Direção: J.C. Chandor
A imagem de um mar azul, muito próximo, encontra-se com
o céu de azuis mais pálidos e ficamos sabendo que estamos a 1.700 milhas
náuticas de Sumatra, seja lá o que isso quer dizer.
Uma voz em “off”, que reconhecemos como a de Robert
Redford, diz:
“Sinto muito. Sei que isso significa pouco
agora.
Acho que todos vocês concordam que eu tentei ser
verdadeiro, ser forte, ser gentil, amável e correto. Mas não fui. E sei que
vocês sabem disso. Sinto muito.
Tudo aqui está perdido, exceto pela alma e pelo corpo.
Ou seja, o que resta deles.
E a ração de meio dia.
É imperdoável realmente. Sei disso agora. Como levei
tanto tempo para admitir que não tenho certeza?
Mas aconteceu. Lutei até o fim. Não tenho certeza de que
isso vale apena, mas saibam que eu fiz.
Vou sentir saudades. Sinto
muito.”
E lemos uma data: 13 de julho, 4:50
PM.
Outro letreiro indica que vamos voltar oito
dias.
Imediatamente nós nos perguntamos: mas quem é esse
homem? O que faz sózinho no mar, tão longe de casa? Por que sente muito? A quem
pede desculpas? De quem vai sentir saudades? O que
aconteceu?
Mas, ao mesmo tempo, sentimos que tudo isso não importa,
pois, de chofre, nosso homem acorda com um solavanco de seu veleiro. A água
invade a cabine. Ele já se movimenta e sobe ao convés.
Um “container” perdido chocou-se contra o barco,
perfurando seu casco.
Nosso homem toma providências.
Consegue livrar-se do “container” depois de muita luta e
manobra o barco para que o buraco saia do nivel da
água.
Empenha-se em consertá-lo, usando tela e
cola.
Percebe que a parte elétrica foi danificada. Usa bomba
manual para tirar a água do convés.
Dorme numa rede para ficar acima da água que bate na
cintura dele.
Acorda e sai com o que salvou da água. O diário de
bordo, mapas, uma caixa, o rádio, a bateria. Põe tudo para secar e trabalha
concentrado.
Maneja o rádio que faz alguns ruidos. Ouve vozes e pede
socorro: “Aqui Virginia Jean”. Mas em vão. O rádio está
mudo.
Assim ele também vai ficar. Mudo. Focado nas tarefas que
realiza para se manter vivo.
O rosto marcado por rugas e vincos que mostram a idade
(Robert Redford tem 77 anos), mas também a inteligência e a determinação no
olhar, acompanham um corpo forte, flexível, pronto para a
ação.
A câmara fica em cima dele o tempo todo. Ela também é
ágil e se movimenta rápida.
O espectador cria, inevitávelmente, uma ligação com esse
homem, sofre com ele, acompanhando tudo de ruim que acontece e respira fundo
quando ele se safa, até o momento em que não há mais possibilidades de luta pela
vida.
A fotografia belíssima de Frank G. DeMarco acompanha
nosso homem e sua luta para mostrá-lo em “close” a maior parte do tempo. Quando
o vê de cima, no bote, mostra a casquinha que ele é. E quando mergulha, para
mostrá-lo na água, vemos que há perigo.
O filme é uma fábula bem contada sobre o homem e sua
vontade de viver, de não entregar-se, de romper os próprios limites, de ir
além.
Mas chega um momento em que nos deparamos com o fim, com
a morte. Mesmo que ainda não seja o final e tivermos a sorte de sair dessa, não
adianta. De repente, algo nos convence de que a vida terá fatalmente um
fim.
E a aceitação disso é a chave para abrir novas portas,
até a derradeira.
O diretor e roteirista, J. C. Chandor, 40 anos, em seu
segundo longa ( o primeiro foi “Margin Call – O Dia Antes do Fim”2011), usando
um só ator, sem diálogos, nem monólogos, excetuando o inicial, com o barulho do
vento, do mar, a respiração do nosso homem, trovões, o rangido da madeira do
veleiro e o som do bote batendo na água, consegue envolver o espectador, que
experimenta como se fosse na própria pele, a fragilidade e o desamparo do homem,
mesmo o mais bem preparado, frente às forças da natureza
desencadeadas.
Pena que “Até o Fim” não foi lembrado no Oscar, apesar
da crítica de Nova York ter premiado Robert Redford.
Mas não importa. É um filme
inesquecível.
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