segunda-feira, 10 de julho de 2017

O Estranho que Nós Amamos


“O Estranho que Nós Amamos”- “The Beguiled”, Estados Unidos, 2016
Direção: Sofia Coppola

A metáfora sobre o feminino da cena inicial mostra uma menina cantando e atravessando uma floresta de grandes árvores à procura de cogumelos. Ela é cuidadosa e sabe onde encontra-los. Mas, de repente, qual Chapeuzinho Vermelho, ela encara um soldado ianque, inimigo, ferido e precisando de ajuda.
Sem pensar no lobo e querendo fazer o bem, a menina (Oona Laurence) leva o homem para dentro do internato onde ela e suas quatro coleguinhas adolescentes (Elle Fanning, a mais velha e sexy, Emma Howard, Angourice Rice e Addison Rieche) moram com a professora de francês Edwina (Kirsten Dunst, maravilhosa) e a dona da escola (Nicole Kidman, perfeita).
Estamos em 1864 e a guerra civil americana, que opõe norte e sul, está chegando ao fim.
O soldado ferido, o irlandês cabo John McBorney (Colin Farrell, sedutor como nunca), é cuidado por Miss Martha, cristã devota e dona da casa. Encarado com severidade no início, já que era um desertor confesso e poderia ser perigoso, passa a ser o foco da atenção de todas as mulheres da casa.
Das gavetas saem broches e brincos, os vestidos mais bonitos são usados e os cabelos com tranças e fitas, cuidadosamente penteados. Uma a uma, elas procuram desculpas para visitar o soldado na sala de música em que Miss Martha o mantém trancado.
A sensualidade invade aquela casa.
“The Beguiled” é o título do livro de Thomas Cullinam de 1966, que foi filmado em 1971 por Don Siegel com Clint Eastwood no papel do soldado. Para alguns, o filme de Sofia Coppola é uma refilmagem.
Mas a diretora e roteirista não concorda. Ela diz que seu filme lança um novo olhar sobre a história do livro, sob um ponto de vista feminino, não feminista:
“...quis explorar aquela história sombria de tensão de forças e de poderes sob uma ótica feminina, buscando entender o lugar da mulher naquela América em guerra.”
O filme de Sofia Coppola passa-se num universo feminino, à parte daquela guerra da qual se ouvem as explosões longínquas. Esse mundo é invadido por um homem sedutor e enganador, que ilude a inocência e a fragilidade das meninas, enquanto estimula a rivalidade muda entre Martha e Edwina.
O casarão colonial que guarda vestígios da opulência do passado vai ser o cenário para envolvimentos perigosos e decisões difíceis.
Pode-se dizer que o poder feminino desafiado mostra sua força. E com uma pitada de humor negro.
Sofia Coppola, a diretora de sucessos como “As Virgens Suicidas”, “Encontros e Desencontros”, “Marie Antoinette”, já ganhou muitos prêmios, inclusive o Leão de Ouro de Veneza por “Um Lugar Qualquer”. Mas, ser considerada a melhor diretora de Cannes desse ano, é uma vitória. Em 70 anos do festival, só uma mulher havia sido honrada com esse prêmio: Jane Campion por “O Piano” de 1993.
O visual de “O Estranho que Nós Amamos”, de tons  esmaecidos, luz natural e velas, exibe o talento de Philippe Le Sourd na fotografia. A produção de arte se esmera nos pequenos detalhes e a quase ausência de trilha sonora faz o filme ganhar tons originais, com os sons da casa, o canto dos pássaros e os insetos do jardim.
“O Estranho que Nós Amamos” é um filme elegante e sóbrio. Um novo triunfo para Sofia Coppola.


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