“Blind”- Idem, Noruega, 2014
Direção: Eskil Vogt
Ingrid (a talentosa Ellen Dorrit Petersen) apresenta-se
na tela como uma mulher solitária. Alta, pele muito branca, olhos de um azul
escuro, rosto nórdico, cabelos lisos louríssimos. Ainda jovem, senta-se num
apartamento despojado, perto da janela. Tem computador e aparelho de som a seu
lado.
Quando começa a narrar em “off” sua cegueira, não o faz
para lamentar-se. Descreve o que aconteceu. A mancha no olho, a visita ao
especialista, o diagnóstico.
“- Dizem que minha capacidade de visualizar vai
desaparecer porque o nervo óptico vai definhar sem novas impressões. Mas também
disseram que eu posso retardar o processo me exercitando todo
dia.”
Lembranças, associações, desejos, conflitos, medo. Tudo
isso vai entrar em cena.
Presa no apartamento por sua fobia, a princípio, como
não vê, não quer ser vista.
Demora um pouco para o espectador perceber, mas a mente
observadora e criativa de Ingrid vai abrindo espaços, através das histórias que
ela conta para si mesma. Essas narrativas aparecem visualmente na tela, assim
como aparecem na mente de Ingrid. Estamos dentro da cabeça dela, vendo o que ela
imagina.
Ingrid encontrou sua Sherazade e as histórias vão sendo
escritas no computador, pensadas e mesmo sonhadas.
“- Quando sonho, posso enxergar. Aí acordo pensando que
vou voltar a ver e não...”
Para combater a solidão e a depressão, a libido de
Ingrid vai ajudá-la a encontrar imagens e, em seu mundo interno, personagens se
movimentam.
Há pornografia, sexo comum, voyeurismo, amizade,
maternidade. Os cenários são os que ela conhecia antes de ficar cega. O humor
começa a aparecer e ela sorri sózinha.
Porque ela sente que o casamento está em crise, o marido
Morten (Henrik Rafelsen) é o centro de sua atenção.
“- Agora ele vai chegar, contar como foi o dia dele e
perguntar do meu. Quer saber se eu saí. Não fala nada mas deve ficar
decepcionado comigo...”
A auto-estima de Ingrid está abalada mas ela vai aos
poucos ficando mais confiante, transmutando paranoia em desejo e, ao invés de
procurar um outro mundo para o marido, longe dela, introduz o homem que ela ama
em suas fantasias.
“- Às vezes eu sinto que ele está aqui no apartamento.
Ele diz que não é para eu ficar imaginando coisas... Mas o piso faz
barulho...Ele poderia estar sentado, calado e me
observando...”
A luta de Ingrid para conseguir viver na escuridão, sair
da depressão e o desejo de amar e ser amada, são traduzidos em imagens
fantasiadas e vivências na realidade, às vezes difíceis de serem diferenciadas,
devido à montagem impecável.
O roteiro é fascinante, escrito pelo próprio diretor,
norueguês, que já nos envolveu com o roteiro de “Oslo – 11 de agosto” de 2011.
Esse é o primeiro longa de Eskil Vogt, 40 anos, o que aponta para uma carreira brilhante no
cinema.
Elogiadíssimo pela crítica e premiado pelos festivais
por onde passou, “Blind” é um filme raro, que provoca o espectador, para que ele
possa refinar sua sensibilidade.
Uma experiência enriquecedora.
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