“Big Jato”, Brasil, 2015
Direção: Claudio Assis
Uma estranha imagem inicia o filme: um garoto
tenta tirar, de dentro de sua boca, um peixe de pedra. E uma voz de adulto em
“off” comenta:
“- Aquele peixe que nunca ia sair de dentro de
mim e que era a coisa mais próxima da felicidade que eu conhecia...”
Nessa cena inicial há toda uma condensação da
história do menino Xico (Rafael Nicácio), nascido em Peixe de Pedra, uma
cidadezinha no sertão nordestino, que tinha sido mar há bilhões de anos
atrás.
Vamos ver o que formou seu caráter e o que o
ajudou a fugir de um destino de fossilização, de vida seca, destituída da seiva
que a alimenta.
De óculos, olhos grandes e com muitas
perguntas, Xico sobe na boleia do caminhão de seu pai, Velho Francisco, que
ganha a vida limpando fossas. “Big Jato” é o nome do caminhão azul, antiquado,
cujo motor nem sempre quer pegar. Tem escrito na traseira: Quem não reage,
rasteja.
“- A curva é que dá sentido ao caminho na
estrada. A reta nada diz da caminhada”, diz o Velho para Xico.
E na conversa, recheada de alusões ao serviço
de limpeza que ele faz, o Velho vai soltando sua sabedoria poética para o
filho.
Mas, quando chega em casa é dengoso só com a
filha e exigente com a mulher (Marcela Cartaxo, sempre maravilhosa) e com os
filhos homens, George e David, nomes que são pronunciados com sotaque americano.
Já Xico, o companheiro nas limpezas de
excrementos, quer ser poeta, para horror do pai:
“- Concentre na matemática!”
O irmão gêmeo de Velho, tio Nelson (ambos
interpretados por Matheus Nachtergaele, ator prodigioso), é dono de um programa
na Rádio Ororubá. Irônico, dono da verdade, cheio de charme e inimigo do
trabalho, é outra inspiração para o sobrinho Xico.
E, em matéria de amor romântico, o menino se
instrui com Príncipe (Jards Macalé), um personagem estranho e marginal, com quem
passeia nos trilhos do trem.
Apesar do pai machista leva-lo para o bordel,
para perder sua virgindade com uma índia, Xico não consegue esquecer Ana Paula,
menina recém chegada na cidade, que ainda por cima está noiva. É um
romântico.
“- O verdadeiro sertanejo é aquele que se vai!”
diz com ênfase o tio Nelson, que vive embriagado assim como o pai de
Xico.
E o sobrinho sonha em seguir esse
conselho.
“Big Jato” é o primeiro roteiro adaptado que o
pernambucano Claudio de Assis filma. Saiu do livro de Xico Sá, transposto para a
tela por Anna Carolina Francisco e Hilton Lacerda.
No Festival de Brasília, em 2015, ganhou o
prêmio de melhor filme, ator (Matheus Nachtergaele), atriz (Marcela Cartaxo),
roteiro e trilha sonora (DJ Dolores).
“Big Jato” é irreverente, rude e doce. Passa
para o público o ponto de vista do menino que quer ser poeta e que ainda não
descobriu o mundo. Mas que está louco para fazer isso!