sábado, 27 de agosto de 2016

Café Society


“Café Society”- Idem, Estados Unidos, 2016
Direção: Woody Allen

Todo fã de Woody Allen sabe o gosto que dá ouvir as músicas de jazz instrumentais, enquanto na tela negra aparecem os créditos em letras brancas. Um ritual que nos prepara para todo filme do genial cineasta.
As cidades podem ser Paris, Roma, Londres ou Nova York e a época varia mas a sensação de prazer é sempre a mesma. Em “Café Society” não é diferente.
Vamos transitar entre o apartamento do jovem judeu Bobby Dorfman (Jesse Eisenberg, ótimo) e seus pais (Ken Stott e Jeanne Berlin, hilários), no Bronx, Nova York e a casa modernista do tio Phil (Steve Carell, cada vez melhor) em Los Angeles.
Instigado pela mãe, Bobby desiste de ser um ninguém em Nova York e parte para a costa leste, onde o tio Phil, agente de grandes nomes de Hollywood, vai acolher o sobrinho e arranjar algo para ele fazer. Ao redor da piscina azul do agente ilustre, rolam festas onde todos estão sob uma luz dourada de um eterno por do sol, desfilando roupas com toques dos anos 30 mas que poderiam ser usadas hoje.
E como o tio Phil é muito ocupado, com a agenda repleta de almoços, jantares e festas com gente importante, manda sua secretária Vonnie (Kristen Stewart, deliciosa) guiar o sobrinho pelos pontos turísticos da cidade. Ela é linda, jovem e usa com graça uma fita com lacinho no cabelo.
E, um clichê saboroso é encenado em torno a um triângulo inesperado.
Vonnie e Bobby, de tanto passear juntos, de amigos passam a namorados e ele planeja voltar para Nova York, casar com ela e ser feliz num apartamento em Greenwich Village:
“- Não vamos ser ricos mas felizes. Eu vou mimar você.”
Vonnie parece encantada mas há algo que a prende a um outro misterioso namorado. Ela não escondeu dele esse caso que já dura um ano.
“I Only Have Eyes for You” toca enquanto eles vão ao cinema, a um restaurantezinho mexicano e à praia, onde se amam numa cena perfeita em que uma caverna enquadra o mar e emoldura o par enamorado.
Mas, como sabemos, nada disso vai durar e só resta a Bobby lamentar que a vida é uma comédia, escrita por um comediante sádico.
O clichê vai até as últimas consequências e um desolado Bobby volta para Nova York para trabalhar com o irmão Ben (Corey Stol), um gangster sem escrúpulos, que vai ter um fim previsível, com um toque de humor negro preciso.
O “nightclub” do irmão é o lugar onde todos que contam estão se divertindo e daí o título do filme.
“I’ll take Manhattan” será a trilha musical para um reencontro de Bobby, já casado com outra Veronica (Blake Lively, bela), também apelidada Vonnie , com a primeira Vonnie. Linda a cena no Central Park onde a luz é branca e brilhante no mármore da ponte e no vestido dela (Vittorio Storaro é o fotógrafo, ganhador de três Oscars, impecável e inspirado).
Mas como diz a música “Anos Dourados” do Chico, “é desconcertante rever o grande amor”.
Woody Allen, 80 anos, está mais em forma do que nunca. Fazendo o narrador do filme, ele acrescenta inflexões próprias à história que está sendo contada. E é muito simpático ouvi-lo, como se fosse nosso amigo de longa data. Cria-se uma intimidade entre ele e a plateia.
Já sabíamos que Woody Allen é um romântico que não crê na vida eterna mas no grande amor que marca as pessoas justamente por não ter sido vivido.
Há beleza e saudades em “Café Society”, que abriu o Festival de Cannes desse ano e principalmente uma nostalgia dos nossos anos dourados.
“Café Society” é cheio de charme e imperdível.



