“Tudo Vai Ficar Bem”- “Everything Will Be Fine”,
Alemanha, Canadá, França, Suécia, Noruega, 2015
Direção: Wim Wenders
Quanto tempo dura o luto quando alguém se envolve, sem
querer, num acidente e mata uma pessoa?
Não é uma situação banal. Como também não é fácil dizer
quando “Tudo Vai Ficar Bem”, que é o título do filme do consagrado diretor
alemão Wim Wenders.
Provavelmente isso vai depender da saúde mental da
pessoa, das cicatrizes que o trauma deixou, das circunstâncias que envolveram o
acidente e o quanto a pessoa se sente culpada. E uma das complicações disso é
saber que a culpa pode ser alimentada por fontes
inconscientes.
Responder a essa pergunta foi o que quis fazer Wim
Wenders nesse seu último filme, rodado no Canadá.
Tudo começa porque o escritor de uns quase 40 anos,
Tomas Eldan (James Franco) está sofrendo de um bloqueio criativo. Não consegue
levar adiante seu livro, nem na cabana isolada e rústica onde se enfiou, no meio
do rio gelado, à procura de inspiração.
Sua relação com Sara (Rachel McAdams) também não vai
bem. Tinham discutido à noite pelo telefone. Toca o telefone de manhã e ela quer
que ele venha para casa. Ele parece reticente.
Guiando pela estradinha com a neve caindo, ele parece
preocupado e distraído. O limpador de para-brisa não funciona direito. Liga o
rádio, acende o cigarro, olha para ver quem o chama no celular. É Sara. Não
atende. Abre um pouco a janela e joga o cigarro fora.
Nisso, vemos um trenó de criança atravessar a frente do
carro em velocidade. Um baque.
Tomas para e sai do carro
devagar.
Um menino pequeno está sentado no chão. Atordoado mas
não parece ferido. Tomas vê uma casa próxima e deduz que é a casa do menino que
está mudo. Toca seu celular. Ele põe a criança nos ombros e puxa o
trenó.
“- Eu ia mesmo ligar pra você. Mas é que aconteceu uma
coisa... Não... Tudo vai ficar bem. Você está certa. Te vejo no
jantar.”
Desliga e diz para o menino sobre seus
ombros:
“- Tudo vai ficar bem. Foi você que fez o boneco de
neve? Sozinho?”
Bate na porta e aparece uma moça (Charlotte Gainsbourg)
que deve ser a mãe do menino:
“- Tivemos um pequeno acidente mas tudo vai ficar bem.
Acho que ele ficou um pouco assustado...”
“- Nicholas? Onde está?” pergunta ela assustada. E sai
correndo ladeira abaixo até o carro. Ele segue atrás e ouve seu grito de
desespero.
Num pequeno espaço de tempo, desde o acidente até aqui,
Tomas falou três vezes “tudo vai ficar bem”, como uma espécie de refrão para
sossegar a namorada dele, o menino, a mãe e principalmente ele mesmo.
Mas quando é que “tudo vai ficar
bem”?
Vai demorar. No filme passam-se 10 anos. E só depois de
acontecer muita coisa é que parece que tudo vai ficar bem. Claro que há ironia
nesse título.
Aos 70 anos, bacharel em medicina, filosofia e artes,
Wim Wenders tem muito a dizer e o faz à sua maneira em sua extensa filmografia:
“Paris, Texas”1984, “Asas do Desejo”1987, “O Céu de Lisboa” com Manoel de
Oliveira em 1994, “Buena Vista Social Club”1999, “Pina” 2011, em 3D, “O Sal da
Terra”2014, para citar poucos.
Usou o 3D para filmar “Tudo Vai Ficar Bem” mas as cópias
que estão nos cinemas brasileiros são 2D.
Em entrevistas que deu no Festival de Berlim 2015, o
diretor explicou que o roteiro, do jovem norueguês Bjorn Olaf Johannesson,
chamou sua atenção porque o escritor Tomas incorpora sua tragédia pessoal à sua
escrita. Sua arte o ajuda a aproximar-se de algo que quer esquecer porque é
muito terrível a morte daquela criança. Há um lado terapêutico em escrever o
livro “Inverno”.
A música orquestrada do maestro Alexandre Desplat é
ouvida com parcimônia. Às vezes só notas num piano ou um lamento de
violinos.
“Tudo Vai Ficar Bem” é um filme intimista, que usa como
título uma frase dita para consolar e evitar o silêncio preenchido pela pergunta
“será que tudo vai ficar bem?”
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