“O Jantar”- “The Dinner”,
Estados Unidos, 2017
Direção: Oren Moverman
Numa miscelânea de imagens,
que mais tarde vamos entender, pratos sofisticados são preparados, uma bola
voa, um saguão de mármore é iluminado por castiçais com velas, um antigo
cemitério é mostrado, estátuas remetem a personagens heroicos.
Depois, um rap invade nossos
ouvidos e jovens estão numa festa, se divertindo com bebida, drogas e risadas.
Três deles saem pela noite e o negro vomita.
Paul Lohman (Steve Coogan)
quarenta e tantos, faz um monólogo que ouvimos em “off” sobre gregos antigos e
romanos, a idade de ouro de nossa civilização para ele, que é professor de
História do ensino médio e fala sozinho para jovens entediados. Personagem com
uma forte misantropia, em seu discurso não esconde uma depressão raivosa. Soa
como se tivesse perdido todas as batalhas de sua vida.
“- Não vou. Não quero ver
essas pessoas. Esses vermes, macacos. Vamos cancelar ”, diz ele para sua mulher
(Laura Linney) que continua a se maquiar e não o leva em consideração.
Toda essa negatividade é
dirigida ao irmão de Paul, o bonitão e bem sucedido Stan (Richard Gere), que é
deputado, em plena campanha para governador. Ele é casado com Kately (Rebecca
Hall), sua segunda mulher, uma esposa troféu, nas próprias palavras dela.
Os dois casais vão jantar num
restaurante cinco estrelas, caríssimo e pomposo. Numa casa enorme, várias salas
recebem clientes elegantes com um batalhão de garçons e um “maitre” que
discorre sobre a comida com um linguajar pedante que exulta os produtos
diminutos nos pratos, onde quase tudo é decorativo.
Paul e Claire são os
primeiros a chegar e, em meio às reclamações do irmão menos dotado, que a
mulher trata como se fosse uma criança, chega Stan, o mais velho. Kate senta-se
mas o marido dela cumprimenta várias pessoas, em ritmo de campanha política.
“- Irmão, pensei que não ia
conseguir atravessar a sala. Pronto. Pode parar de sorrir. Somos só nós aqui ”,
diz Paul irônico, quando Stan chega finalmente à mesa.
Em vários “flashbacks” vamos
entendendo o relacionamento entre esses dois irmãos, diferentes em tudo, até no
carinho da mãe quando eram crianças. Paul parece ter herdado um traço de
instabilidade mental, presente na família. Está sempre armado e raivoso. Stan
tenta conciliar os ânimos exaltados mas levanta muitas vezes da mesa para
atender o telefone e confabular com sua assistente (Adepero Oduye). Esse vai e
vem deixa todos nervosos.
Mas por que tinham ido jantar
juntos?
O casal Claire/Paul tem um
filho adolescente Mike (Jesse Dean Peterson) e Stan/Kate tem Ricky (Seamus
Davey-Fitzpatrick) e Beau (Miles J. Harvey), uma criança negra, que tinha sido
adotado pela primeira mulher de Stan, Barbara (Chloe Sevigny), que se mudara
para a Índia.
Os primos de 16 anos eram
aqueles que vimos saindo da festa e eles vão se meter numa encrenca trágica,
que é o motivo daquele jantar. Mas demora para que os pais tenham espaço para
falar sobre os filhos.
O diretor e roteirista
israelense, radicado nos Estados Unidos, Oren Moverman, adaptou o livro
best-seller do holandês Herman Kock, mostrando que gosta de deslindar a
complexidade da natureza humana. A fotografia caprichada é de Bobby Bukowski
que usa o cenário do restaurante para aludir às sombras da mente que vamos ver
surgir durante aquela noite.
O elenco é de estrelas e as
interpretações são preciosas. O texto tem diálogos inteligentes que mostram
claramente que cada adulto naquele jantar só pensa em si mesmo.
Narcisismo, famílias
disfuncionais, racismo, poder do dinheiro, horror ao diferente, maldade,
educação baseada em superproteção, tudo isso virá à tona.
E como não há julgamento
nenhum no roteiro, a reflexão é do espectador. Que vai para casa tendo que
pensar sobre o lado podre da nossa civilização.
“O Jantar” é um filme que não
tem medo de ser indigesto.
De vez em quando é salutar
pensar em ética. Concordam?
Nenhum comentário:
Postar um comentário