sexta-feira, 26 de agosto de 2016

Mercuriales


“Mercuriales”- Idem, França, 2014
Direção: Virgil Vernier

Em um mundo inseguro, perigoso, quem cuida da segurança?
Nas Mercuriales, torres gêmeas de Bagnolet, no subúrbio de Paris, vemos um rapaz negro ser admitido como vigia, sem ter nenhuma noção do que poderá ter que enfrentar. Equipamentos há muitos. Câmaras, medidas automáticas contra fogo e mal funcionamentos.
Mas ele vai ter também que enfrentar pessoas. Aquelas que procuram o terraço para se jogar ou ainda outras que buscarão atacá-lo. Sem conhecer golpes de lutas marciais, parece que o único recurso seria enfiar os dedos nos olhos do agressor. Ele é magrinho e calado. Escuta essas instruções com olhos medrosos.
Reaparece, cenas depois, como vigia de roubos no supermercado das torres e, no fim do filme, participando de uma milícia armada, com roupas de camuflagem, que patrulha os arredores das Mercuriales.
Mas ele não é o protagonista.
As duas garotas do filme são Joane (Phillipine Stindel), a francesa e Lisa (Ana Neborai), a que veio da Moldávia.
Ambas são belas, cabelos claros, lisos e longos, corpos jovens e peles perfeitas.
São tão parecidas que poderiam ser irmãs mas acabaram de se conhecer, quando foram fumar num intervalo do trabalho, no alto da torre.
“- Faz tempo que você trabalha aqui?” pergunta a recém-chegada.
“- Parecem mil anos...” responde a francesa.
Elas convivem com as pessoas que habitam aquele subúrbio, em prédios mal tratados e data para ser derrubados.
Debaixo do viaduto próximo das torres rastejam ratos e pessoas.
Esse fluxo de gente desgarrada e sem rumo, aproxima as duas moças que conversam sobre banalidades e medos quotidianos, enquanto se fazem companhia, porque Joane é babá da filha de uma negra que trabalha na noite. A menina é como uma boneca para as duas mocinhas. Vestem as roupas da mãe nela, riem muito  e as três conversam sobre fé em Deus, fim do mundo, paraíso e inferno. Tudo muito infantil e amedrontador.
Lisa perdeu de vista uma prima que desapareceu na cidade e Joane tem lembranças de um hospital psiquiátrico e medo da loucura nela.
Mas nenhuma delas se aprofunda em nada e a vida parece um dia depois do outro, sem rumo nenhum.
Lisa tem um pequeno apartamento mas dorme com Joane num colchão, no chão do quarto dela. Temem a solidão. São meninas, não mulheres.
Precisam de algo que não existe ali. E sonham com outro lugar e outro tempo.
Lisa se lembra de festas pagãs na chegada da primavera na aldeia em que morava. São imagens sexualizadas e perversas.
A francesa leva a outra para a casa do avô que já morreu. E lá elas andam ao longo do rio, tomam sol e banho de banheira juntas. Um hiato de tranquilidade mas que não dura muito.
Um dia, Lisa quer voltar para a casa dela.
E Joane fica só.
O diretor Virgil Vernier, francês de 40 anos, nos leva a perguntar: o que sonha essa juventude sem objetivos na vida?
Parecem muito frágeis. Mas a segurança de que precisam, não é a dos vigias das torres, nem a falsa sensação de segurança que conseguem com bebida, drogas e sexo fortuito.
Não sabem o que procuram...Por isso não vão encontrar.
Um filme que surpreende pela narrativa incomum e que fica propondo perguntas que não sabemos como responder.

terça-feira, 23 de agosto de 2016

Francofonia: Louvre sob Ocupação


“Francofonia: Louvre sob Ocupação”- “Francofonia”, França, 2015
Direção: Aleksander Sokurov

