“Getúlio”, Brasil, 2013
Direção: João Jardim
Esse é um filme que fazia falta. No nosso país há fome
de coisas assim, que nos mostrem com sobriedade os personagens centrais de nossa
história.
Ele mesmo, Getúlio, na voz do ator magnífico que é Tony
Ramos, introduz a história que será contada com um monólogo no qual se
apresenta:
“- Eu fui um ditador. E não me
arrependo.”
Getúlio Vargas (!882-1954), ditador de 1930 a 1945,
voltou à presidência pelo voto do povo, em 1951.
Foi dele a criação do salário mínimo, das férias
remuneradas, das leis de proteção ao trabalhador e a aprovação do controle do
petróleo pelo Estado, a Petrobrás.
Era amado pelo povo e chamado “Pai dos
Pobres”.
O filme centra-se nos últimos dias do seu governo, em
agosto de1954, no Palácio do Catete, Rio de Janeiro.
O clima, já conturbado, piora com as acusações de Carlos
Lacerda (1914-1977), que usa a TV em seus inícios no Brasil, como plataforma
para as denúncias de corrupção e falta de moral no
governo.
O crime da rua Tonelero, como ficou conhecido, foi o nó
górdio dessa trama. Todos os adversários se valem do episódio para atacar o
presidente e seu chefe da guarda pessoal, Gregório Fortunato, apelidado de “anjo
negro” por Lacerda.
Quem foi o mandante? Essa é a pergunta que atravessa
todo o filme.
O estopim do trágico suicídio, tão falado e recordado
vivamente por quem tem mais de 60 anos, foi o assassinato do major da
Aeronáutica, Rubens Vaz. Ele conduzia o carro que levava Carlos Lacerda, o
inimigo público número um de Getúlio, para casa, na rua Tonelero em Copacabana.
Vinham de um comício da campanha de Lacerda para deputado
federal.
Mas o “Corvo”, como era chamado Lacerda pelos que não
gostavam dele, levou só um tiro no pé no atentado. E usou de uma oratória
articulada e demagógica para derrubar um governo populista, que tinha ainda mais
inimigos nas forças armadas do país.
É comovente a atuação de Tony Ramos, convincente como o
homem que vê tudo desmoronar à sua volta e, no auge da pressão, decepcionado
amargamente com familiares e aliados do seu governo, só se entrega morto, aos 72
anos, à sanha dos inimigos.
João Jardim, diretor, produtor e roteirista, soube
conduzir o drama, que se passa num cenário de verdade, palco dos acontecimentos
reais.
A fotografia de Walter Carvalho encontra tons e luzes
condizentes com os personagens e seus sentimentos e a música de Frederico Jusid
faz-se presente, em harmonia com o clima pesado, no Palácio de assoalhos de
madeiras preciosas, afrescos nos tetos, quadros ilustres, lustres de cristal e
escadarias, que trazem o espectador para a época e o lugar solene da tragédia.
Drica Moraes como a filha Alzira, devotada ao pai,
Alexandre Borges como Lacerda e Thiago Justino como Gregório Fortunato,
destacam-se num elenco impecável, vestidos a caráter.
A nota final fica com as cenas tiradas dos documentários
da época que mostram um mar de gente acompanhando o corpo de Getúlio até o
aeroporto, de onde seguiu para São Borja, sua morada
final.
O ano de1954 esboçou o que só iria acontecer em 1964,
dez anos depois, no governo do herdeiro de Getúlio, Jango Goulart, deposto por
um golpe militar.
“Saio da vida para entrar na História”, escreveu Getúlio
Vargas em sua carta-testamento, lida em seu enterro por João Goulart. Vá
conhecer melhor esse político brasileiro assistindo a “Getúlio”, um filme
excelente.
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