“Bastardos”- “Les Salauds” França,
2013
Direção: Claire Denis
Enigmático desde o início, o filme nos leva a pensar e
perguntar sobre o que significam aquelas imagens iniciais. Quem é o homem
atormentado que olha a chuva cair? Onde ele está? Num
escritório?
É noite e a chuva é torrencial.
A cena a seguir, com a ambulância e um corpo envolvido
em algo claro, que mal se vê, não responde a nada. Mas intriga ainda
mais.
E na próxima, aquela jovem mulher com um corpo perfeito,
nua, anda de salto alto pela rua, com seu rosto belo numa expressão de confusão.
O que aconteceu? Está drogada?
A câmera faz “close” em um pé de sapato com salto alto e
um envelope.
Na delegacia, a mulher do suicida lê a carta que o
marido deixou:
“- Está aberta! Me revolta vocês terem lido essa
carta... Meu marido processou esse porco! A culpa da morte de Jacques é dele!
Sózinha não vou ter forças... Não tenho mais ninguém além do meu irmão, que está
sempre no estrangeiro...”
“- A carta foi endereçada a ele...” diz a
policial.
“- Foi ele que me apresentou a Jacques anos
atrás...”
“- Pense na sua filha. Por ela é que você vai lutar”,
responde a policial, encorajando a mulher arrasada.
Vincent Lindon faz esse irmão, Marco Silvestri, que
trabalha num petroleiro e vem a Paris para ajudar a irmã Sandra (Julie Bataille)
e a sobrinha Justine (Lola Créton), internada em uma clínica
psiquiátrica.
Chiara Mastroianni, linda e triste, é Raphaelle e mora
no mesmo prédio em que Lindon vai ficar, um apartamento praticamente vazio. O
que ele procura ali? Ela é casada ou amante de Édouard Laporte (Michel Subor) a
quem a irmã de Marco acusa de ser o responsável pelo suicídio do
marido.
Marco procura pistas e se envolve com a personagem de
Chiara, mãe do pequeno Joseph, filho de Edouard, homem muito mais velho que
Raphaelle. Esta criança sofre perigo? Uma cena curta, que mostra a bicicleta
abandonada numa floresta e o horror da mãe apontam para o
futuro?
Claire Denis, a diretora de 65 anos, trabalha sempre com
mistério e enigmas em seus filmes (“Noites sem Dormir”1994, “Minha Terra
África”2008, “35 Doses de Rum”2008).
Em “Les Salauds” traduzido como “Bastardos” em
português, perdeu-se o sentido pesado de “canalhas” que o roteiro da diretora e
Jean-Pol Fargeaud quer passar.
“- Era preciso que o filme fosse violento”, diz Claire
Denis. E acrescenta:
“- A gente costuma achar que as crianças estão
protegidas em uma família, o que é uma mentira. Eles não estão protegidos em
lugar nenhum.”
O filme “Bastardos” segue uma linha contemporânea de
denúncia de abuso sexual doméstico com crianças e adolescentes. Na Mostra de São
Paulo, o contundente “Miss Violence” do grego Alexandro Avranas, trata do mesmo
assunto.
Existem muitos canalhas por aí. Vitimizando mulheres e
crianças.
Claire Denis denuncia esse aberrante estado de coisas
nesse seu último filme, que causou desconforto na plateia do Festival de Cannes
desse ano, onde estreou e agora aflige aqui, as pessoas que vão ver o filme, que
passa em apenas uma sala em São Paulo.
“- O filme fala de uma violência de vida, que conduz à
morte”, declara a diretora.
Não é cinema diversão. É denúncia de misérias
humanas.
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