38ª Mostra Internacional de Cinema de São
Paulo
Direção: Olivier Assayas
Quem já teve o privilégio de conhecer a cidadezinha de
Sils Maria, nos Alpes suiços, sabe o quanto ela é encantadora. Seja com o belo
lago brilhante de águas congeladas no inverno, seja no verão, com águas azuis e
cristalinas, rodeado de montanhas altíssimas, percorridas no inverno pelos
esquiadores, o cenário é de cartão postal.
Foi alí que o autor teatral Wilhelm Merchior escolheu
viver e morrer. Seu corpo é encontrado nas alturas, onde a neve cobre as
montanhas.
Maria Enders (Juliette Binoche) e sua assistente
Valentine (Kristen Stewart) recebem a notícia dessa morte quando estão no trem,
a caminho de Zurique, onde Maria, amiga íntima e atriz famosa das peças do
dramaturgo, iria receber um prêmio em seu nome. Ele era recluso e avesso a
homenagens.
Há 20 anos atrás, Maria interpretara o papel da jovem
Sigrid na peça “A Serpente de Maloja” do autor, agora morto. O título se referia
a um fenômeno local de Sils Maria quando nuvens caminham como uma enorme
serpente sobre o lago, à procura dos vales mais baixos. Sinal de mau tempo para
os habitantes locais.
A peça tinha duas personagens, a de Maria, a jovem
ambiciosa e cruel e a mais velha, Helena, que se suicida após ser abandonada por
Sigrid, a quem amava com uma dependência doentia.
Maria, convidada agora para reviver não Sigrid mas
Helena, por um jovem diretor teatral, vai sofrer com a percepção ingrata de que
o tempo passou, que ela envelheceu, que agora é a mulher que vai ser abandonada.
Na vida real ela vive um divórcio. Ainda é bela mas o espelho mostra que a
juventude se foi. Ciumenta e invejosa do frescor da assistente, Maria mostra as
garras.
Valentine, com quem ela ensaia as falas da peça, na casa
do autor morto, torna-se Sigrid, não só porque repete as palavras da jovem
interpretada por Maria no passado mas porque começa a comportar-se com rebeldia
e crueldade. Contesta a percepção que Maria tem da jovem Sigrid, dizendo
claramente que isso já passou para ela, fechada agora em outro tempo, a meia
idade.
As duas mulheres passam a confundir vida real e ficção.
Em outras palavras, talvez a peça teatral começa a se encaixar nas pessoas que
elas realmente são?
Quando entra em cena Chloe Moretz, 19 anos, estrela de
Hollywood já famosa pelos escândalos e a vida livre que leva, objeto de todo
tipo de comentário na internet, Maria vai sentir por ela uma mistura de amor e
ódio. E vai aceitar a passagem do tempo como se aceita uma tempestade que desaba
sobre nós, sem aviso, terrível e fatal.
Juliette Binoche, sempre talentosa e carismática e
Kristen Stewart (a atriz da saga “Crepúsculo”), que mostra-se marcante no duelo
verbal entre as duas, são o espetáculo principal. “A Serpente de Maloja” encarna
nelas.
Olivier Assayas, 59 anos (“Depois de Maio” 2012,
“Carlos” 2010, “Horas de Verão” 2008), diretor e roteirista, discute em seu
filme a relação entre arte e vida real, juventude e maturidade, memória e
verdade, passado e presente.
Conclusão: o tempo nos faz prisioneiros. Cruel?
Realidade.
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