“- E se o Louvre fosse mais valioso do que a própria França?”, pergunta em meio a seu último filme, o brilhante diretor e roteirista Aleksander Sokurov, que tem formação de historiador.
E sua tese é que não podemos viver sem museus porque é lá que encontramos nossa história e identidade:
“- O Louvre fala dos homens. Do que mais?”
Como narrador, o diretor caminha com a câmara pelos corredores e salões do museu, inaugurado em 1793, capturando a beleza e a grandiosidade das telas penduradas em suas paredes:
“- Tudo que existe está aqui. Um templo dedicado à pintura”, exclama Sokurov, nesse original documentário com ficção.
O primeiro grande quadro que vemos é de Géricault (1791-1824), “Le Radeau de la Méduse – A balsa da Medusa”, pintado em 1818-1819. É uma metáfora sobre o perigo de perdermos tudo: a arte e a vida.
Sokurov contrapõe a essa metáfora do século XIX , a de um navio em alto mar, que ele vê pelo Skype, em meio a uma tempestade. Grandes ondas castigam a embarcação que leva uma preciosa carga de um museu em “containers”. Diz o diretor:
“- Assim como o oceano, as forças da História não tem piedade...”
Marianne (Johanna Korthas Altes), a mulher que simboliza a França Republicana é perseguida por fantasmas nos corredores do Louvre e repete sem cessar, assustada:
“- Liberté, egalité, fraternité”, o lema da Revolução Francesa.
Napoleão (Vincent Nemeth) é outro personagem que anda pelo Louvre mostrando a Sokurov tudo que ele pilhou em suas campanhas militares em países longínquos.
“- Nenhuma cidade está a salvo de um desastre.”
Com essa frase, o diretor introduz a história da ocupação de Paris pelos alemães em 1940, quando foi considerada uma “cidade aberta”. Conta sobre os franceses que lutaram, os que fugiram e os que se resignaram.
Alemanha e França assinam um armistício mas quem garante como vai se portar o invasor daquele centro de cultura que é Paris?
Sokurov usa atores para encenar o episódio da salvação das obras de arte do Louvre pelo diretor Jacques Jaujard 
(1895-1967), ajudado pelo alemão responsável pela conservação das obras de arte e monumentos dos países ocupados, Conde Franz von Wolff Metternich (1893-1978).
Antes da ocupação, 6.000 caixotes contendo tudo que havia no Louvre foi levado para lugares escolhidos. Só deixaram algumas esculturas e os afrescos.
E quando Berlim pedia que o conde alemão trouxesse de volta as obras de arte do Louvre, ele se valia da burocracia para impedir que os poderosos que cercavam Hitler pilhassem o museu.
É um filme diferente do famoso “Arca Russa” de 2002 de Sokurov no qual, em uma só tomada, conta a história da Rússia nos últimos 200 anos, filmando pelos salões do museu Hermitage, em São Petersburgo.
“Francofonia”, onde Sokurov usa imagens de arquivo alternadas com outra belíssimas que ele filma na atualidade, é um filme que ensina não só a história do Museu do Louvre mas que traz reflexões de Alexander Sokurov sobre a arte e seu papel na vida da humanidade.

Imperdível para quem ama a arte europeia e Paris, lugar onde estão os seus maiores tesouros, no museu dos museus, o Louvre.

sábado, 20 de agosto de 2016

A Corte


“A Corte”- “L’Hermine”, França, 2015
Direção: Christian Vincent

Tudo começa num tribunal. E o juiz Michel Rancine (Fabrice Luchini, excelente ator) será o personagem principal.
O arminho do título em francês, refere-se à pele branca que circunda a capa vermelha do Presidente do Tribunal de Saint Omer. É uma tradição que confere ao juiz uma posição de autoridade e respeito.
Mas, naquele dia, o juiz conhecido por suas sentenças severas, nunca menos de 10 anos, está se sentindo mal. É a gripe. Pálido, com febre, ele volta ao hotel onde está instalado desde que sua mulher decidiu que quer o divórcio.
No quarto, ele lê o processo do dia seguinte. Um caso de infanticídio, no qual o acusado de matar um bebê de sete meses é o próprio pai, um jovem militar.
Mas o juiz piora e sai pela rua à procura de uma farmácia e uma injeção. Está fraco, cai na rua. Os passantes não o ajudam, acreditando estar na presença de um bêbado.
O jogo das aparências e da verdade vai ser encenado pelos personagens do filme “A Corte”, ótima tradução do título original, porque o tribunal como lugar solene e a lembrança de um amor se misturam na história.
No dia seguinte, quando chega ao tribunal, ainda se sentindo mal, o juiz escuta dois advogados falando dele, sem perceber que ele ouve tudo:
“- Viram ele cair na rua ontem à noite, bêbado, saindo de um bordel.”
Ao ouvir essas palavras, Rancine se irrita e entra no tribunal de cara fechada. Um advogado cochicha com o outro:
“- O juiz está de mau humor. Não queria estar no lugar do réu.”
Mas, ao sortear o nome dos jurados, algo acontece, porque seu rosto mostra um misto de sentimentos, ao ler em voz alta, o nome de uma jurada. O que será que liga o juiz àquela médica bonita (Sidse Babett Knudsen)?
Há segredos na trama, além de o que acontece nem sempre ser o que parece.
Aliás o que é a verdade? Em meio ao processo de julgamento, o juiz conversa com os jurados e fala que é bem provável que ninguém saberá jamais a verdade sobre a morte da bebê. E por que? Porque naquele tribunal não se trata de estabelecer a verdade dos fatos mas de fazer cumprir a lei.
Fabrice Luchini ganhou o prêmio de melhor ator no Festival de Veneza e o roteiro também foi premiado. O diretor Christian Vincent (“Os sabores do palácio” 2012) contou bem a história que envolve o espectador na dupla trama.
“A Corte” é interessante do princípio ao fim. E acaba inesperadamente com um jogo de olhares. Quem prestou atenção no filme vai entender porque ela veste o vestido cor de creme.

