“Joaquim”- Brasil, 2017
Direção: Marcelo Gomes
Fins do século XVIII, Minas
Gerais, uma igrejinha pobre. Muita chuva quase esconde aquela cabeça cortada
exposta.
E fala Joaquim, o dono da
cabeça, sobre seu crime de insubmissão à Rainha dona Maria I de Portugal:
“- Fui esquartejado. Mártir
de uma insurreição que fracassou...’’ e continua, contando que no Brasil é
feriado no dia da morte dele e que as crianças estudam esse episódio na escola.
Mas quando o vemos como um
homem rude, cabelos longos desgrenhados, barba hirsuta, arma na mão, numa
fazendola tosca, levamos um susto. Não é o Tiradentes dos livros da escola. É o
Joaquim.
É alferes do exército e quer
ser tenente. Não conseguiu ainda essa promoção mas acredita nela e promete à
Preta (Izabel Zuaá), uma escrava jovem e decidida, que vai compra-la do patrão.
Faz amor com ela num curral e a câmara chega perto dos rostos apaziguados no
prazer.
Mas o patrão se serve dela
como se fosse dono não só do corpo mas da alma dela. Manda Preta se deitar com
o administrador. Ela obedece. Submete seu corpo porém seu desejo é fugir dali.
E é o que acontece mais tarde.
É a realidade do
escravagismo, homens e mulheres vendidos e comprados. Pior que eles só mesmo os
índios, a quem se nega tudo:
“- Tira daqui essa
imundície”, diz um homem sujo ao indiozinho que estende a gamela para um pouco
de comida.
Estamos num Brasil colônia
explorado por Portugal que para cá só manda gente que não se integra à
sociedade portuguesa. Vir para o Brasil é castigo.
Joaquim aceita uma missão
perigosa de procurar ouro no “sertão proibido” e só vai porque quer comprar
Preta e sua promoção. É um homem de poucas falas, ignorante mas que observa o
estado de coisas e sente raiva.
Seu encontro com o “Poeta”
(Eduardo Moreira), que lê livros e os empresta à Joaquim, vai ser o
incentivador das ideias de rebelião que ele acalenta.
O ator paulista Júlio Machado encara com
garra seu Joaquim, que vai se tornar Joaquim José da Silva Xavier, o
“Tiradentes”, que dá destino à sua raiva encabeçando a “Inconfidência Mineira”.
E o diretor e roteirista
Marcelo Gomes sabe contar bem esse começo de história que acontece num Brasil
tacanho onde a corrupção já grassava e a desonestidade era recompensada.
O filme foi rodado em
Diamantina, Minas Gerais, em belas locações de grandes rochas, rios e
cachoeiras que escondiam o ouro e as pedras cobiçadas.
É lá que acontece a cena mais
tocante do filme, quando o índio (Karai Rya Pua), que guiava a tropa de
Joaquim, começa a cantar e é acompanhado por João (Welket Bungué), escravo de
Joaquim, com palmas e depois com uma canção africana. Em perfeita harmonia.
É dessa mistura de gente que
nasce o Brasil que conhecemos mas a herança do canto e da alegria, certamente
devemos aos mais oprimidos dos seus filhos. Uma nota de esperança.
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