“Os Maias – Cenas da Vida Romântica”, Portugal, Brasil,
2014
Direção: João Botelho
O século XIX, em Lisboa, é palco para uma encenação da
vida da elite portuguesa, contada por ninguém menos que um dos maiores
escritores da língua e interpretada com um toque de Manoel de Oliveira, o grande
cineasta centenário (1908-2015).
No início do filme, um homem lê e a câmara passeia por
cenários com móveis antigos, livros abertos, fotos de pessoas em preto e branco
(os atores), figurinos de época, cadernos manuscritos com desenhos, sedas,
rendas, bordados, cartas, fotos antigas, e um roteiro anotado. Tudo isso vai ser
usado pelo diretor e roteirista João Botelho para dar vida a personagens de uma
fração da sociedade portuguesa, para os quais o dinheiro não é obstáculo para
viver uma vida de dissipação, entre refeições copiosas e conversas de uns sobre
os outros, enquanto esperam a próxima ida a Paris.
Há, portanto, um olhar irônico e um comentário sem
palavras sobre os costumes da época onde confirma-se a derrocada de Portugal,
não mais dona de colônias e riquezas usurpadas.
A família Maia é acompanhada por três gerações e,
através do que acontece com eles, vamos ter um retrato do que se passa no
país.
Em 1825, um Maia casa-se, depois de um exílio na
Inglaterra, sem mesada nem benção do pai, que descobriu que o filho era maçom e
defendia liberdades e rebeldia contra os poderes estabelecidos. Mas sua mulher
morre e o filho Pedro, em 1847, quer casar-se com uma senhora que o pai
desaprova, Madame de Monforte.
O casal foge para Paris e primogênito Carlos Eduardo recebe o nome dos
Maia.
Durante um sarau onde casais rodopiam ao som do piano,
Pedro fica sabendo que vai ter mais um filho. Mas logo a tragédia se abate sobre
ele porque a mulher foge com um príncipe italiano. Naquela noite, mata-se com um
tiro. O patriarca, Afonso da Maia, parte desolado com o neto, de sua casa
Ramalhete, em Lisboa, para sua quinta no Douro.
Até então o filme de João Botelho, 66 anos, era em preto
e branco. Ganha agora cores pálidas e a terra portuguesa, seus rios e matas,
casarios e ruas de Lisboa, perdem a realidade e tornam-se pinturas esboçadas de
um cenário onde se movimentam os atores.
Essa perda de vitalidade faz parte do projeto do diretor
de mostrar a decadência, a falta de brilho, o provincianismo daquela
gente.
Não por acaso, Carlos Eduardo da Maia (Graciano Dias),
médico da alta sociedade de Lisboa, entretido em casos de amor descartáveis,
apaixona-se por uma brasileira (Maria Flor) que não se sabe bem de onde surgiu.
Mas é bela, e rica, cercada de criados, sua filha tem governante inglesa e viaja
com mais de vinte malas . E é casada.
O sub-título do filme também é irônico já que os atores,
quase todos homens, mais falam das mulheres entre si do que qualquer outra
coisa. A exceção é a paixão de Carlos Eduardo e Maria Eduarda.
A introdução de um narrador que lê passagens do livro de
Eça de Queirós (Paulo Betti), enriquece o filme de João Botelho, que usa
diálogos e linguajar do livro.
Para alguns pode parecer teatral, tedioso e longo. Para
outros, interessante e distante da visão romântica e estetizante da minissérie
de Luiz Fernando de Carvalho de 2001. Uma produção que merece ser
vista.
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