“Bacurau”- Brasil, 2019
Direção: Kleber Mendonça Filho e Juliano Meirelles
Tudo começa com uma imagem linda. A Terra azul vista lá de
cima com Gal cantando “Não Identificado”. A câmera vai descendo e vamos, num
caminhão de água para a cidadezinha no oeste de Pernambuco, Bacurau, nome de um
pássaro grande e bravo que só aparece à noite.
O letreiro avisa que tudo vai se passar daqui a alguns anos.
Estranhamos, com o caminhoneiro e a moça a seu lado, que na
estrada, um outro caminhão que leva como carga caixões de defunto, chama a atenção,
emborcado.
Passamos pelas ruínas de uma escola e logo chegamos à
cidadezinha de uma rua só, casas pobrinhas e ruas de terra.
A moça volta para casa porque morreu sua avó querida, dona
Carmelita, aos 94 anos. Vestida de branco ela jaz na cama, na casa acanhada
cheia de gente para o velório. Toda a cidade comparece ao enterro da anciã,
saudada pelo filho como a matriarca de uma família espalhada pelo mundo.
Só a dra Domingas (Sonia Braga) sobe numa cadeira, não para
louvar mas para insultar a morta. Depois ficamos sabendo que ela é um doce de
pessoa, menos quando bebe. Pediu desculpas publicamente.
O cortejo, com direito a carro de som, leva dona Carmelita
e, estranhamente, por duas vezes sai água cristalina de dentro do caixão. Mas
lenços brancos acenando marcam a despedida do povo à velha senhora. E a câmera
mostra o belo céu vermelho, depois cinza e azul.
Vamos conhecendo os habitantes de Bacurau, gente pobre,
sofrida mas que ainda sabe sorrir e cantar.
Outra coisa estranha é o “close”, que acontece algumas
vezes, da boca de alguém engolindo uma coisa que parece um comprimido ou pedaço
de algo amarelo.
Mas, mais estranho ainda é que parece que Bacurau
desapareceu do mapa. Como foi isso?
O filme vai levando o espectador a ver o que sofre o povo
nessa cidade. Falta de água, eletricidade, comida, remédios, vacinas. Tudo.
Quando chega o prefeito, em plena campanha para reeleição,
todo mundo desaparece e só se ouvem os insultos gritados pelo povo, atrás de
suas portas e janelas.
Tudo que o prefeito trouxe, ou quase tudo, tem o prazo de
validade vencido e o remédio gratuito de tarja preta é um veneno, avisa a dra
Domingas.
Tudo tem limite nessa vida, parece dizer o povo.
E quando a violência gratuita explode através de armas
“vintage” e invade a tela, levamos um susto.
“Bacurau” é uma fábula sobre a injustiça, a violência
gratuita gerando violência e a loucura de que o ser humano é capaz.
O que mais me arrepiou foi a tela de uma televisão mostrada
rapidamente, que anuncia “execuções públicas no Anhangabaú”. Será que vamos
retroceder a esse tipo de barbárie de norte a sul?
Temos todos que refletir sobre o que queremos para o nosso
Brasil. “Bacurau” ajuda nisso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário