Direção: Petra Costa e Lea Glob
Foi perturbador para Petra Costa, 32 anos, atriz e
diretora de cinema, constatar que nem na literatura, nem no cinema, havia
material psicológico importante sobre o tema que ela queria trabalhar em seu
segundo filme, a gravidez. Compreendeu que, assim como o suicídio, abordado em
seu primeiro documentário, o belo “Elena”, havia um tabu no tema da maternidade.
Sempre que se falava nela, evitava-se tocar no que se passava na cabeça de uma
mulher grávida. Nada sobre dúvidas, nem problemas, nem
medos.
Ora, a gravidez coloca sempre em jogo a soberania da
mulher sobre seu próprio corpo. Era disso que Petra Costa queria
tratar.
Convidada para fazer parte de um projeto dinamarquês,
que une em duplas diretores do país com estrangeiros, ela foi escolhida para
fazer parceria com Lea Glob, que havia filmado um curta sobre o suicídio do pai.
O tema era comum às duas e Petra sempre admirou o cinema
dinamarquês.
Outro desejo das diretoras era trazer o teatro para o
cinema. Daí a escolha da atriz Olívia Corsini do Théatre du Soleil, conhecida
companhia francesa, com quem Petra nutria laços desde muito
tempo.
Nesse momento inicial, a ideia era fazer algo como o que
acontece no livro de Virginia Wolf, “Mrs Dalloway”, que conta o dia na vida de
uma mulher. Enquanto ela faz coisas triviais, o passado e o futuro a invadem.
Mas, quando Olivia contou que estava grávida, chamaram
seu companheiro Serge Nicolai e o projeto transformou-se numa já antiga vontade
de Petra de falar sobre maternidade. Foram meses de filmagem sobre a atriz que
tem que ficar presa em casa porque sua gravidez corre risco. E, desolada, vê o
companheiro continuar com o projeto que era dos dois, a encenação da peça “A
Gaivota” de Tchekhov, em Nova York e Montreal.
Realidade e ficção misturam-se frente aos nossos
olhos.
Em closes reveladores, a câmara vasculha a mente de
Olivia, que traduz em seu rosto e olhos expressivos, o que se passa com ela.
Dúvidas e medos sobre o futuro, a carreira, o momento
presente:
“- Não sei ao que me
agarrar...”
E quando fala, muitas vezes grita suas angústias em
francês e italiano com o companheiro:
“- Tenho um “alien” crescendo dentro de
mim...”
“- Você está sensível demais”, diz Serge que é carinhoso
com Olivia mas toca sua vida.
O filme é uma mistura muito íntima entre os atores, que
vivem sua própria relação e o resto da equipe de filmagem que se intromete entre
o casal. Há momentos em que ouvimos em “off” a voz da diretora, questionando a
cena filmada e pedindo para que os atores repitam o que fizeram, de outra
maneira.
“O Olmo e a Gaivota”, vencedor do prêmio de melhor
documentário do Festival do Rio 2015, não é um documentário realista. É um olhar
denso e questionador sobre a vivência da maternidade.
“Olmo e a Gaivota” é, no dizer de Petra Costa, “a luta
entre as raízes e a liberdade”. O medo de não mais voar, está presente em
Olivia, que sente que o bebê realiza uma grande mudança nela e ela se pergunta
se vai perder asas ou transformar-se numa nova combinação, quase impossível, de
voo e raízes.
Excelente.
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