Direção: Fernando Meirelles
Ao ouvir no telefone que o nome da pessoa que queria comprar
uma passagem aérea era Jorge Bergoglio, a atendente pergunta:
“- Como o Papa? ”
A voz masculina murmura algo e quando é questionado sobre o
endereço e responde meio sem jeito, “Cidade do Vaticano ”, a atendente irritada
desliga na cara dele, certa de que era uma brincadeira de um desocupado.
Ninguém imaginaria que um Papa faria reservas em seu próprio
nome. Mas o Papa Francisco não aceita as regras estipuladas e costuma fazer
tudo do seu jeito.
O filme volta no tempo a 2005 e o vemos num bairro pobre de
Buenos Aires falando para o povo numa linguagem simples e ajudando a preparar
refeições para uma festa popular.
É então que ele fica sabendo que o Papa João Paulo II
morreu. O cardeal Bergoglio tem que ir para Roma e participar do conclave que
vai eleger o próximo Papa.
Da simplicidade colorida da periferia de Buenos Aires,
passamos para a majestade do Vaticano. Mármores preciosos e afrescos
magníficos, vestes de seda e veludo, correntes de ouro e chapéus vermelhos.
A praça está repleta para ver passar o esquife do Papa
polonês sendo levado para a cripta da Basílica de São Pedro, depois de um pontificado
de 26 anos.
Quando começa o conclave, as imagens são belas e tudo é
organizado nos mínimos detalhes. O povo na praça espera o sinal da fumaça. A
cada votação, os votos incinerados soltam fumaça negra enquanto não é
conseguida a maioria necessária para a eleição do novo Papa, que é a mensagem
da fumaça branca. “Habemus Papam”.
O cardeal alemão Joseph Ratzinger, agora Bento XVI, assoma
ao balcão e saúda o povo. Bergoglio suspira aliviado. Fora o segundo colocado
mas nas conversas entre os cardeais, dizia sempre que não queria ser Papa.
Na volta a Buenos Aires ele reassume suas funções e cada vez
mais é visto como um homem de grande simpatia, que sabe falar com o povo, que
entende como são os problemas que vivemos e que acredita que a Igreja deve estar
presente não só no campo religioso, mas na vida das pessoas e proteger os mais
pobres e frágeis.
Decidido a aposentar-se mais cedo, antes dos 75 anos
exigidos, escreve ao Papa. Precisa da anuência papal. Mas como não recebe
resposta, compra uma passagem para Roma. Estranhamente, ele recebe uma carta
pedindo que venha a um encontro com Bento XVI.
Tudo isso é fato real. E o encontro dos dois também
aconteceu. Mas o que falaram, ninguém ouviu.
Anthony McCarten (“A Hora Mais Escura”, “Bohemian
Rhapsody”), que escreveu o roteiro e Fernando Meirelles, diretor (“Cidade de
Deus”), conseguiram criar conversações que combinam com o que sabemos sobre os
dois. São o ponto alto do filme porque através delas ficamos conhecendo as
posições que os separam. Um é muito diferente do outro.
Bergoglio convencido que nada é estático e confessando que
suas opiniões sobre a vida e a Igreja mudaram com o passar dos anos. Bento XVI
austero, intelectual, conservador, diz que não gosta de nada do que o outro diz
e faz. Mas não assina a aposentadoria que o outro tanto quer.
Uma frase do Papa Bento XVI é interessante e talvez explique
o encontro imaginado por ele:
“- Dizem que o novo Papa vem para consertar os erros do
anterior...”
E Bento XVI vivendo um período extremamente difícil, com
acusações sérias que talvez o envolvam, aos 85 anos, diz que vai renunciar ao
cargo de sucessor de São Pedro, para grande espanto e horror de Bergoglio.
Os dois atores estão fantásticos. Anthony Hopkins sempre
convence nos papéis que representa. Mas é incrível como seu olhar se parece com
o de Bento XVI. Já Jonathan Pryce tem aparecido pouco na tela. Aqui ele está
assustadoramente perfeito. Emociona. E nunca é demais naquilo que aponta para
Bento XVI. Convincente e oportuno.
Confissões de atos que pedem perdão e misericórdia vão
acontecer ente os dois e ensinar que ninguém é perfeito, que todos somos
humanos e sujeitos a erros.
Esta é a grande mensagem do filme de Meirelles. Os
diferentes podem e devem se entender pelo bem maior.
“Dois Papas” recebeu quatro indicações para o Globo de Ouro:
melhor filme (drama), melhor ator Jonathan Pryce (drama), melhor ator
coadjuvante Anthony Hopkins, melhor roteiro Anthony McCarten.
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