Direção: Paulo
Sorrentino
Cabelo negro armado,
batom vermelho e os olhos azuis maquiados. Um tique como Marilyn: sopra a mecha
de cabelo que cai em seu rosto. Sempre com o mesmo figurino, calça e blusão de
couro, gola de pele, tudo preto.
É Cheyenne. Ex-ídolo de
rock dos anos 80, que segue decadente mas fiel a essa imagem, como uma pedra
imutável, porque é difícil encarar o que traz dentro de si.
Milionário, refugia-se da
realidade vivendo numa linda casa na Irlanda, casado há anos com uma bombeira
com quem mantém um relacionamento carinhoso.
Jogam pelota basca na
piscina vazia. Ele olha da janela ela fazendo tai-chi-chuan no jardim com o
professor chinês. E assim passam-se os dias.
Ela (Francis McDormand)
parece ser a mãe daquela patética criança andrógina (Sean Penn, numa
interpretação magistral).
E, na cabeça dele, ressoa
sempre uma pergunta que não quer calar e que ele murmura para si
mesmo:
“- Tem algo errado aqui,
não sei o que é, mas tem.”
Ela diz que ele confunde
depressão com tédio.
Mas quando chegam
notícias preocupantes sobre a saúde do pai dele, com quem não fala há 30 anos,
Cheyenne empreende uma viagem iniciática que vai fazer com que olhe de frente
aquilo que sempre fora negado.
Lá se vai ele para a
América, arrastando seu “carry-on”, de encontro ao pai que não o
reconhecia.
Nessa viagem, Cheyenne
vai encarar o passado que o pai sempre escondera de si mesmo e, fazendo isso,
mesmo sem querer, tornara o filho refém de uma culpa fantasiada.
Cheyenne intuia que havia
um carrasco na vida do pai. Confundia-se com ele.
“Há muitas maneiras de
morrer, a pior é continuar vivendo”, era o lema do pai de Cheyenne, que,
silenciando sobre sua tragédia pessoal, condenava o filho a interrogar-se sobre
o que não sabia.
A saída dele,
infantilizada, fora refugiar-se em um exílio culposo, vestindo um
disfarce.
David Byrne, que compôs a
música original para o filme, aparece como ele mesmo, contracenando com
Cheyenne. Momento de um começo de confrontação consigo mesmo.
Mas é no encontro com a
verdade do pai que reside a possibilidade de liberação para ser ele mesmo.
Compreendendo o que acontecera, ele estará livre para decidir e passar a existir
fora de seu casulo.
“Aqui é o Meu Lugar”,
tradução do titulo em português, elimina a dúvida, marca de Cheyenne. Pena.
Porque o filme tem um clima estranho proposital, mexendo com o espectador que
vive também o dilema do personagem, que só vai ser esclarecido pouco a pouco.
O roteiro que também foi
escrito pelo diretor, com a ajuda de Umberto Contarello, coloca Sean Penn no
papel de um herói temeroso à procura de sua verdade. Com delicadeza, Paolo
Sorrentino encaminha o ex-roqueiro para o que ele precisa saber e decidir, para
viver sua própria identidade.
A direção de Paolo
Sorrentino é impecável. O roteiro é engenhoso. A fotografia nota 10, com belas
imagens líricas.
Mas, não tenham dúvidas
quanto a isso, o filme é de Sean Penn, de fio a pavio. Um ator como
poucos.