“O Segredo das Águas”- “Still The Water”, Japão,
2014
38ª Mostra Internacional de Cinema de São
Paulo
Direção: Naomi Kawase
Quem fala de vida, fala de
morte.
E é com delicadeza que a diretora e roteirista Naomi
Kawase, 45 anos, filma a morte de uma cabrinha branca. A princípio, a cena
assusta, porque não estamos mais acostumados com ela. Mas depois, abrindo os
olhos com cautela, percebemos que o velho de barba e cabelos brancos fez aquilo
com o maior cuidado e precisão. Ele acaricia a pele cor de neve. Não há maldade
em seu gesto mas necessidade e respeito.
Naquela ilha, o mar de ondas enormes e belíssimas,
lembra o Japão dos furacões, tufões e tsunamis. A natureza alí pode ficar
bravia. Mas é o homem que maltrata a natureza e mata com
crueldade.
Como morreu aquele ser humano que aparece boiando na
praia, costas tatuadas?
Kyoko (Jun Yoshinaga), uma adolescente que está de
uniforme de colégio, observa o afogado, junto a outros,
silenciosos.
“- Deve ter sido um acidente”, diz alguém. “Aqui na ilha
não acontecem crimes.”
A mãe de Kyoko (Miyuki Matsuda) está morrendo e ela está
apaixonada por Kaito (Niijiri Murakami), um colega da escola com quem percorre a
ilha de garupa na bicicleta dele.
Amor e morte.O ciclo da vida se transmite da mulher-mãe
para a filha que poderá ser mãe e assim por diante.
O filme “O Segredo das Águas”, rodado na ilha de Amami,
sul do Japão, é um filme que fala sobre o xamanismo. A avó da diretora era uma
xamã, um ser entre os deuses e os homens, ligado à natureza e seus mistérios.
Foi ela que cuidou de Naomi e o filme a homenageia.
A mãe de Kyoko é uma xamã e sua morte é natural e
comovente. Cercada por habitantes da ilha, eles cantam e tocam músicas para
ajudá-la a morrer feliz. E assim, consolam-se com a certeza de que a morte faz
parte da vida e está destinada a todos os seres vivos.
Já o primeiro amor, é, por vezes, difícil de viver. Há
medos e contradições no coração dos jovens.
Principalmente nos que não aceitam em si e nos outros, os desígnios da
natureza.
Kaito está preso à mãe pelos laços primitivos de um
Édipo que não permite que ele viva sua própria vida.
E como são lindas as cenas aquáticas, com Kyoko e Kaito
mergulhando de mãos dadas no mar transparente.
A diretora japonesa concebe seu filme de maneira a nos
conduzir a pensar que fazemos parte intrínseca da natureza, nossa mãe e que só
em comunhão com ela seremos completos.
Um filme simples e poético.
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