Um filme agradável. 

domingo, 14 de agosto de 2016

Amor e Amizade


“Amor e Amizade”- “Love & Friendship”, Irlanda, Holanda, França, Estados Unidos, Reino Unido, 2016
Direção: Whit Stillman

Incrível pensar que o livro que foi adaptado para o filme foi escrito por uma Jane Austen (1775-1817) de apenas 18 anos,  publicado em 1871, bem depois de sua morte.
Há aqui uma observadora irônica e crítica dos costumes e da moral vigente na aristocracia inglesa do fim do século XVIII. E bom humor.
A personagem principal, que dá título ao filme, é “Lady Susan”, em torno da qual viravolteiam homens e mulheres que ela seduz e engana com a maior facilidade. Diria mesmo que Lady Susan é temida pelas mulheres que a conhecem melhor. Uma delas chega a chamá-la de “a serpente do jardim do Éden”.
Os falatórios a perseguem mas ela não dá a mínima. Sempre se sai bem, colocando a culpa nos ciúmes das outras e dos outros.
Homens ricos são o alvo dessa viúva, ainda jovem e belíssima, que tem uma filha adolescente, que ela precisa casar com um bom partido. Ela também precisa. Por que não?
Como não tem dinheiro, só pose, visita os amigos e parentes por longas temporadas, até acabar sendo descoberta em suas manipulações, das quais sabe tirar proveito, com percebemos na frase inicial do filme:
“- Se não fosse Langford, nunca teríamos sido felizes”, diz Lady Susan (Kate Beckinsale, perfeita) à filha Frederica (Morfydd Clark).
E, claro, para chegar aos seus objetivos, ela usa de todo o poder de sua beleza sobre os homens e de sua mente que fabrica estratégias dignas de um general com o peito cheio de medalhas.
Os diálogos são finos e educados, ela sempre linda, com os cachos castanho-dourados em coques meio soltos, a pele perfeita e a silhueta desejável desfilando um vestido único, no início da história e vários outros depois, de muito bom gosto, quando começa o saque ao dinheiro do marido de uma outra.
A amiga americana (Chloe Sevigny) é a confidente que se deslumbra com a astúcia dela. Casada com um homem mais velho, Alicia Johnson, que é ameaçada de ser devolvida a Connecticut por causa dessa amizade com a mal falada Lady Susan, escuta dela a reprimenda divertida por ter se casado com um aristocrata “velho demais para ser governável e jovem demais para morrer”.
“- Espero que o próximo ataque de gota que ele tiver, seja terrível” diz a amiga petulante, provocando risos na provável futura viúva.
Os diálogos são rápidos e cheios de truques e podem deixar o espectador, de início, meio perplexo. Mas, calma. Mais do que aquilo que se diz, o melhor mesmo é observar Kate Beckinsale e seu jeito maroto e arrogante de enganar, que é a cereja do bolo de “Amor e Amizade”.

Sem dúvida, uma bela e charmosa “cara de pau”.

