Direção: Matias
Bize
“É desconcertante rever
um grande amor”? Chico Buarque afirma isso na canção “Anos
Dourados”.
Eu diria que é muito
mais. Principalmente se o amor perdura.
“A Vida dos Peixes”
coloca um reencontro desses no centro do palco e, fazendo isso, adiciona outros
sentimentos mais profundos ao de ser apenas perturbador.
Quando André, que escreve
guias de turismo, volta à sua terra natal, o Chile, depois de dez anos na
Alemanha, ele não veio para ficar.
No aniversário de um
amigo, se despede dizendo:
“- Tenho que fazer as
malas... Vou amanhã, já é tarde.”
Os amigos brincam
comentando as bugingangas que ele leva na mala por causa de sua
profissão.
“- Viajo, me pagam bem. E
depois, turistas não querem nada de importante. É tudo sempre igual. Clichês. O
que fazer com a família, as crianças...”
André ganha tempo?
Certamente ele evita um assunto que paira no ar:
“-Você a
viu?”
“-
Não...”
“- Nós a convencemos a
dar um pulo aqui. Espere. Há quanto tempo não a vê?”
“-
Muito...”
Ele se despede dos
amigos, da dona da casa e, de repente, na sala escurecida e enfeitada por
lampejos de luzes coloridas, onde pessoas dançam, ele a vê. Dá passos para trás,
abalado.
Entra em um quarto, como
que fugindo e encontra uma velha amiga pondo o bebê para dormir. Conversam
banalidades mas o tema reaparece:
“- Quando vocês
terminaram, para mim foi muito incômodo. Não sabia o que fazer... Não queria
tomar partido. Então me afastei de vocês dois. Um dia fui tomar sorvete com Bea
e ela me falou de você.”
Ele corta e dirige a
conversa para outro rumo.
Mas não vai dar para
adiar aquilo que, fatalmente, vai acontecer. Lutando consigo mesmo, ele vai ao
encontro dela.
“A Vida dos Peixes” é um
filme raro. Com um roteiro brilhante, co-escrito pelo diretor de cinema chileno
de 34 anos, Matias Bize e atores que mergulham sem medo em uma água turva de
sentimentos contraditórios, coloca a nu, a alma dos personagens. Santiago
Cabrera e Blanca Lewin vivem na tela, com sinceridade, no espaço de algumas
horas, o que a maioria de nós só vive em pensamento.
E, por isso, nós na
plateia, perturbados, aflitos, emocionados, somos testemunhas de que reviver o
amor é um sentimento complexo. Atrai, na mesma proporção que
afasta.
Rever o grande amor faz
um convite perigoso para viver uma vida que não aconteceu e que, por isso, pode
parecer mais convidativa do que aquela que vivemos.
Somos como peixes em um
aquário presos na escolha de vida que fizemos?
Talvez... Certamente que
sim para a maioria de nós.
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