“Uma Viagem Extraordinária”- “The Young and Prodigious
T.S. Spivet”, França, Austrália, Canadá, 2013
Direção: Jean-Pierre Jeunet
Aparentemente, este é um filme para crianças ou
adolescentes. Ou para adultos com espírito juvenil, já que as aventuras
mostradas são as de um garoto antiquado.
Nada disso. “Uma Viagem Extraordinária” é o oposto do
que parece ser. E, para entender o filme dessa maneira, precisamos prestar
atenção em quem é o narrador. O menino prodígio T.S. Spivet, 10 anos, vive um
drama que se passa em cenários internos, em sua alma.
A família dele vive numa fazendinha no oeste dos Estados
Unidos, mostrado por ele num mapa enorme.
Ilustrações infantis e outras inscrições que parecem
complicadas vão aparecer ao longo do filme, como um charme a mais, muito bonitas
no 3D.
Mas, a primeira coisa que ficamos sabendo, é que ele tem
um irmão, Layton, gêmeo não idêntico.
Estranhamente, vemos uma cena onde T.S. faz uma
apresentação de uma luta marcial, com a espada, num cenário
vermelho.
“- Infelizmente, eu sabia que nunca seria um
guerreiro...” comenta ele.
E vamos entender que o comentário tem a ver com o irmão,
que é o preferido do pai, sempre com uma espingarda a
tiracolo.
“- Ele atirava em tudo que se
mexia...”
E tememos pela vida do gato na mira da espingarda, já
sabendo quem é o guerreiro a que aludiu T.S.
O pai (Callum Keith Renie), alvo dos ciúmes de T.S., é
descrito assim:
“- Meu pai nasceu com 100 anos de atraso. Tinha a alma
de um cowboy.”
Seu escritório é uma sala de troféus, com bichos
empalhados, que assustam o nosso herói.
A mãe (Helena Bonham Carter, atriz fabulosa), dra Clair,
é uma excêntrica e suave especialista em insetos, completamente diferente do
pai.
“- Como meus pais se apaixonaram é um
mistério...”
E, de supetão, introduz o assunto
principal:
“- Layton morreu no ano passado num acidente dentro do
galpão. Ninguém nunca fala disso. Eu estava
presente...”
E, a história da viagem que ele conta durante o filme,
para ganhar um prêmio no Smithsonian Institute em Wahington, parece sair da
imaginação de uma criança que quer chamar desesperadamente a atenção, da maneira
mais complicada.
Não é à toa que, contando sobre ele e Layton serem
gêmeos, ele diz:
“- Fui eu que fiquei com os
neurônios.”
Já que o irmão ficara com toda a valentia e com o
pai.
E o tal acidente, que faz crescer um clima depressivo na
fazendinha, mostrada em cores de cinemascope, é
ponto central do problema de T.S. Spivet.
Sentindo-se culpado desde sempre pelos desejos proibidos
de eliminar o irmão e ter pai e mãe só para ele, o menino encarna todas as
crianças do mundo, vivendo a rivalidade fraterna.
E com que graça e beleza o diretor Jean-Pierre Jeunet, e
co-autor do roteiro, inspirado no livro de Reif Larsen “O Mundo Explicado por
T.S. Spivet”, conta essa história na tela. Ficamos encantados com o “Leonardo da
Vinci de Montana”. O ator Kyle Catlett atua como gente
grande.
E nós, na plateia, certamente vamos relembrar algumas
das lutas fratricidas que vivemos. Mas, sem drama, apenas com um sorriso
nostálgico. E esperando que elas desapareçam com a
idade.
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