Direção: Marcelo
Machado
Quem era jovem em 1964,
certamente foi ver, ou ouviu falar do espetáculo “Opinião”, que estreou no Rio
de Janeiro em dezembro desse ano, alguns meses depois de instalado no Brasil o
regime militar, que derrubou o presidente eleito, João Goulart, com um golpe de
estado.
“Opinião” era uma colagem
de textos e músicas de protesto contra a situação política do país, cantadas por
Zé Kéti e Nara Leão, depois substituída pela baiana Maria Bethania, desconhecida
até então. Ficou na nossa memória o rosto forte dela cantando
“Carcará”.
Pois bem. Junto com
Bethania, veio para o sul seu irmão, Caetano Veloso.
O rapazinho magro,
tímido, charmoso, inteligente e principalmente, curioso por tudo, começou a
andar com um pessoal que ia ver e fazia teatro, cinema e música, à sombra do
regime que ainda não mostrava cabalmente suas garras.
A bossa nova era rainha
no terreno musical. E Elis Regina e seu programa na TV Record, apresentado
também por Jair Rodrigues, enchiam o teatro da Consolação com estudantes que iam
aplaudir “O Fino da Bossa” em 1965. Nesse programa, Caetano e Gilberto Gil foram
apresentados ao público, junto com Chico Buarque e MPB4, Toquinho, Maria
Bethania, Milton Nascimento e outros.
A Record tinha também o
programa “Bossaudade”, apresentado por Elizete Cardoso e “A Jovem Guarda” nas
tardes de domingo, comandado por Roberto Carlos.
No rastro do I Festival
de Música Popular Brasileira realizado pela TV Excelsior, a Record começou a
também fazer festivais.
O II Festival de Música
Popular Brasileira foi um sucesso e serviu para mostrar que havia um público
dividido. Os que torciam por Geraldo Vandré e a música “Disparada” e aqueles que
queriam “A Banda” de Chico Buarque. A confusão foi tanta que deu
empate.
Caetano Veloso gostou da
“Banda” que era uma marchinha “cinematográfica” e, no próximo Festival da
Record, lançou também uma marcha que seria uma novidade e um sucesso
instantâneo. Caetano cantou “Alegria, Alegria”, vestindo-se como a jovem guarda
de Roberto, de boá no pescoço e perguntando “Por que não?”
O arranjo tinha guitarras
elétricas e a sonoridade lembrava os Beatles. Ganhou o primeiro
lugar.
No mesmo festival,
Gilberto Gil cantou “Domingo no Parque”, também cinematográfica, com enredo e
personagens, acompanhado pelos “Mutantes”, o arranjo também com guitarras
elétricas e todos vestindo fantasias. Rita Lee, mocinha, chamava a atenção pelo
seu “look” londrino. Alienados?
Estavam lançadas as bases
de um movimento que sacudiu a música popular brasileira e que foi chamado de
“Tropicalismo”. Tudo a ver com a Semana de 1922, Oswald de Andrade,
antropofagia, “Macunaima” e “O Rei da Vela”. E também com Hélio Oiticica, sua
obra “Tropicália” e os parangolés e no cinema Glauber Rocha com “Terra em
Transe” e “Deus e o Diabo na Terra do Sol”. E Chacrinha,
claro.
O documentário
“Tropicália” de Marcelo Machado conta tudo isso com agilidade e beleza,
começando pelo fim, quando Caetano e Gil, depois de amargar prisão, foram para o
exílio em 1969, quando começaram “os anos de chumbo”, com o
AI-5.
A procura de uma síntese
de ideias, por vezes contraditórias, foi a marca do movimento tão bem explicado
no documentário que faz um painel do Brasil no fim dos anos 60, não apenas
cultural mas também político. E mostra que uma coisa tinha tudo a ver com a
outra.
Uma linguagem criativa
costura fotos, pedaços de programas de TV, de filmes, cenas de rua, capas de
LPs, o enterro do estudante Edson Luis, a passeata dos 100 mil, filminhos
caseiros de Caetano e Gil no exílio em Londres, a participação deles no Festival
da Ilha de Wight em 1970 e a volta ao Brasil.
Tudo isso ao som das
músicas e depoimentos do pessoal que fez o Tropicalismo.
Imperdível para quem
viveu isso e, principalmente, para quem não viveu isso e precisa saber como foi.
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