja é um elemento
central do filme, que move à destruição daquele que tem o que eu também quero e
o odeio por isso.
E o nome do filme também parece
combinar com a acepção do cientista político Thomas Hobbes (1588-1679), que
chamou com esse nome um governo central autoritário, que seria necessário na
eterna luta de todos contra todos.
Mas quando as coisas chegam a esse
ponto, todos serão vítimas, mais dia, menos dia. É o alerta que o filme
propõe?
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