terça-feira, 9 de agosto de 2016

Jason Bourne


“Jason Bourne”- Idem, Estados Unidos, 2016
Direção: Paul Greengrass

Confesso que não sou fã de filmes de ação. Mas não perco nenhum James Bond e adorei “Mad Max – Estrada da Fúria”.
E agora entendi porque as pessoas gostam de Matt Damon fazendo o personagem Jason Bourne. E também porque esse filme de ação é fascinante.
A história é contemporânea. Envolve “hackers”, lançamento de novas plataformas digitais por um jovem milionário, invasão de privacidade e ingerência de instâncias do governo, a CIA no caso. Mas é o tom e o ritmo frenético do filme, montagem das cenas, o jeito de filmar, os cortes e os atores, que fazem dele um produto do século XXI.
O que mais fascina é o herói. Ele é caladão, ganha a vida lutando com homens musculosos, mal- encarados e tatuados, numa longínqua fronteira da Macedonia com a Grécia e acaba quase tudo com um só e certeiro soco.
É inteligente e esperto. Rei das táticas de sobrevivência, ele está sempre muitos passos à frente de quem o persegue e sabe, de antemão, qual será o meio de escapar. Sabe usar as circunstâncias a seu favor.
Ex-agente da CIA, foi voluntário por patriotismo. É uma máquina de matar mas há um enorme engano envolvendo tudo isso. Por que será que a CIA quer eliminá-lo? Há muita coisa a ser esclarecida.
Ao mesmo tempo, nosso herói inspira simpatia. Torcemos imediatamente por ele, mesmo se não sabemos exatamente do que ele se lembra. Ou pensa que se lembra. Porque a primeira fala do filme, com a tela ainda escura, são as palavras dele:
“- Eu me lembro de tudo.”
Leva um tempo para o espectador perceber quem é quem e quais conspirações são verdadeiras. Porque o que parece amigo pode ser o inimigo.
Jason Bourne ou David Webb, ou outros nomes que constam em seus vários passaportes, tem um drama em sua vida, que envolve a figura do pai. A cena é repetida algumas vezes de ângulos diferentes e parece que o pai dele caiu em uma armadilha. Antes de morrer procura prevenir o filho de algo que ele precisa saber. Mas isso foi anos atrás. E é a chave do segredo do passado que ele busca decifrar.
O maldoso diretor da CIA (Tommy Lee Jones, ótimo) é quem o caça pelo mundo através de um agente de maus bofes (Vincent Cassel).
E aqui está mais uma explicação  do sucesso do filme: ótimos atores e um diretor criativo que coreografa cenas de violência na multidão que faz uma manifestação política em Atenas, em meio a fumaça das bombas, fogo e tiros e que é o palco para Bourne escapar, mesmo monitorado pelos agentes da CIA, numa moto roubada e na mira do agente assassino.
Ou ainda, em Las Vegas, a louca perseguição em carros jamais vista. De tirar o fôlego.
E quem é que sabe os verdadeiros objetivos de Heather Lee (Alicia Vikander) uma jovem agente da CIA que parece ter uma queda por Bourne e quer trazê-lo de volta para a agência? Ou não? Também quer matá-lo?
A história (roteiro de Paul Greengrass e Christopher Rouse) tem vários buracos por onde vão passar os próximos filmes de Jason Bourne, estrelando Matt Damon e certamente Alicia Vikander.

Pelo menos parece que são essas as intenções.

domingo, 7 de agosto de 2016

A Intrometida


“A Intrometida”- “The Meddler”, Estados Unidos, 2015
Direção: Lorene Scafaria

Como é duro aceitar a realidade da perda de alguém amado. A pessoa fica perdida. E, muitas vezes, se distrai da dor tentando preencher o buraco da ausência com outras presenças. Uma defesa que mais perturba do que ajuda.
É o que vive Susan Sarandon no simpático filme “A Intrometida”, feito especialmente para a atriz mostrar um desempenho que mistura graça, humor e calor humano.
Viúva, ainda atraente, Marnie resolve se mudar de Nova York para Los Angeles, onde mora sua filha única e toma de assalto a vida dela. Entra com a própria chave na casa da filha a qualquer hora, sem pedir licença, com a certeza de que Lori precisa dela.
Quando não está invadindo a casa da filha, lota sua caixa de mensagens no telefone celular com recados nada importantes. Leva a filha à loucura.
Não que Lori (Rose Byrne) não ame sua mãe. Mas ela fica perturbada com a total falta de privacidade que, sem notar, a mãe impõe à filha.
Mas, como Lori resolve impor limites, Marnie sai à procura de outras pessoas que precisem dela.
Assim, se intromete sem ser convidada no chá de bebê de uma amiga da filha, levando um IPAD de presente, muito festejado por sinal. Lá fica conhecendo outras amigas de Lori e faz a babá de que uma delas precisa, ajuda financeiramente outras duas sem dinheiro, dá conselhos, enfim, torna-se a mãe dos sonhos de todas as amigas da filha.
Não passa pela cabeça de Marnie que ela está se ocupando dos outros para não prestar atenção em si mesma e sua dor.
Mas como ela é uma boa pessoa, enquanto essa ficha não cai, vai fazendo amigos, como o vendedor da Apple, a senhora muda abandonada na cama do hospital e o policial aposentado que gosta de criar galinhas (o ótimo J.K. Simmons, o professor sádico de “Whiplash”).
Marnie é generosa e gosta da companhia das pessoas que a distraiam de sua própria vida.
Mas logo ela vai descobrir que tem que se ajudar a lembrar do marido morto e encerrar um capítulo de sua vida para poder recomeçar.
“A Intrometida” é um filme leve, agradável e divertido, com uma atriz de 69 anos que encanta a plateia, predominantemente feminina que vai vê-la.

