Direção: Sólveig Anspach
Atrapalhada, ela ajeita-se no espelho do banheiro, sem
na realidade mudar em nada sua aparência comum. Um batonzinho, cabelos num
coque, franja e um olhar baixo.
“ - A senhora está no banheiro dos homens”, informa um
deles, achando graça na cara que ela faz. Murmura desculpas mas, desajeitada,
leva tempo para recolher suas coisas. Outro homem entra e ela se
adianta:
“- Já sei. Me enganei...”diz
tímida.
A cena mostra que ela está nervosa porque tem uma
entrevista para um emprego de secretária. E vê-se que, beirando os 40 anos e sem
nenhuma experiência, ela não está segura de si mesma.
Frente ao dono da empresa, que dá pouca atenção a ela,
repete frases entrecortadas, já que o
telefone toca sem parar e o homem atende a todos, negligente quanto à presença
dela.
“- Mas ajudar seu marido na oficina mecânica não lhe
basta?”
A pobre dá-se conta de que não vai haver emprego nenhum
por ali. Mas o homem acrescenta:
“-Quer um conselho? Da próxima vez, cuide mais de sua
aparência. Isso é importante numa entrevista de
emprego.”
E lá se vai ela, cabisbaixa, dar a notícia ao marido,
que já deixou três mensagens zangadas no celular dela.
Lucie (Karin Viard, excelente) que todo mundo chama de
Lulu, parece ser uma mulher que cuida dos filhos e do marido mas não consegue
sentir-se valorizada.
Quando ela perde o último trem para Angers, onde mora, a
50 km dali, hospeda-se num hotelzinho barato. E essas parecem ser as primeiras
horas de sua vida, como ela mesma.
Tira a aliança para passar um creme nas mãos e
inebria-se com o perfume. Não está acostumada a luxo nenhum. E quando seu olhar
cruza com sua figura no espelho dá a impressão de que ela se vê pela primeira
vez. Enrolada na toalha, adormece saboreando o espaço só dela, algo que não sabe
o que é, mas que lhe dá prazer.
Pela janela, no dia seguinte, vê o mar e vai andar pelos
rochedos onde o mar se quebra.
Ela ainda não sabe, mas encontros inesperados vão fazer
Lulu mudar de atitude frente à vida. Ela vai descobrir qualidades em si mesma
que estavam adormecidas.
Nua? Sim, ela vai mostrar seu corpo que enfrentou o frio
da água do mar, sem pudores bobos. Um homem (Buli Lanners) vai apreciá-la e
cuidar dela.
Mais além, uma senhora de 90 anos (Claude Gensac) gosta
de sua presença e uma mocinha (Nina Meurisse) vai precisar de um empurrão para
realizar seus sonhos.
O mais importante para Lulu é desvencilhar-se dos papéis
de mulher e mãe mal amada, desnudando-se do que já não lhe servia e adotando uma
atitude mais segura de si mesma. Finalmente, ela sabe o que não
quer.
A diretora islandesa, 54 anos, Sólveig Anspach, ganhou o
César de melhor roteiro adaptado de 2015 por “Lulu, Nua e Crua”, baseado numa
história em quadrinhos de Étienne Davodeau. O filme teve 500.000 espectadores na
França.
A diretora tinha um câncer contra o qual lutava há
tempos e, infelizmente, faleceu em agosto de 2015, em sua casa no sudeste da
França. Montava seu último filme, “L’effet Aquatique” que estreia em
2016.
“Lulu, Nua e Crua” é um filme doce, feminino que
acompanha o desabrochar da personagem principal com um olhar simpático e
sensível.
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