“Ninfomaníaca – Vol.1”- “Nynphomaniac – Vol.1”,
Dinamarca/França/Inglaterra
Direção: Lars Von Trier
O que será aquele lugar molhado, de pedras úmidas, beco
escuro e amedrontador? Aparece depois de uma tela negra e ruídos
indistintos...
Lars Von Trier parece dar o tom de seu novo filme em
seus minutos iniciais. Está falando por metáforas no sexo feminino. Por outro
lado, claramente o “O” do título do filme lembra uma vagina. E o livro e o filme
“Histoire d’O”, que fala sobre masoquismo.
A mulher que jaz ensanguentada naquele chão, quase
fundida em suas pedras, será resgatada por um homem mais velho que entende que
aquela não é uma situação nem de hospital, nem de
polícia.
“- O que você quer?” pergunta a
ela.
“- Uma xícara de chá com leite quente” responde a
moça.
“- Então é melhor vir comigo.”
E ele a acolhe, troca suas roupas molhadas, e a põe na
cama. Ela está maltratada e melancólica.
Ele senta-se ao lado dela e
escuta:
“- É tudo culpa minha. Sou um ser humano
ruim.”
E, a partir daí, Joe (Charlotte Gainsburg, atriz
predileta do diretor) vai narrar a Seligman (Stellan Skarsgard, ator sueco de 62
anos) sua história ou parte dela, porque o filme vai ter uma continuação
prometida para breve.
“Ninfomaníaca – Vol.1” faz parte de uma trilogia que
começou com “Anticristo”2009 e “Melancholia”2011, filmes que tem em comum o tema
depressão. E, consequentemente, raiva e culpa como
assunto.
Nem sempre a sexualidade é vivida facilmente. Para
algumas pessoas, devido a certas configurações de vida, o sexo é penoso ou usado
como solução para lidar com dificuldades.
Joe, na infância, é uma menina como as outras. Descobre
sua vagina e seu clitóris, através da exploração que já, desde bebês, fazemos em
nossos próprios corpos. E o prazer é despertado. Seguem-se brincadeiras de todo
tipo nas quais o órgão sexual é estimulado, seja com cordas, bichinhos de
pelúcia, balanços e até mesmo com o chão molhado do banheiro, onde Joe e sua
amiguinha escorregam de bruços.
A mãe dela é vista como cruel, autoritária e maldosa.
Uma bruxa. O pai, médico e sonhador, muito carinhoso, é adorado. Tudo que vem
dele é bom e prazeiroso. Seus passeios na floresta são idílicos. Estamos diante
do famoso complexo de Édipo exaltado. Ataques mortais e inconscientes à mãe e a
certeza de ter roubado o pai, levam as meninas a experiências de amadurecimento
ou não. Certas garotas são como Joe. Fica tudo muito difícil.
E a atriz Stacy Martin (que faz Joe adolescente)
apática, pede para um rapazinho bruto, Jerôme (Shia LaBeou), que tire sua
virgindade, aos 15 anos.
Isso feito, com sua amiga B., vão competir para ver quem
é a mais poderosa e consegue seduzir mas homens em
trens.
Mas, na escalada sexual de Joe, ela só tem para contar
maçantes histórias de repetição da mesma coisa, sem qualquer solução para o seu
problema. Continua angustiada e insatisfeita. Ela não percebe que faz o que faz
por culpa, visando sua auto-destruição.
Seligman, cujo nome traduz-se por Feliz, escuta a
narrativa e vai contrapondo outros estados de mente ao de Joe. Leva-a a pescar
com vara e anzol arremessado na corrente
de um rio, lembra que os números podem traduzir surpresas inesperadas e que a
música já foi alvo de perseguição e proibição na Idade
Média.
Ele atua com uma espécie de psicanalista estimulando Joe
a sonhar, libertar-se do pesadelo, abrir sua mente a outros pontos de vista,
visando a desprendê-la de suas amarras a um sexo viciado, a um estado de alma
agarrado à matéria, buscando sensibilidade no lugar
errado.
Há até uma piscadela de Von Trier a “De Olhos Bem
Fechados”1998, de Stanley Kubrick, através do uso da valsa de Shostakovsky,
tocada muitas vezes naquele filme e lembrando que a curiosidade sexual existe
sempre no ser humano e pode levar a caminho escuros.
E não podemos esquecer de citar Uma Thurman, que faz uma
ponta tragicômica e rouba a cena.
Vamos entender melhor a culpa de Joe e os castigos a que
ela se submete de boa vontade no volume 2 de
“Ninfomaníaca”?
Espero que sim. Lars Von Trier é um diretor de cinema
inteligente e sensível e um personagem às vezes difícil mas sempre
criativo.
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