Direção: Aki Kaurismaki
É tão bom ver um filme que
nos devolve a palavra “humanidade” num sentido caloroso. Sabemos o quanto
podemos ser cruéis, principalmente com os mais fracos e isso também aparece
aqui mas o tom é menos de pessimismo ou otimismo exagerados e mais de mostrar uma
realidade possível, quando há boa vontade.
A Finlândia é um país
distante da Europa mais próxima de nós. Faz muito frio e as pessoas não sorriem
com facilidade.
Nem se abraçam com
intimidade. E isso pode nos levar a pensar que não existe empatia e muito menos
bom coração por lá.
Mas as aparências enganam. É
o contrário desses preconceitos que vamos ver no novo filme de Aki Kaurismaki,
60 anos, roteirista, produtor e cineasta finlandês. Seu filme mais premiado foi
“Um Homem sem Passado” de 2002 que ganhou o Grande Prêmio do Júri em Cannes e
foi indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro. O filme em questão, “O Outro
Lado da Esperança” levou o Urso de Prata do Festival de Berlim desse ano.
O tema da imigração de gente
que foge da guerra, da fome, da política e perseguição, procurando chegar na
Europa, é bem atual. O artista chinês Ai WeiWei mostra em seu belo documentário
de 2017, que ganhou o Leão de Ouro em Veneza, “Human Flow – Não Existe Lar se
Não Há Para Onde Ir”, que a situação dos refugiados é trágica.
Dentro desse tema, Aki
Kaurismaki conta uma história que entrelaça pessoas que se cruzam por acaso.
Khaled Hussein (Shervan Haji) foge de sua cidade natal Aleppo, Síria, depois
que um míssil de origem desconhecida (podendo ser de qualquer um desses que se
enfrentam por lá ou seja, tropas do governo da Síria, rebeldes, Estados Unidos,
Rússia, Hezbolah ou Estado Islâmico) destruiu sua casa e matou pai, mãe, irmão
caçula, tio, tia e filhos deles, que almoçavam em família.
Salvos ele e a irmã, porque
Khaled estava voltando do trabalho e a irmã na fila do pão, fogem da Síria e
chegam à Grécia de barco. Depois de uma caminhada longa atravessando a
Macedônia e a Sérvia, alcançam a fronteira da Hungria. Um tumulto separa Khaled
da irmã e ele vai preso. Surrado, é solto 4 dias depois.
Desesperado, por mais que
procure pelos campos de refugiados na Hungria, Áustria, Eslovênia e Alemanha,
não encontra sua irmã.
Em Gdansk, Polônia, é
perseguido por neo-nazistas e consegue esconder-se em um navio. Um marinheiro o
protege e assim, por puro acaso, ele chega à Finlândia, destino do navio.
Enquanto isso, na Finlândia,
o comerciante Waldemar Wikstrom (Sakani Kuosmanem), cinquentão, separa-se de
sua mulher alcoólatra, vende seu estoque de camisas e muda de ramo. Compra um
restaurante que, ele não sabe, onde mais se bebe do que se come, herdando de
quebra três funcionários com salários atrasados e uma cadelinha, a clandestina
refugiada no restaurante.
Dois mundos tão distantes, o
de Khaled e o de Wikstrom, aproximam-se porque os dois tem coisas em comum.
Ambos procuram seu lugar no mundo porque perderam o que tinham.
Mais que isso, a
solidariedade do finlandês encontrou um motivo para manifestar-se e aquele
restaurante torna-se um lugar onde todos procuram acertar. O percurso é bem
humorado e as cenas mais divertidas acontecem ali.
A música é uma constante e no
filme desfilam roqueiros dos anos 70 cantando baladas em todos os lugares por
onde passa Khaled.
Os diálogos são curtos, não
há sorrisos fáceis mas existe calor humano e empatia com o sofrimento alheio.
“O Outro Lado da Esperança” é
uma fábula sobre a procura de um lugar de paz, de um lar onde se possa viver
sem maiores sobressaltos, longe do ódio e perto do calor humano. Um sonho cada
vez mais impossível para muitos.
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