Direção: Alberto Rodriguez
Lindas imagens de Hector Garrido ilustram os créditos
iniciais. Parecem quadros abstratos, com verdes, azuis, cinzas e tons terrosos.
Só aos poucos, percebemos que as imagens são do solo, tomadas de muito alto.
Vamos nos aproximando e bandos de pássaros voam, cruzando os ares, barcos estão
nos braços do rio, que nos seus meandros recorta as ilhas e se parece com um
cérebro ou intestino humanos agigantados.
Esse olhar que vai do longe para o perto é um dos
movimentos que vamos ver nessa história policial, acontecida na Espanha, numa
região distante das grandes cidades, onde ainda reina a tradição espanhola de
uma cultura conservadora e machista, com regras não escritas que sempre
favorecem os poderosos.
Não podemos nos esquecer que o franquismo imperou na
Espanha de 1939 a 1976, com o Generalíssimo Francisco Franco governando com
punho de ferro. E a Espanha das aldeias é ainda franquista quando o filme
começa, em 20 de setembro de 1980, apesar do ditador ter morrido há já cinco
anos.
Uma dupla de policiais chega à pequena vila andaluz onde
desapareceram duas jovens irmãs, de 15 e 17 anos.
Quando perguntam sobre elas, ficam sabendo que gostam de
se divertir mas que sempre voltam para casa. Mas, dessa vez, não foi isso que
aconteceu.
Visitam a casa das garotas e o pai os recebe muito mal.
A mãe, escondida do marido, passa para os policiais algo que encontrara no
braseiro do fogão: um pedaço de negativo de um filme meio queimado, que mostra
as jovens seminuas, em uma cama, com um homem que tem um triângulo tatuado na
mão. Parece haver outra pessoa, que fotografa as cenas.
A dupla de policiais se mostra bem diferente no modo de
agir e ser. Enquanto Juan (Javier Gutiérrez) é mais truculento, gosta de beber e
se misturar à noite com as pessoas que frequentam o bar, Pedro (Raul Arévalo)
telefona para casa em Madri para saber da mulher
grávida.
Politicamente, vamos ouvir, ao longo do filme, que os
dois não são partidários das mesmas ideias políticas:
“- Você não deveria ter escrito aquela carta contra o
General, Pedro. Os militares ainda tem muito poder. Por isso te tiraram de
Madri.”
Juan, o mais velho, é bruto e às tantas, um jornalista o
acusa de ter participado da polícia secreta de Franco e matado muita
gente.
As coisas parecem diversas do esperado quando se
investiga de perto. É difícil fazer as pessoas falarem. Há muitos segredos bem
guardados na cidadezinha.
O fato é que as moças são encontradas mortas, com marcas
de tortura e estupro. Os corpos, largados num dos canais do rio, foram
assassinados longe dali. Não há traços de sangue no
local.
Pior, desde 1977 desapareceram moças das famílias que
habitam a região. Sempre na época das feiras, talvez porque a movimentação é
maior e fica mais difícil rastrear o paradeiro delas.
Há um moço bonito, Quini, “El Guapo”(Jesus Castro), que
namora uma amiga das assassinadas e os policiais desconfiam que há algo errado
numa casa alugada para caçadores, onde ele leva a
namorada.
“La Isla Mínima”, nome original do filme dirigido por
Alberto Rodriguez, ganhou 10 dos 17 Goyas, o Oscar espanhol, inclusive melhor
filme e melhor diretor. E é mais do que uma história de uma investigação
policial. Parece dizer que há algo doentio entranhado na sociedade espanhola que
mantém a impunidade, sustentando muita coisa errada, guardada em
segredo.
A lição a se tirar talvez seja a de que quanto mais uma
sociedade acoberta os seus culpados, quem mais sofre são os mais fracos, as
vítimas com que ninguém se importa.
Um filme diferente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário