“O Estranho
que Nós Amamos”- “The Beguiled”, Estados Unidos, 2016
Direção:
Sofia Coppola
A metáfora
sobre o feminino da cena inicial mostra uma menina cantando e atravessando uma
floresta de grandes árvores à procura de cogumelos. Ela é cuidadosa e sabe onde
encontra-los. Mas, de repente, qual Chapeuzinho Vermelho, ela encara um soldado
ianque, inimigo, ferido e precisando de ajuda.
Sem pensar
no lobo e querendo fazer o bem, a menina (Oona Laurence) leva o homem para
dentro do internato onde ela e suas quatro coleguinhas adolescentes (Elle
Fanning, a mais velha e sexy, Emma Howard, Angourice Rice e Addison Rieche)
moram com a professora de francês Edwina (Kirsten Dunst, maravilhosa) e a dona
da escola (Nicole Kidman, perfeita).
Estamos em
1864 e a guerra civil americana, que opõe norte e sul, está chegando ao fim.
O soldado
ferido, o irlandês cabo John McBorney (Colin Farrell, sedutor como nunca), é
cuidado por Miss Martha, cristã devota e dona da casa. Encarado com severidade
no início, já que era um desertor confesso e poderia ser perigoso, passa a ser
o foco da atenção de todas as mulheres da casa.
Das gavetas
saem broches e brincos, os vestidos mais bonitos são usados e os cabelos com
tranças e fitas, cuidadosamente penteados. Uma a uma, elas procuram desculpas
para visitar o soldado na sala de música em que Miss Martha o mantém trancado.
A sensualidade
invade aquela casa.
“The
Beguiled” é o título do livro de Thomas Cullinam de 1966, que foi filmado em
1971 por Don Siegel com Clint Eastwood no papel do soldado. Para alguns, o
filme de Sofia Coppola é uma refilmagem.
Mas a
diretora e roteirista não concorda. Ela diz que seu filme lança um novo olhar
sobre a história do livro, sob um ponto de vista feminino, não feminista:
“...quis
explorar aquela história sombria de tensão de forças e de poderes sob uma ótica
feminina, buscando entender o lugar da mulher naquela América em guerra.”
O filme de
Sofia Coppola passa-se num universo feminino, à parte daquela guerra da qual se
ouvem as explosões longínquas. Esse mundo é invadido por um homem sedutor e
enganador, que ilude a inocência e a fragilidade das meninas, enquanto estimula
a rivalidade muda entre Martha e Edwina.
O casarão
colonial que guarda vestígios da opulência do passado vai ser o cenário para
envolvimentos perigosos e decisões difíceis.
Pode-se
dizer que o poder feminino desafiado mostra sua força. E com uma pitada de
humor negro.
Sofia
Coppola, a diretora de sucessos como “As Virgens Suicidas”, “Encontros e
Desencontros”, “Marie Antoinette”, já ganhou muitos prêmios, inclusive o Leão
de Ouro de Veneza por “Um Lugar Qualquer”. Mas, ser considerada a melhor
diretora de Cannes desse ano, é uma vitória. Em 70 anos do festival, só uma
mulher havia sido honrada com esse prêmio: Jane Campion por “O Piano” de 1993.
O visual de
“O Estranho que Nós Amamos”, de tons esmaecidos, luz natural e velas, exibe
o talento de Philippe Le Sourd na fotografia. A produção de arte se esmera nos
pequenos detalhes e a quase ausência de trilha sonora faz o filme ganhar tons
originais, com os sons da casa, o canto dos pássaros e os insetos do jardim.
“O Estranho
que Nós Amamos” é um filme elegante e sóbrio. Um novo triunfo para Sofia
Coppola.
Nenhum comentário:
Postar um comentário