terça-feira, 15 de março de 2016

Tudo Vai Ficar Bem


“Tudo Vai Ficar Bem”- “Everything Will Be Fine”, Alemanha, Canadá, França, Suécia, Noruega, 2015
Direção: Wim Wenders

Quanto tempo dura o luto quando alguém se envolve, sem querer, num acidente e mata uma pessoa?
Não é uma situação banal. Como também não é fácil dizer quando “Tudo Vai Ficar Bem”, que é o título do filme do consagrado diretor alemão Wim Wenders.
Provavelmente isso vai depender da saúde mental da pessoa, das cicatrizes que o trauma deixou, das circunstâncias que envolveram o acidente e o quanto a pessoa se sente culpada. E uma das complicações disso é saber que a culpa pode ser alimentada por fontes inconscientes.
Responder a essa pergunta foi o que quis fazer Wim Wenders nesse seu último filme, rodado no Canadá.
Tudo começa porque o escritor de uns quase 40 anos, Tomas Eldan (James Franco) está sofrendo de um bloqueio criativo. Não consegue levar adiante seu livro, nem na cabana isolada e rústica onde se enfiou, no meio do rio gelado, à procura de inspiração.
Sua relação com Sara (Rachel McAdams) também não vai bem. Tinham discutido à noite pelo telefone. Toca o telefone de manhã e ela quer que ele venha para casa. Ele parece reticente.
Guiando pela estradinha com a neve caindo, ele parece preocupado e distraído. O limpador de para-brisa não funciona direito. Liga o rádio, acende o cigarro, olha para ver quem o chama no celular. É Sara. Não atende. Abre um pouco a janela e joga o cigarro fora.
Nisso, vemos um trenó de criança atravessar a frente do carro em velocidade. Um baque.
Tomas para e sai do carro devagar.
Um menino pequeno está sentado no chão. Atordoado mas não parece ferido. Tomas vê uma casa próxima e deduz que é a casa do menino que está mudo. Toca seu celular. Ele põe a criança nos ombros e puxa o trenó.
“- Eu ia mesmo ligar pra você. Mas é que aconteceu uma coisa... Não... Tudo vai ficar bem. Você está certa. Te vejo no jantar.”
Desliga e diz para o menino sobre seus ombros:
“- Tudo vai ficar bem. Foi você que fez o boneco de neve? Sozinho?”
Bate na porta e aparece uma moça (Charlotte Gainsbourg) que deve ser a mãe do menino:
“- Tivemos um pequeno acidente mas tudo vai ficar bem. Acho que ele ficou um pouco assustado...”
“- Nicholas? Onde está?” pergunta ela assustada. E sai correndo ladeira abaixo até o carro. Ele segue atrás e ouve seu grito de desespero.
Num pequeno espaço de tempo, desde o acidente até aqui, Tomas falou três vezes “tudo vai ficar bem”, como uma espécie de refrão para sossegar a namorada dele, o menino, a mãe e principalmente ele mesmo.
Mas quando é que “tudo vai ficar bem”?
Vai demorar. No filme passam-se 10 anos. E só depois de acontecer muita coisa é que parece que tudo vai ficar bem. Claro que há ironia nesse título.
Aos 70 anos, bacharel em medicina, filosofia e artes, Wim Wenders tem muito a dizer e o faz à sua maneira em sua extensa filmografia: “Paris, Texas”1984, “Asas do Desejo”1987, “O Céu de Lisboa” com Manoel de Oliveira em 1994, “Buena Vista Social Club”1999, “Pina” 2011, em 3D, “O Sal da Terra”2014, para citar poucos.
Usou o 3D para filmar “Tudo Vai Ficar Bem” mas as cópias que estão nos cinemas brasileiros são 2D.
Em entrevistas que deu no Festival de Berlim 2015, o diretor explicou que o roteiro, do jovem norueguês Bjorn Olaf Johannesson, chamou sua atenção porque o escritor Tomas incorpora sua tragédia pessoal à sua escrita. Sua arte o ajuda a aproximar-se de algo que quer esquecer porque é muito terrível a morte daquela criança. Há um lado terapêutico em escrever o livro “Inverno”.
A música orquestrada do maestro Alexandre Desplat é ouvida com parcimônia. Às vezes só notas num piano ou um lamento de violinos.

“Tudo Vai Ficar Bem” é um filme intimista, que usa como título uma frase dita para consolar e evitar o silêncio preenchido pela pergunta “será que tudo vai ficar bem?”

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