Por que você não leva sua mãe para assistir? Ela vai adorar!

sábado, 6 de agosto de 2016

Mãe só há uma


“Mãe só há uma”- “Don’t call me son”, Brasil, 2016
Direção: Anna Muylaert

Na primeira vez que vemos Pierre (o talentoso estreante Naomi Nero), ele está transando no banheiro de uma boate com uma garota. Sobre os longos cabelos dele, um enfeite de plumas. Suas unhas são azuis e os olhos estão delineados de negro. Um adolescente bonito.
A câmara vai descendo pelo corpo dos dois e um detalhe é mostrado. Por baixo de suas calças, Pierre usa uma calcinha preta fio dental e cinta-liga.
Ele tem uma banda de rock e flagramos um beijo na boca de outro garoto que usa um brinco de crucifixo.
A sexualidade de Pierre é ambígua. Ou melhor, serve para ele investigar sua identidade. As experiências dele tem o cunho de um erotismo polimorfo, uma infantilidade que busca um caminho para crescer. Pierre não sabe quem é. Ainda não.
Quieto, solitário, andando pela Paulista de madrugada, a impressão que passa é que ele se sente deslocado. As roupas e maquiagens seriam disfarces, fantasias de um carnaval de emoções que ele vive sem alegria?
Em casa, a irmã menor Jacqueline (Lais Dias) tem também um jeito retraído mas se preocupa em alimentá-lo enquanto a mãe não chega. Cuida dele.
Uma bomba está prestes a explodir naquela casa de um bairro de classe média baixa. A polícia ronda e um exame de DNA leva Aracy para a cadeia. Ela roubara Pierre da maternidade, 16 anos atrás.
Para culminar, Jacqueline também fora roubada do mesmo jeito. E quando os pais biológicos vem buscá-la, as questões de Anna Muylaert e seu roteiro (Marcelo Caetano é co-autor e assistente de direção), vão ficando mais claras. Centram-se na família e no dilema “nature x nurture” ou seja, hereditariedade x criação. Qual é a verdadeira família? A que tem o seu sangue ou a que cria?
Mas com Pierre a coisa é bem pior do que com Jacqueline. A família biológica dele também não tem afinidade com sua criação. São pessoas de um bom nível econômico mas, ingênuos e bem intencionados, acham que Pierre, que chamam de Felipe, vai se adaptar rapidinho, se o encherem de coisas. A cena na loja de roupas arrepia.
A sexualidade investigativa de Pierre passa a ser o campo onde ele exerce sua rebeldia e exprime seu desgosto por ter perdido o ninho conhecido e estar sendo obrigado a se adaptar à força ao “amor de sangue”.
A diretora colocou em seu filme um achado para nos confundir e assim promover uma maior identificação com Pierre/Felipe. É a mesma atriz, Dani Nefussi, que faz as duas mães. Mas bem dirigida, faz de tal forma, que durante o filme todo temos a impressão de que são duas atrizes, duas mães. Mas mãe só há uma, não diz o título do filme? E através desse jogo, ganha força o drama do filho que não tem nenhuma.
O pai, Matheus Nachtergaele, sempre um assombro de ator, pergunta para o filho recém encontrado e novamente perdido, já que não é quem ele desejaria que fosse:
“- Quantas vezes vamos ter que te perder?”
Ao que Pierre/Felipe responde com a frase mais contundente do filme:
“- Eu fui roubado duas vezes. Uma na maternidade e outra agora por vocês!”
Resta a decepção para todos.
A cena final, de uma delicadeza infinita, envolve o novo irmão menor de Felipe/Pierre (Daniel Botelho, comovente) e parece que mostra que qualquer adolescência, com os conflitos exacerbados, é mesmo um terreno difícil.
Principalmente em tempos de uma liberdade oferecida pelo ambiente contemporâneo, que faz com que não se saiba para onde ir e leva a experimentar de tudo e sofrendo com isso, já que não há livre escolha para a sexualidade.

