sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Elis


“Elis”- Brasil, 2015
Direção: Hugo Prata

Acho que todos os que viveram a época que o filme “Elis” retrata, dos anos 60 a começo dos anos 80, lembram-se bem da primeira vez que ouviram a voz de Elis Regina.
Eu estava fazendo a lição do colégio e ouvindo o programa “Pick-Up do Picapau”no rádio:
“- Menina, você vai ser a maior cantora do Brasil!”, vaticinou ele, que tocava no seu programa à tarde o que de melhor havia na música brasileira.
Elis (1945-1982), veio do sul, Porto Alegre, e chegou ao Rio com seu pai, no dia depois do golpe militar de 1964. Com o dinheiro contado, ganho em shows desde os 13 anos de idade, aquela menina viera ao Rio tentar a sorte e mostrar a voz que tinha.
E o filme dirigido por Hugo Prata conta a trajetória dela, desde o Beco das Garrafas, passando pela TV, maridos e filhos, alegrias e tristezas, até o final, aos 36 anos de idade, misturando muita cocaína com álcool.
Como não se emocionar com a recriação do festival da TV Excelsior em 1965 quando ela cantou “Arrastão”de Vinicius de Moraes e Edu Lobo?
Quem era jovem não perdia o “Fino da Bossa”, comandado por ela e Jair Rodrigues. A gesticulação com os braços, o sorriso grande e aquela voz que ninguém esquece.
Depois, veio o casamento com Ronaldo Bôscoli em 1967, o primeiro filho, shows em Paris e o sucesso.
Há quem ache o filme superficial e o acusam de não ir fundo nos conflitos que ela viveu. Pode ser mas quem viveu o tempo dela não estranha o filme, ao contrário, se emociona lembrando dela e de nós mesmos naquela época.
Andreia Horta, que vive a personagem, o faz com tal talento, que a impressão é ver Elis rediviva. Dubla com perfeição e não imita o mito, traz Elis de novo para nossos olhos e ouvidos.
Há uma reconstituição de época primorosa e o elenco que traz à frente Lucio Mauro Filho como Miéle e Gustavo Machado como o “Velho”, apelido de Ronaldo Bôscoli, é excelente.
Com o segundo marido, César Camargo Mariano (Caco Ciocler) que durou de 1972 a 1981, há momentos de grande beleza e descobertas musicais que fazem juntos e que são de grande qualidade cênica e muito bem exploradas pela câmara, como na cena perto dos rostos dos dois no piano.
Lenny Dale (Julio Andrade) não dança mas convence na figura daquele que ensinou Elis a mexer o corpo e criar sua marca registrada, o movimento dos braços. É ele que ela visita na prisão da ditadura, que a envolveu num dos piores momentos da vida dela e que levou a vaias durante shows e a pecha de colaborar com os militares.
O repertório escolhido traz quase todos os sucessos dela, a começar por “Como nossos pais”que Andreia Horta dubla em silhueta, à inesquecível interpretação de “Atrás da Porta”de Chico Buarque e “O Bêbado e o Equilibrista”de João Bosco e Aldir Blanc que virou um hino contra a ditadura militar.
Certamente aquela que muitos consideram a maior cantora do Brasil merece outros filmes, porque há muito o que contar sobre ela e o Brasil onde ela viveu.
Mas esse “Elis”de Hugo Prata já é um bom começo.

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