“Animais Noturnos”- “Nocturnal Animals”,
Estados Unidos, 2016
Direção: Tom Ford
A abertura é chocante. Exóticas mulheres gordas
rebolam nuas em câmara lenta, num palco com cortinas vermelhas. Rostos de
deboche, bandeirinhas americanas e fogos de artifício nas mãos. Elas são como
que líderes de torcida de um jogo bizarro.
Depois, numa galeria de arte, convidados bebem
e conversam, enquanto as gordas, deitadas em plataformas brancas, continuam seu
show.
Susan, a dona da galeria (Amy Adams), bela e
fria, volta para sua casa contemporânea no alto da colina de Los Angeles,
cercada de obras que expõem. Vemos Damien Hirst, Robert Motherwell, artistas de
primeira linha que, como as gordas, também ironizam a cultura americana. Jeff
Koons trona no jardim da casa com seu cachorrinho gigante prateado.
Ela tem um olhar vazio, triste,
desencantado.
Um pacote a espera. Ela tenta abrir e corta o
dedo. Sangue. É o livro do ex-marido, dedicado a ela:
“Você me inspirou. Queria que fosse a primeira
a ler. Edward”.
Ficamos sabendo em “flashbacks” que não se veem
há mais de 15 anos. E que foi Susan quem rompeu o casamento, acusando-o de ser
muito sensível e romântico. O que a encantara no começo do romance, foi depois o
motivo para desprezá-lo. Ela desiste de ser artista plástica para casar-se com
um rico bonitão e tornar-se dona de uma galeria de arte.
Mas, assim como as finanças do casal, o
casamento atual não vai bem. Susan pergunta ao marido (Armie Hammer):
“- Por que você não foi na galeria ontem? E por
que não dormiu em casa?”
Desculpas esfarrapadas. Distância entre eles.
Ele diz que precisa ir a Nova York a trabalho. Quem acredita?
Num jantar naquela noite, o homem ao lado dela
a felicita pelo vernissage:
“- Um lixo total...” responde ela.
“- Querida, você é um grande sucesso. Talvez um
pouco insegura. O mundo da arte é absurdo. Mas menos doloroso que o mundo de
verdade”.
E, à noite, insone e sozinha, Susan abre o
livro e começa a ler a história de Tony (Jake Gyllenhall). O título faz com que
ela se lembre de como Edward (também Jake Gyllenhall) a chamava por causa da
insônia: “Animais Noturnos”.
A partir desse momento vamos ver três
narrativas encenadas: a história do livro, a vida atual de Susan e o passado,
quando casou com Edward. Culpa, arrependimento e vingança são temas em
comum.
Assim como todos nós, Susan vai imaginando as
personagens do livro e fazendo paralelos com as pessoas de sua vida.
Na história do livro, Tony passa por uma
experiência terrível que envolve sua família e uma gangue liderada por um
bonitão cruel (Aaron Taylor-Johnson). Um detetive (Michael Shannon) vai ajudar Tony numa
vingança.
Na vida real, Susan aprende que o tempo é
inflexível e que o passado não pode ser refeito.
Tom Ford, que dirigiu seu primeiro longa em
2009, o elogiado “Direito de Amar - A Single Man”, produziu, dirigiu e escreveu
o roteiro de “Animais Noturnos”, adaptado de um livro de 1993, escrito por
Austin Wright, “Tony e Susan”.
Nesse seu segundo longa, o mundo dos muito
ricos de Los Angeles e o mundo marginal e cruel do Texas são vistos por uma
óptica estética e irônica. São cenários naturais para Tom Ford. Ele nasceu no
Texas e Los Angeles é uma cidade da moda, da arte e do cinema, que ele conhece
tão bem.
E seus personagens são tratados com rigor.
Sempre atraentes, ninguém escapa. Vivos ou mortos, recebem o que merecem mas
sempre com um visual impecável.
Muito bom. Ganhou o Grande Prêmio do Júri no Festival de Veneza 2016.
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