Anna Muylaert conseguiu fazer um filme seco e reflexivo, com um assunto que daria um melodrama em mãos menos competentes.

terça-feira, 2 de agosto de 2016

Florence : quem é essa mulher?


“Florence: quem é essa mulher?”- “Florence Foster Jenkins”, Inglaterra, 2016
Direção: Stephen Frears

Uma americana rica e carente, completamente iludida quanto a si própria, é tema de dois filmes que estão em cartaz.
O francês “Marguerite”, dirigido por Xavier Gianoli, 44 anos e com a magnífica atriz Catherina Frot, que ganhou o César, o Oscar francês, por esse papel, é anterior ao de Stephen Frears, 75 anos, consagrado diretor inglês.
No primeiro, a história se passa nos “anos loucos” em Paris, logo depois da Primeira Guerra. A intenção é menos biografar do que inspirar-se na história para fazer uma crítica ao poder do dinheiro e à hipocrisia dos que bajulavam e viviam dos favores da cantora desafinada, que se considerava uma soprano coloratura. Há uma melancolia fatal na Marguerite que canta para não enlouquecer.
Já o filme de Frears, que trabalhou também em Hollywood (“Ligações Perigosas”1988) e dirigiu sucessos como “A Rainha”2006 e “Philomena”2013, é a biografia de Florence Foster Jenkins (1868-1944), a americana rica e patética, interpretada pela também magnífica Meryl Streep, na sua provável vigésima indicação ao Oscar.
Numa produção cara, com esmerada reprodução dos anos 40 em Nova York, apesar de filmado na Inglaterra, a melancolia aparece apenas em uma cena mas os risos exagerados, seguidos de aplausos idem, dão o tom de comédia procurado pelo diretor.
Meryl Streep, toda acolchoada para parecer gorda, veste modelos impagáveis, de Consolata Boyle, ornados com pencas de detalhes espalhafatosos como plumas, chapéus extravagantes, coroas e tiaras, broches enormes, colares de ouro, de pedras e pérolas, muitas pérolas, entremeadas de cristais.
A sobriedade excêntrica de Marguerite, baronesa francesa de título comprado, não é motivo de riso mas a americana Florence de Meryl Streep é uma piada visual pronta.
Quando esta última desafina, quem produz os grunhidos e as notas falsas é a própria Meryl Streep, que sabe cantar muito bem e aproveita desse seu dom para adoçar o final do seu filme.
Mas tem uma coisa em “Florence Foster Jenkins” que não tem em “Marguerite”: Mr St. Clair Bayfield. Hugh Grant, com aquele sotaque inglês irresistível, no melhor papel de sua vida, faz um filho bastardo de um lorde que não tem lugar na Inglaterra e vem tentar ser ator na América. Medíocre na recitação de versos de Shakespeare, ele é o suprasumo de marido para Florence. Além de pagar muito bem os aplausos e as críticas favoráveis, com o dinheiro dela, ele a protege, mima de todos os jeitos, dá conselhos nem sempre acatados, com um afeto que comove. Hugh Grant interpreta o mais amoroso dos maridos com perfeição. Ele convence. E está mais charmoso do que nunca.
Simon Helberg, que faz com talento o pianista de Florence, tem uma mímica facial que dispensa os comentários que passam por sua cabeça a respeito dos dotes da patroa e, envergonhado a princípio, vê-se irremediavelmente conquistado pela ingenuidade, generosidade e bom coração da dama em questão.
Tanto a fábula francesa como a comédia inglesa apesar do mesmo tema, são bem diferentes e merecem ser vistos.
E, definitivamente, tornaram Florence Foster Jenkins, a pior cantora lírica do mundo, muito conhecida também pelas plateias de cinema, já que na Broadway e em West End ela já foi personagem de musical de sucesso.