Direção: Cédric Anger
Vamos conhecer um dos casos criminais mais estranhos já
acontecidos na França, avisa um letreiro antes do filme começar. Estamos em
Oise, região próxima de Paris, no inverno de 1978.
Um homem, do qual não vemos a cabeça, fecha o zíper de
uma jaqueta azul. Ouvimos uma música soturna com primazia para os
violoncelos.
Na rua deserta, duas garotas em mobiletes. Uma se
adianta. Ele escolhe a retardatária e a segue com o carro, muito perto. Ela olha
para trás apreensiva e ele a empurra para a calçada com uma manobra do carro.
Ela cai. Os violinos soam lancinantes.
“- Você é louco?”grita ela e volta para a
mobilete.
Ele dá meia volta e, quando chega bem perto, atropela a
garota de propósito. O sangue escorre pelo para-brisas. Aponta a arma para a
mocinha caída e vai atirar, quando um carro aparece e ele
foge.
Larga o carro roubado mais adiante mas, antes, trabalha
com fios e há algo escondido dentro, sob uma manta.
Na manhã seguinte, bem cedo, um homem emerge de uma
tenda montada sobre a cama de campanha e veste-se com um uniforme. É um membro
da Guarda Nacional, encarregado de proteger a
população.
Com os colegas numa viatura, procuram o carro usado pelo
atirador que assusta a região. O atropelamento
daquela garota da mobilete não é o primeiro crime dele.
Quando encontram o carro suspeito, um deles força a
porta e uma bomba incendiária explode.
Ficamos atônitos. O guarda é o assassino que procuram. E
que, por ironia, investiga os crimes que ele mesmo cometeu. E mais, é respeitado
pelo chefe, que confia em Franck Neuhart, que está acima de qualquer suspeita.
Mas é um monstro.
Em sua intimidade, práticas bizarras: flagelação com um
ramo de árvore, banhos gelados de banheira, tortura o próprio braço com um arame
farpado e com o irmão menor faz treinos de tiro no bosque vizinho à casa dos
pais. Correm com pedras nas botas. O garoto parece estranhar tudo isso mas seu
irmão não admite contestação:
“- Por que as pedras?”pergunta ao
irmão.
“- Por causa da culpa. Sempre temos culpas para
pagar.”
Arrogante, confessa seus crimes em cartas anônimas, que
ouve o chefe ler em voz alta:
“Sou um matador, preciso matar. Garotas de 19 anos
vagando provocantes por aí à noite, são as minhas preferidas...Na próxima vez,
acerto no coração e não nas pernas.”
Impassível, vai interrogar no hospital a garota da
mobilete, que escapou com vida mas que não consegue falar, de tão machucada. Não
passa pela cabeça de ninguém que a vítima e o carrasco estão frente a
frente.
É admirável a interpretação de Guillaume Canet, 42 anos,
nesse filme sóbrio, dirigido e roteirizado por Cédric Anger, baseado em fatos
reais e num livro de Yvan Stefanovitch. Frio, sem sinal de medo num rosto sem
rugas, Canet incorpora o espírito do “serial killer”. Ele mesmo não sabe por que
mata as garotas mas tem ideias grandiosas e alucinadas sobre estar castigando a
humanidade hipócrita e cruel: “Vou matar à esmo até ser morto também”, pensa ele
na floresta, dormindo debaixo de um céu estrelado.
Sophie (Ana Girardot), a bela garota que trabalha na
casa dele, não o conhece e pensa que ele é gentil.
Mas sexo para Franck é uma coisa perigosa. Quando se excita, tem que matar.
A sexualidade
dele está emaranhada com agressividade, culpa e castigo, de tal forma, que ele
sufoca com a excitação e precisa agir. Depois vomita mas não se livra nunca daquilo que nasceu
com ele.
Este é um filme que sonda mistérios insolúveis da mente
humana.
Impressionante.
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