Elle”- Idem, França, Alemanha, 2016
Direção: Paul Verhoeven
A realidade não pode ser objetiva. É sempre subjetiva.
Depende de tudo que somos nós. Mas, normalmente, sabemos o que é real e o que é
imaginário.
Porém, em algumas pessoas, a fantasia extrapola a mente
e se espalha pelos sentidos, fabricando alucinações.
Assim pensando, talvez possamos entender melhor a
personagem da atriz extraordinária e sempre nova que é Isabelle Huppert em
“Elle”, o novo filme do diretor holandês de 77 anos, Paul Verhoeven do famoso
“Instinto Selvagem” de 1992.
Michèlle Leblanc é a personagem que vive sua história na
tela. Presente e passado. E com ela, o que foi, será sempre o mesmo ou, pelo
menos, o velho disfarçado de novo, fonte obsessiva de dor e prazer. Porque é lá,
em seu passado que Michèlle ainda está e, por isso, quase todos os seus atos tem
a ver com aquele pai que ela odeia. E ódio é sempre amor pelo
avesso.
Aparentemente fria e sabendo o que quer da vida, ela
comanda uma empresa que cria jogos, videogames violentos. Sua sócia Anna (Anne
Consigny) é amiga antiga e o marido Robert (Christian Berkel), também trabalha
lá e é mais íntimo de Michèlle do que se pensa.
O ex-marido Richard (Charles Berling) ainda é alvo de
ciúmes de Michèlle, controladora e manipuladora. Assim ela é também na empresa
que dirige. Temida e cobiçada, ela dirige os empregados, quase todos homens, com
mão firme. Logo vão começar a surgir elementos explícitos de violência contra a
patroa.
E um mundo cruel, de assassinatos, sangue e terror, está
impresso numa foto antiga, que aparece na TV que fala de um assassino famoso. A
“Ashgirl”, como a chamam, “Garota das Cinzas”. Ela nos olha em primeiro plano
seminua, ensanguentada, na frente de uma fogueira, onde ardem objetos de uma
casa. É a pequena Michèlle que também odeia a mãe.
Personalidade dividida, o que Michèlle aparenta ser, é
muito diferente do que ela pode ser.
E quando a fantasia se mistura com a realidade, ela se
masturba enquanto observa o vizinho atraente (Laurent Lafitte) com binóculos. E
já não serão apenas alucinações ou fantasias que darão prazer a Michèlle pois
agora há um parceiro real envolvido. Ela quer mais.
A primeira cena do filme, pela atitude do gato que a
olha placidamente, é talvez a chave desse jogo que Paul Verhoeven administra na
tela. De propósito, o diretor tenta nos envolver na trama de um estupro, que é
dominação e prazer, levantando dúvidas no espectador. Gritos ou
gemidos?
Michèlle é fruto de tudo que viu e vivenciou, com aquilo
que nasceu com ela. E assim somos todos nós. Uns com mais sorte, outros marcados
pelo sinal de Caim.
O suspense bem construído e original do holandês Paul
Verhoeven é um filme intrigante e exemplar. Quem não tem algo de Michèlle em si
mesmo?
Baseado no livro “Oh...”, 2012, de Phillippe Djian,
“Elle” é o indicado da França para o Oscar 2017.
Vai dar o que falar.
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